Título: Obras nos morros animam moradores
Autor: Rocha , Mario
Fonte: Valor Econômico, 18/12/2007, Especial, p. F12
Aparecida Mendes, do Mercadinho Sol e Lua: à espera de mais movimento Em meados dos anos 60, um grupo de empresários inaugurou um hotel de luxo no alto do morro do Cantagalo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, com vista para a praia de Ipanema e a Lagoa Rodrigo de Freitas. O edifício se destacava em meio à exuberância da Mata Atlântica e das precárias habitações do complexo Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, duas favelas vizinhas penduradas no morro.
O empreendimento acabou não prosperando e, na década de 80, o então governador Leonel Brizola transformou o prédio em um Ciep (Centro Integrado de Educação Pública). No último dia 30 de novembro, no mesmo local, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acionou o bate-estacas simbólico do início das obras de urbanização daquelas comunidades carentes que fazem divisa com os dois bairros mais famosos da cidade: Ipanema e Copacabana. Com o novo projeto, a expectativa dos moradores é que a cidadania avance e a economia local prospere, ao contrário do que aconteceu com o extinto Hotel Panorama.
As obras começam para valer a partir de janeiro de 2008 e devem ser encerradas até dezembro de 2009. Elas incluem melhorias no sistema de água e esgoto, pavimentação e abertura de vias de circulação, construção de creche, posto de saúde e estabelecimento de ensino, implantação de áreas para prática de esporte, recuperação de áreas de preservação ambiental, além da criação de 206 unidades habitacionais e de um elevador integrado ao Metrô. Até dezembro deste ano, a Construtora OAS, responsável pelo trabalho em parceria com o governo do Estado, deve concluir o canteiro de obras e o cadastramento da população local para contratação e qualificação de mão-de-obra da própria comunidade.
O complexo Pavão-Pavãozinho e Cantagalo receberá investimentos de R$ 35,2 milhões - R$ 26,4 milhões da União e R$ 8,8 milhões em contrapartida do governo estadual. Desse total, R$ 2,6 milhões "já estão em caixa", diz o subsecretário executivo de Obras do Rio, Hudson Braga. Para todo o Estado, o governo federal anunciou investimentos de R$ 3,8 bilhões dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A parte destinada à urbanização de favelas soma R$ 2,3 bilhões e vai beneficiar também Rocinha, Manguinhos, Alemão, Iguaçu-Sarapuí (na Baixada Fluminense) e Fazenda Mineiros e Salgueiro (em São Gonçalo).
Leo Pinheiro/Valor Raimundo Wilson: nova rua vai ampliar a clientela potencial A promessa de que o investimento do PAC se transformará em realidade em dois anos já criou na população local a expectativa de que a vida pode melhorar, com mais emprego, renda e menos violência. "Isso aqui está virando um verdadeiro canteiro de obras. Várias Organizações não-governamentais que atuam na comunidade já começaram a estudar opções para melhorar o comércio", diz o presidente da Associação dos Moradores do Morro do Cantagalo, Luiz Bezerra do Nascimento.
Uma das iniciativas em estudo, para a qual já há cerca de cem interessados, é a criação de uma cooperativa de comerciantes locais para melhorar as condições de compra e venda de produtos. O piauiense Raimundo Wilson, morador há 16 anos na comunidade, já prevê aumento nas vendas em sua loja de materiais de construção localizada na subida para o morro. A porta de seu estabelecimento está voltada para o local onde será aberta uma rua que ampliará o acesso ao morro do Pavão-Pavãozinho. Ele acredita que poderá conseguir novos clientes no morro vizinho.
A reurbanização da favela, com possibilidade de acesso para veículos, também deve melhorar o movimento do Mercadinho Sol e Lua, no Pavão-Pavãozinho. É o que espera Aparecida Mendes, funcionária do estabelecimento que abre às 6h30 e fecha às 22h. O acesso é um dos principais problemas para os moradores e comerciantes da comunidade. As mercadorias no morro são transportadas ou nas costas de carregadores ou em carrinhos de mão. Para chegar até as casas é preciso caminhar por vielas estreitas, subindo escadarias que parecem intermináveis.
Leo Pinheiro/Valor Denise Martins: "O trabalho social junto à comunidade é fundamental" A resolução do problema de acesso e de mobilidade na favela é um dos pontos destacados pelo subsecretário de Obras, Hudson Braga, tanto para melhorar a qualidade de vida dos moradores quanto para criar melhores condições ao comércio local. A arquiteta Tatiana Terry, da equipe encarregada de elaborar o projeto de reurbanização, observa que o sistema viário circular vai facilitar o transporte de mercadorias para o comércio e até mesmo para a reforma das casas. "Não adianta construir um posto de saúde ou uma creche no alto do morro se não houver meios para os caminhões chegarem lá em cima", afirma.
De imediato, o projeto deve melhorar a renda daqueles que conseguirem emprego nas obras de urbanização. O vice-governador e secretário de Obras do Estado do Rio, Luiz Fernando Pezão, afirma que o objetivo é contratar até 85% de trabalhadores da comunidade. Foram anunciadas 300 vagas para construção civil e mais de 800 candidatos da região se inscreveram. Pezão conta também que o governo do Estado estuda a redução do ICMS para empresas que querem se instalar nas regiões onde o PAC está sendo implantado. A medida casaria com um projeto da Prefeitura de redução do ISS para empresas de informática. "É uma oportunidade de gerar emprego e renda nessas comunidades", diz o vice-governador.