Título: Bancos podem vender ativos com o agravamento da crise
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Fonte: Valor Econômico, 28/12/2007, Finanças, p. D4

Em meio à crise de crédito, os bancos estão dando passos extraordinários para escorar suas finanças, seja vendendo participações a investidores estrangeiros ou tomando empréstimos de bancos centrais.

Agora começa o supersaldão. Num sinal de que os bancos vêem turbulências no futuro, muitos deles na Europa e nos Estados Unidos estão considerando vender desde agências até unidades inteiras. Entre os vendedores em potencial estão o Citigroup Inc., que deve abrir mão de várias unidades de médio porte, e a gigante britânica HSBC Holdings PLC, que pode se desfazer total ou parcialmente de seu setor de financiamento de automóveis, avaliado em US$ 13 bilhões, de acordo com pessoas familiarizadas com a situação.

As conversas sobre essas possibilidades tomaram força dias depois que a Merrill Lynch & Co. anunciou que venderia a maior parte da divisão de empréstimos comerciais para a General Electric Co. por US$ 1,3 bilhão. No mês passado, a Morgan Stanley embolsou mais de US$ 250 milhões vendendo uma fatia de sua unidade de análise de investimento, MSCI Inc., numa oferta pública.

"Acho que vamos ver uma onda dessas no primeiro semestre do ano que vem", diz Huw van Steenis, um analista especializado em bancos da Morgan Stanley em Londres. Porta-vozes do HSBC e do Citigroup não quiseram comentar sobre nenhuma possível venda de ativos.

Alguns executivos estimam que o Citigroup poderia abrir mão de até US$ 12 bilhões em bens "de menor importância". Entre os candidatos: a empresa de cartão de crédito Redecard SA, sediada em São Paulo, em que o Citi tinha participação de 24% em 30 de setembro; a Student Loan Corp., uma empresa aberta de que o banco tem 80%; a unidade norte-americana de financiamento de automóveis do Citi, que concedeu cerca de US$ 9 bilhões em empréstimos nos EUA e Canadá no ano passado; e a divisão japonesa de finanças para o consumidor, que perdeu US$ 312 milhões nos primeiros nove meses de 2007 por causa do aumento do número de empréstimos com prestações atrasadas.

Pode ser difícil encontrar compradores num ambiente em que muito do setor financeiro está em dificuldade. Ainda sim, dizem analistas, a motivação para vender é grande.

Para começar, a venda de ativos gera dinheiro imediatamente num momento em que os bancos devem enfrentar dificuldades persistentes para pegar dinheiro emprestado. Apesar de esforços extraordinários de bancos centrais, que parecem ter evitado um aperto de liquidez neste fim de ano, as taxas de juros que os bancos usam para emprestar dinheiro uns aos outros ainda está alta por causa das preocupações com os créditos imobiliários "subprime". Outras fontes de recursos, como o mercado de promissórias de curto prazo conhecidas como commercial paper, continuam congelados ou proibitivamente caros.

Além disso, as vendas permitem que bancos recuperem seu nível de capitalização - uma medida de sua capacidade de absorver perdas repentinas - sem ter que lançar mão de estratégias mais draconianas como cortar o pagamento de dividendos a acionistas.

"Muitas instituições certamente vão encarar isso como uma opção para levantar capital", diz James Reichbach, o chefe do grupo de instituições financeiras americanas da Deloitte. Ele diz que essas discussões devem se intensificar em janeiro, à medida que os bancos publicam o que se espera ser um dos piores desempenhos trimestrais em anos.

Nas últimas semanas, muitos dos maiores bancos do mundo - inclusive o Citigroup, a Merrill Lynch & Co., o UBS AG e o Morgan Stanley - venderam participações bilionárias a investidores da Ásia e do Oriente Médio para impulsionar seu patrimônio depois das perdas pesadas nos investimentos em crédito imobiliário. Mas conforme os bancos vão assumindo a responsabilidade por bens que foram guardados em fundos fora do balanço patrimonial como veículos de investimento estruturado, ou SIVs na sigla em inglês, a necessidade de capitalização cresceu.

Num relatório divulgado este mês, a Goldman Sachs estimou que US$ 475 bilhões de bens "extras" tinham sido incorporados ao balanço dos bancos desde que o aperto de crédito ganhou força no início do ano. (Colaboraram Niraj Sheth e Robin Sidel)