Título: Incertezas exigem que BC evite decisões prematuras
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Fonte: Valor Econômico, 06/02/2008, Opinião, p. A8

Ao manter a meta da taxa básica de juros em 11,25%, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deixou duas mensagens bastante claras. A primeira é que está aberta a porta para um eventual aperto monetário, caso se consolide uma projeção de inflação superior à trajetória das metas. Num cenário ainda incerto, o BC não se comprometeu de antemão com um aumento da Selic, mas avisou que de dezembro (quando a sua expectativa era de inflação de 4,3% este ano) para cá houve uma sensível deterioração das expectativas. Agora, suas projeções apontam para um IPCA em torno do valor central da meta de 4,5%.

Outro aviso da última ata do Copom é de que já está ocorrendo uma inflação de demanda no país. "O ritmo de expansão da demanda continua bastante robusto, respondendo ao menos parcialmente pelas pressões inflacionárias que têm sido observadas no curto prazo", diz o texto da ata. Até então, a inflação de demanda era vista como um risco e o entendimento entre os analistas privados e economistas do governo era de que a aceleração da inflação se devia a choques de oferta, sobretudo advindos da alta dos preços dos alimentos. Assim, o Copom deixou claro que são maiores, hoje, os riscos de a inflação se comportar pior do que o previsto. Além de estar enxergando descompasso entre oferta e demanda, houve piora no cenário externo.

No relatório de inflação de dezembro, o BC ressalta que os efeitos de uma recessão americana sobre a inflação brasileira são ambíguos. A queda dos preços das commodities afetaria as exportações e pressionaria a taxa de câmbio, mas, ao mesmo tempo, reduziria as pressões inflacionárias dos preços dos alimentos. De outro lado, a crise internacional poderia aumentar a aversão ao risco e reduzir a demanda e o preço de ativos brasileiros, levando a uma depreciação da taxa de câmbio.

Apesar de ter havido uma piora no balanço de riscos para a trajetória futura da inflação, ainda não há, porém, informações suficientes que apontem para um desvio significativo da inflação em relação ao valor central da meta. Tanto que para 2009 as projeções do BC são de inflação abaixo do centro da meta, também definida em 4,5%.

Segundo o Boletim Focus da semana passada, o setor privado está menos otimista em relação aos índices de preços ao consumidor e de atacado, mas, ainda assim, crê que o IPCA ficará em 4,45% - abaixo da meta de inflação de 4,5% com margem de tolerância de 2 pontos percentuais para cima ou para baixo. A previsão da semana anterior para o IPCA neste ano era de 4,37%. No caso dos índices gerais de preços, o mercado elevou suas previsões para o IGP-DI, de 4,75% para 4,79%, e o IGP-M, de 4,8% para 4,85%. Para 2009, as pesquisas do Focus apontam queda da inflação, ainda que para índices ligeiramente superiores a 4%.

A mesma ata da reunião que decidiu manter a taxa de juros básica em 11,25% trouxe informações sobre uma piora nas expectativas, mas com garantias de que ninguém espera descontrole inflacionário nos próximos meses. Segundo o Copom, no ano de 2008, o reajuste dos preços administrados, responsáveis por 30,48% do IPCA de dezembro, deve ficar em 4,2% - menos que os 4,5% previstos no Relatório de Inflação de dezembro. Subiu consideravelmente a mediana das expectativas dos investidores coletadas pelo BC para a variação do IPCA, mas, também nesse caso, os índices apontados nas previsões ainda estão abaixo da meta de 4,5%.

O BC diz que seu cenário de referência, que leva em conta a manutenção da cotação do dólar em R$ 1,75 e a taxa Selic em 11,25%, indica que o IPCA será maior que o apontado em dezembro e ficará em torno da meta de 4,5% em 2008. Ao levar em conta as projeções dos investidores para juros e câmbio, porém, a estimativa para 2008 ficaria acima do centro da meta. Esse comentário levou analistas a acreditar que outras variáveis computadas pelo BC trazem previsões mais pessimistas que as do mercado, que ainda não aposta no rompimento do centro da meta para 2008 e 2009.

Diante de tantas incertezas, foi coerente a ameaça feita pelo Copom, de "ajustar os instrumentos de política monetária" caso a inflação mostre algum recrudescimento. Mas até que apareçam sinais inequívocos de perigosa aceleração inflacionária , convém que, em um ano de menor crescimento econômico como 2008, o Copom evite decisões prematuras e aguarde um quadro mais claro tanto interna quanto externamente.