Título: Rumo ao hexa
Autor: Pavini , Angelo ;Camba , Daniele
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2007, EU & Investimento, p. D1

Desta vez, parece que o hexa não escapa. Pelo menos para o Índice Bovespa, que pelas estimativas de várias corretoras e gestoras deve fechar 2008 em alta pelo sexto ano consecutivo. As projeções vão de goleadas, com o índice atingindo 85 mil pontos, até placares mais disputados, de 72 mil pontos. Por esses números, o investidor que comprasse a cesta de ações do índice ontem, a 63.774 pontos, poderia ganhar de 12,90% a 33,28%, para uma taxa de juros de 11,25% ao ano hoje. Nada mal para um índice que já subiu 465,97% desde 2003 até ontem, 43,40% só neste ano. Em dólar, a alta do Ibovespa atinge 1.031,66% em cinco anos.

Mas, por mais bem fundamentadas que sejam, essas estimativas - com base em projeções de crescimento do país acima de 4%, de aumento do lucro das empresas da ordem de 20% e de obtenção do grau de investimento de baixo risco - são apenas prognósticos para uma partida que ainda nem começou. Um atacante gordo ou um francês versátil com a cabeça sempre podem surgir no caminho do hexa. No caso atual, o jogador fora de forma é a economia dos Estados Unidos, que pode transformar em pó todas essas projeções caso descambe para uma recessão. Todos os analistas fazem essa ressalva, mas consideram mais provável que a economia americana terá um pouso suave, crescendo entre 1% e 2% em 2008. Mas, até que isso fique claro, mesmo os mais otimistas avisam que o mercado externo continuará sendo uma caixinha de surpresas e a volatilidade permanecerá forte.

A grande questão hoje é tentar dimensionar a desaceleração da economia dos EUA, diz Álvaro Bandeira, economista-chefe da corretora Ágora. "Quanto mais profunda e duradoura, pior para mercados acionários e para o Brasil", diz. Para ele, se a economia americana desacelerar para um crescimento de 1% ao ano "não escapa muita gente, nem a China". Por isso, o foco, especialmente no primeiro trimestre, estará nos EUA. "Mas nosso cenário é de a economia americana crescer 1,9% e, com isso, vamos ter o sexto ano consecutivo de alta na Bovespa."

Com desaceleração suave nos EUA, os emergentes seguram o crescimento global e as empresas brasileiras devem ter um crescimento dos lucros entre 20% e 25% em 2008, diz Marco Melo, analista chefe da Ágora. Com isso, devem também distribuir bons dividendos aos acionistas. As 63 ações do Ibovespa projetam um retorno em dividendos ("dividend yield") de 3,7% em 2008, muito acima da média de 2,1% pagos por 11 países emergentes acompanhados por Melo. Ele estima o Ibovespa em torno de 82 mil pontos, mas avisa que, por conta dos EUA, o sexto ano de alta não será tão tranqüilo. Mello destaca ainda o grande peso de Petrobras e Vale no Índice Bovespa, que deve chegar a 30% na nova carteira teórica válida para janeiro. Isso significa que o comportamento desses papéis será decisivo para o Ibovespa.

Até três meses atrás, apenas o cenário internacional preocupava, mas, a partir de então, o repique da inflação no Brasil também passou a incomodar. Mas, na visão do sócio da Mauá Investimentos, Mauro Cunha, se o repique da inflação não comprometer a estabilidade econômica de longo prazo, dificilmente haverá uma interrupção na rota positiva da Bovespa. "Subir juros pontualmente em 2008 é bem menos nocivo do que mexer com os alicerces da economia", diz.

O início do próximo ano é um dos mais incertos dos últimos anos por dúvidas tanto internacionais quanto locais, diz o chefe da área de renda variável da Fundação Cesp, Paulo de Sá Pereira. Apesar do baixo crescimento americano e europeu, os mercados emergentes devem continuar crescendo, o que irá se refletir positivamente nos lucros das empresas desses países. No Brasil, o aumento do lucro deve ficar entre 15% e 20%. "O crescimento doméstico e a obtenção do grau de investimento serão os grandes atrativos para a bolsa."

O cenário para a bolsa deve começar a melhorar no fim do segundo trimestre, quando o estresse em torno da economia americana diminuir, diz Vladimir Pinto, estrategista da Unibanco Corretora. Ele trabalha com um Ibovespa em 78 mil pontos em 2008 e vê como oportunidade ações de bancos, Petrobras e papel e celulose.

Se a inflação aqui se comportar e juro voltar a cair e os EUA não forem para uma recessão, o Ibovespa poderia caminhar para 90 mil pontos, arrisca Daniel Gorayeb, analista de investimento da Corretora Spinelli. "Mas esta não é nossa hipótese principal", diz ele, que trabalha com uma expectativa de alta de até 30% para o Ibovespa, o que significaria um índice em torno de 85 mil pontos. Já para Ronaldo Patah da Unibanco Asset Management (UAM), a bolsa pode ficar parada no primeiro semestre, mas retomará a alta para 80 mil pontos. Vale e Petrobras já subiram bastante e serão, portando, mais vulneráveis no primeiro semestre, alerta.

O Brasil está em um ciclo de crescimento sustentável que favorece o mercado acionário, diz Pedro Galdi, analista da corretora do Banco Real. Esse crescimento deve beneficiar as empresas voltadas para o mercado interno, que representam 57% do Ibovespa. "Podemos ter alguns momentos de preocupação, mas o cenário econômico para a América Latina é muito bom para 2008", diz.