Título: Câmbio pode determinar efeitos de crise global no país
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 07/02/2008, Brasil, p. A3

A taxa de câmbio é a variável macroeconômica chave para explicar um possível alcance do impacto da crise internacional sobre a economia brasileira, avaliam economistas ouvidos pelo Valor. Aurélio Bicalho, economista do Banco Itaú, sustenta que a combinação de três fatores - forte desaceleração da economia mundial, queda dos preços das commodities e elevação da aversão ao risco - pode causar uma depreciação do real influindo na trajetória do crescimento econômico e determinar a direção da política monetária em 2008. Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), nâo vê o país mergulhado numa depreciação cambial por conta da redução de atividade da economia americana. "Este cenário para mim é terrorista", diz.

Bicalho traça dois cenários de impacto do câmbio sobre o Brasil decorrente de uma crise externa. O pior cenário, de uma desvalorização forte do real devido a uma recessão profunda nos EUA, é o menos provável. Ele reduziria a taxa de expansão do PIB brasileiro para 4% este ano e derrubaria o produto real para 3%, em 2009. O cenário de maior probabilidade para o Itaú é o deterioração das contas externas, com redução das exportações pelo encolhimento da demanda global, sem contudo influir no comportamento do câmbio. Neste ambiente, o PIB brasileiro cresceria 4,4% em 2008 e 4,2% em 2009.

Mesmo considerando pouco provável o cenário de valorização do dólar no país, o economista do Itaú crê que uma apreciação da moeda americana teria efeito-dominó sobre a economia, levando o Banco Central a concretizar a probabilidade de alta da Selic, com conseqüente recuo do investimento e do consumo das famílias. Bicalho calcula que o aumento do juro básico e a diminuição do investimento e do consumo levariam o PIB a perder cerca de 0,3 ponto percentual em sua taxa de crescimento em 2008. Já numa conjuntura mais amena, sem pressão à vista do câmbio, a economia continuaria em expansão, não chegando porém ao patamar de 5% a 5,4%, taxas previstas para 2007.

Para o economista do Itaú, o que reforça a probabilidade deste cenário é "o acúmulo de reservas e a melhoria do perfil da dívida pública". Estes fatores reforçam a resistência da economia brasileira a choques externos, avisa.

Thadeu de Freitas concorda com Bicalho que o comportamento da economia brasileira diante da crise está ligada à dinâmica da taxa de câmbio. Mas neste momento acredita que é muito difícil o dólar subir em relação ao real num quadro de crise nos EUA que não seja o de uma recessão profunda e duradoura. No entender de Thadeu de Freitas, o que vai acontecer é uma queda nas exportações, que vai impactar o PIB de 2008. Ele trabalha com projeção de superávit comercial de US$ 25 bilhões para este ano. "Em 2007 apostei em crescimento de 5,2% para a economia, mas este ano prevejo taxas entre 4,5% a 4% por conta de exportações menores e também avalio que o consumo das famílias vai encolher devido ao crédito mais caro, influenciado pelo juro futuro, hoje na faixa de 13% a 15%." Freitas ressalta que não há no horizonte sinais de pressões inflacionárias e considera a última ata do Copom "muito assustadora".

Para o economista-chefe da CNC, se a crise global aumentar a aversão ao risco dos emergentes, a situação do Brasil pode complicar e levar a depreciar o câmbio, gerando alta de preços, mesmo com a queda das commodities metálicas e agrícolas. "Apesar de termos US$ 180 bilhões em reservas, nenhum país aguenta uma fuga de capitais que pode se desencadear se a crise piorar para valer."

No Brasil, a dívida pública imobiliária fechou 2007 com 45,6% do PIB, enquanto as reservas respondem por 13,75% do PIB e os meios de pagamentos disponíveis, por 69,5% do PIB. "Se todo mundo quiser trocar reais por dólares, nossas reservas não aguentam. Mas este cenário para mim é terrorista. Não considero esta hipótese", disse Thadeu de Freitas.