Título: Que fim levaram os Fapis ?
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2005, EU &, p. D1

Os Fundos de Aposentadoria Programada Individual (Fapi) nasceram tão pouco competitivos que atualmente recebem reduzida atenção dos bancos e são praticamente desconhecidos da maioria dos investidores. Prova disso é que, segundo dados do site Fortuna, esses pioneiros da previdência aberta têm hoje pouco menos de 1,5% dos R$ 36,445 bilhões em recursos reunidos pelos planos de previdência acompanhados pelo site. A tendência do patrimônio dos Fapis também vai na contra-mão do setor. Enquanto os fundos de previdência em geral captaram em janeiro, os Fapis encerram o mês com perda de 0,58% e patrimônio de R$ 511,694 milhões. O setor é extremamente concentrado. Apenas dois fundos, o Fapi MIX, do Bradesco, e o Fapi RF, do Itaú, têm 83% do mercado. Para os especialistas, porém, esses fundos seriam tão atrativos quanto outros tipos de previdência aberta se os bancos oferecessem taxas de administração mais competitivas. Com um custo menor de gestão, os ajustes tributários feitos nos últimos anos poderiam tornar esses fundos uma alternativa de longo prazo. Os Fapis foram criados em julho de 1997 como uma opção de aposentadoria para profissionais sem acesso à previdência privada oferecida pelas empresas. À semelhança dos "Individual Retirement Account" (IRA, a conta de aposentadoria americana), eles foram desenhados como um fundo de investimento que oferece a possibilidade de compra de um produto de previdência ao final do contrato - como uma renda mensal ou vitalícia - sem custos com CPMF ou tributação adicional. Diferente de planos de previdência, que só podem ser administrados por seguradoras, os Fapis também podem ser administrados por bancos. Mas como nos Planos Geradores de Benefícios Livres (PGBLs), os investidores têm espaço para deduzir até 12% da renda bruta na declaração anual do IR. No início, porém, as aplicações em Fapis sofriam com pelo menos dois grandes desestímulos. Além do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 25% incidente em quaisquer resgates feitos antes de dez anos, existia também imposto sobre as aplicações feitas pela própria instituição com as reservas do fundo - o chamado imposto sobre a carteira. "Quando a Receita acabou com isso em 2001, com a Medida Provisória 2.222, os Fapis já estavam mortos", diz Andrea Nogueira, especialista em previdência do escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm. Um ano após a criação dos Fapis, a chegada dos PGBLs acabou de vez com qualquer possibilidade de ascensão daquelas carteiras, que não tinham como concorrer com um produto isento de tributação na fase de acumulação. "Hoje não há mais o come-cotas entre os Fapis e a tributação poderá ser progressiva, sobre o total acumulado, ou decrescente, como entre os PGBLs", lembra o presidente da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp) e principal executivo da Itaúprev, Osvaldo do Nascimento. "Mas a série de desvantagens do início desgastou muito o produto." Os Fapis estão sujeitos também ao imposto na fonte de 15% nos resgates. Andrea explica que, atualmente, ainda existe um IOF de 5% sobre o valor dos resgates em Fapis - limitado ao rendimento - feitos apenas no primeiro ano da aplicação. Após esse primeiro ano, a aplicação fica livre do tributo. Apesar do IOF, a advogada afirma que esses fundos de aposentadoria têm vantagens sobre o irmão mais novo. A principal delas, diz o próprio Nascimento, é o fato de estes fundos não correrem o risco de insolvência do banco ou seguradora. É que por ser um fundo de investimento, e não um plano de previdência, os recursos dos cotistas do Fapi não se misturam ao patrimônio da empresa que os vendeu. O executivo lembra também que o produto não dá direito à renda ao final do contrato, mas com os recursos acumulados o investidor tem flexibilidade para comprá-la na seguradora que bem entender. Além disso, a legislação do Fapi é mais clara, em termos, por exemplo, de composição da carteira, acrescenta Andrea. A advogada aponta ainda como vantagem dos fundos de aposentadoria o fato destes terem apenas a taxa de administração, enquanto os PGBLs têm, além dela, a taxa de carregamento - um porcentual cobrado a cada novo aporte feito pelo investidor. Os Fapis também não têm a taxa de saída - equivalente à CPMF paga pelas seguradoras nos resgates feitos em PGBLs -, que é repassada ao participante. "Os Fapis só não são baratos porque não têm concorrência", diz Andrea, em referência às taxas médias entre 3% e 5% ao ano dos fundos de aposentadoria, consideradas altas pelo mercado. Nascimento reconhece que o setor esqueceu os Fapis. "Para ser bem-sucedido, um produto tem de ser trabalhado", diz. Segundo ele, o foco são mesmo os PGBLs e os planos tipo Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), e todos os gastos com publicidade e informação são concentrados neles. Analistas avaliam, porém, que o fato de os PGBLs e VGBLs darem mais receita para os bancos explica a falta de interesse. Para o consultor de previdência Valter Hime, da VM&A Associados, quem tem dinheiro em um Fapi não deve mexer na aplicação, pois teria de pagar imposto de renda no resgate, sem compensação na declaração. Andrea lembra ainda que o investidor descontente com a rentabilidade do seu fundo pode migrar para outro banco, sem custos. Ou trocar de tipo de fundo, buscando maior diversificação ou maior segurança. O prazo de carência da migração, entretanto, é maior entre os Fapis: seis meses, ante os 60 dias dos PGBLs. Valter Hime, contudo, não vê vantagem em investir no Fapi. "Do ponto de vista da segurança, o Fapi é muito bom, mas isso está em discussão e deve ser estendido em breve para os PGBLs", diz. "Diante de um patrimônio tão pequeno, reeditar o produto é besteira, acho que o governo deveria autorizar a migração para os PGBLs". Já Paulo Hirai, da consultoria Milliman, lembra que os fundos de aposentadoria não são produtos de previdência, que contam com tábuas atuariais pré-estabelecidas. Sem elas, o fundo vira apenas uma carteira de investimentos. Andrea alerta que a grande desvantagem desses fundos está no caso de morte do contribuinte. Segundo ela, como o Fapi não é um plano de previdência, os recursos vão para o inventário, e não diretamente para o herdeiro do investidor como no PGBL, estando, portanto, sujeito ao trâmite e aos impostos de herança. Nascimento, da Anapp, reforça que o Fapi poderá continuar fazendo parte do portfólio de produtos de previdência porque é bem desenhado. Para Andrea, a questão é mais simples. "O fato é que ninguém nunca brigou pelos Fapis."