Título: O mapa da bolsa
Autor: Pavini , Angelo
Fonte: Valor Econômico, 18/12/2007, EU & Investimentos, p. D1

Apesar das turbulências recentes vindas do mercado internacional - que devem seguir ainda por vários meses -, a Bolsa de Valores de São Paulo tem grandes chances de continuar dando alegrias para o investidor no próximo ano, o sexto consecutivo de alta, avalia Lika Takahashi, chefe de análise da Fator Corretora. No comando de uma das maiores equipes de análise do mercado, com 16 profissionais, Lika reuniu as perspectivas de 104 empresas para traçar um cenário para o mercado no ano que vem, chegando a uma estimativa de 75 mil pontos para o Índice Bovespa em 2008.

O número representa um retorno razoável, de 25% em relação ao fechamento do Ibovespa ontem, a 59.828 pontos, o dobro da renda fixa. "Mas o número exato não importa muito, o que vale é indicar uma tendência para o investidor ", afirma ela, que cautelosamente manteve a projeção para este fim de ano em 60 mil pontos. Ela considera sua visão cautelosa, comparada às diversas outras casas que já estimam o Ibovespa em 85 mil pontos em 2008. "O cenário é mais ou menos esse, otimista, mas com cautela, basta lembrar que, em dias, o mercado foi de 65 mil para 60 mil, é muita volatilidade", diz.

As projeções fazem parte do "Book 2008", que a corretora entrega aos clientes hoje em São Paulo e amanhã no Rio, em eventos que costumam reunir mais de uma centena de investidores interessados em ouvir histórias de empresas e ações. O Valor teve acesso com exclusividade ao estudo e publica as principais sugestões da Fator para 2008, entre grandes empresas, segunda linha e papéis de dividendos. Um dos diferenciais do estudo é a forte atenção dada às empresas menos negociadas ou novatas, de segunda ou terceira linha. "Queremos consolidar nosso diferencial, ser conhecidos como a casa das 'small caps'", afirma.

Apesar do otimismo, o mercado de ações em 2008 deve ser mais complicado do que neste ano, diz a analista. Ela trabalha com dois cenários: o primeiro com tudo se resolvendo bem nos Estados Unidos e a economia americana apenas desacelerando, sem contaminar emergentes. Assim, a crise de crédito não se tornaria uma crise de liquidez para as empresas. "Com o restante do mundo indo bem, a liquidez internacional se restabelece e as bolsas seguem subindo", diz.

Outro quadro é de a crise das hipotecas de alto risco (subprime) se ampliar, levando a uma recessão nos EUA e atingindo o consumidor americano. Nesse caso, haverá algum contágio no mundo e nos emergentes, o risco aumentará e os ganhos das empresas devem ser mais modestos.

Lika mantém sua preferência pela cautela. Mesmo que os fundamentos do país sigam intactos, uma situação de crescimento menor dos lucros e maior prêmio de risco leva a preços menores de ações. Isso tornará mais relevante selecionar bem os papéis e, para os de coração mais fraco, talvez optar pelas ações de dividendos, que projetam retornos médios somente com distribuição de lucros de 8% a quase 12%.

Para ela, apesar de ter passado praticamente imune às turbulências externas no último trimestre do ano, o mercado brasileiro já dá sinais de cansaço, até pela forte alta de alguns papéis mais líquidos, que anteciparam a classificação de baixo risco de crédito (grau de investimento) do país. O indicador preço/lucro das empresas do Ibovespa, que dá uma idéia do prazo de retorno do investimento em anos, está projetado em 16 vezes para 2008, encostando no número dos mercados desenvolvidos. "Isso significa menor margem de segurança para o investidor", diz.

Ela cita também a queda dos preços das ofertas públicas, os IPOs, uma vez que o investidor ficou mais seletivo, procurando histórias de maior liquidez e mais conhecidas. "Isso deve favorecer as ofertas secundárias, de empresas que já estão no mercado."

Lika acha que a derrubada da CPMF não deve alterar o cenário de médio e longo prazo para a bolsa. Mas lembra que o cenário é mais difícil, pois o dinheiro não é mais tão barato e abundante como no começo de 2007. "O investidor deve trocar o telescópio pela lupa, é hora de procurar boas histórias de papéis esquecidos", diz.

Apesar dos fundamentos dos mercados emergentes continuarem bons, especialmente os da China, o que favoreceria as commodities e o Brasil, Lika destaca que esse cenário benigno já está embutido no preço das empresas de minério de ferro, como a Vale, e siderurgia. "Mas um cenário negativo não está, por isso o risco é maior", alerta. Para petróleo e grãos, ela vê um cenário mais positivo. "O petróleo vai continuar pressionado pelos conflitos em regiões produtoras e pelo custo mais alto de extração, o que beneficia a Petrobras que está ampliando suas reservas", avalia.

No caso dos grãos e, por tabela de carnes, Lika vê a pressão da urbanização da China aumentando o consumo e beneficiando os preços. "E o Brasil tem grandes vantagens competitivas nessa área", destaca. Ela espera novas aberturas de capital de empresas do agronegócio no ano que vem.