Título: A base não tem razões para se descolar
Autor: Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2008, Politica, p. A12

Jefferson Botega / Agência RBS / Folha Imagem Yeda espera ser capaz de recuperar o Estado em 2008 com PPPs em saneamento, transportes e saúde, além do empréstimo do Banco Mundial Na opinião da governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, as dificuldades enfrentadas para combater o desequilíbrio das finanças públicas do Estado devem-se a uma "elite política" que resiste ao controle de gastos. Ela admite que a popularidade baixa deve-se a falhas do governo ao comunicar mal que a disciplina fiscal é benéfica para a sociedade, mas afirma que isto deve mudar daqui para a frente.

Sem recursos próprios para investir e ameaçada de ver reduzidos os repasses federais depois da derrota da prorrogação da CPMF, a governadora promete ainda destravar as parcerias público-privadas (PPPs) no Estado em 2008.

Aos partidos aliados, Yeda recomenda que permaneçam na base e saibam aproveitar os "bons resultados" do governo nas eleições municipais do ano que vem. "Se os resultados são bons eles não têm porque se descolar do governo".

A seguir, os principais trechos da entrevista ao Valor:

Valor: A senhora dedicou o primeiro ano de governo ao ajuste das contas do Estado e enfrentou resistências da base aliada, dos empresários, dos servidores. O preço político não está sendo alto demais?

Yeda Crusius: O preço é alto porque as resistências são muito fortes. Mandei (para a Assembléia Legislativa) uma proposta completa de reestruturação das finanças, com a Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual, mas a elite política não quis disciplina de despesas porque a situação serve àqueles que têm os maiores salários e recebem incentivos. Não vou reapresentar a proposta de aumento de ICMS. Agora precisamos conquistar a consciência do povo de que é necessário fazer o ajuste. O povo tem que entender e me ajudar a controlar as despesas.

Valor: A senhora também trabalhou pela prorrogação da CPMF. A derrota do projeto do governo pode complicar mais a situação financeira do Estado com a redução de repasses federais?

Yeda: Não tenho idéia porque o governo federal ainda não determinou como vai compensar a perda da CPMF. Mas creio que na Saúde teremos que fazer um esforço dobrado. O marco legal que aprovamos para a atuação das Oscips pode ser aplicado no caso dos hospitais, para constituir parcerias público-privadas (PPPs). A Saúde é obrigação nossa, que posso cumprir de diversas formas.

Valor: Uma pesquisa do Datafolha publicada dia 16 de dezembro lhe conferiu a pior avaliação entre dez governadores, com nota média de 4,2. A baixa popularidade não lhe desanimou?

Yeda: Não que eu desanime, mas a avaliação foi muito ruim e acendeu a luz vermelha para todo mundo. Eu estava pensando em tirar pelo menos uns cinco, dez dias de férias, porque foi um ano muito difícil, mas vejo que não será possível porque terei que fazer mudanças e trabalhar para melhorar a percepção da sociedade em relação ao governo.

Valor: Como a senhora pretende fazer isto?

Yeda: Dizendo à população que a Saúde não piorou em relação ao ela tinha. Que o emprego não piorou. Não me proponham outra vez um plano macroeconômico. Isto eu já propus e a Assembléia negou. Com os instrumentos que criamos em 2007 tenho condições de ir mostrando os resultados de controlar as finanças. Vou mostrar que eu cortei R$ 300 milhões de gastos de custeio e que com isto a Cide pôde ir para as estradas e o Salário Educação, para a Educação. Foi graças a isto que pude fazer 18 trechos de estradas. Só que não fui mostrar.

Valor: Então foi um problema de comunicação?

Yeda: Tiramos a bruma que existia sobre a crise das contas mas não comuniquei direito à população que a maneira como eu estou fazendo a gestão das finanças está resultando em benefício para ela. Em cada obra que eu iniciei devia ter feito uma festa, mas não fiz isto porque não havia tempo. Pagar dívida ninguém vê. Agora teremos que usar todas as nossas redes de comunicação para mostrar o que fizemos em 2007 e faremos em 2008 mesmo sem o apoio da Assembléia Legislativas para remodelação das receitas e das despesas. E eu zero o déficit em 2009 desde que a Assembléia não fique concedendo aumentos de despesas sem correspondente aumento de receita.

Valor: Qual a marca que a senhora quer deixar para seu governo?

Yeda: Um sistema de Previdência que tranqüilize a todos. Quem sabe o meu maior ganho neste ano tenha sido o fundo da aposentadoria. Esta é a marca que eu quero deixar e para fazer isto eu tenho que consertar as finanças. O sistema já está proposto e vai ser votado no ano que vem. É um regime que anula certas distorções do passado. E há ainda a dívida, que já está encaminhada.

Valor: Mas o lado ruim é o parcelamento dos salários dos servidores.

Yeda: Mesmo com os salários parcelados não tivemos nenhuma greve durante o ano inteiro porque expus a realidade para eles. Eles receberam aumentos nos anos anteriores que eu estou pagando agora. Eles sabem que estou cumprindo o que a lei manda. Eu só não consigo tirar dinheiro de árvore. Então não consigo pagar tudo no dia 30, mas pago no dia 10.

Valor: E a falta de investimentos com recursos do Tesouro estadual?

Yeda: Não investimos com recursos de ICMS porque tomei posse com uma alíquota rebaixada, mas estamos investindo com a Cide, com o Salário Educação, com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, o ano que vem será o ano das parcerias público-privadas (PPPs), que podem ser feitas na área de Saneamento, Transportes, hospitais. Logo vamos começar a anunciar. E como vou entrar no circuito internacional com o empréstimo do Banco Mundial, vou também buscar crédito para investimentos.

Valor: A senhora teme uma debandada dos partidos da base aliada em 2008 por conta das eleições municipais?

Yeda: Se os resultados são bons eles não têm por que se descolar do governo. Pelo contrário. Se eles souberem se apropriar desses bons resultados, vai ser bom para eles em 2008. A não ser que o jogo seja puramente político, contra o partido da governadora.

Valor: Como o governo vai se comportar?

Yeda: O governo vai agir. Por mais que seja um ano eleitoral, vamos mostrar a cada minuto o que significa consertar as finanças para melhorar a vida de cada um. E cada um que escolha o candidato que quiser.

Valor: A senhora vai subir em palanques?

Yeda: Não sei. O ideal para mim é que o PSDB tenha candidato em todo o lugar, mas quem decide a estratégia é o partido. Se ele souber aproveitar os resultados muito bons do governo ele coloca candidatos que saibam defender isto e dizer onde estão as melhorias. Eu tenho as minhas preferências, mas não vou interferir. (SB)