Título: Petrobras fecha primeiro acordo para importar GNL
Autor: Schüffner , Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 11/02/2008, Empresas, p. B6

Graça Foster, diretora da Petrobras: "O gás vai chegar quando precisarmos" A diretora de Gás e Energia da Petrobras, Maria das Graças Foster, adiantou ao Valor que já comprou a primeira carga de Gás Natural Liqüefeito (GNL) para o Brasil e esse gás será importado quando for necessário. Mas não diz o volume comprado, o preço ou o nome do vendedor. Tudo indica que só chegará no segundo semestre, quando o terminal de regaseificação de Pecém, no Ceará, estiver pronto.

"O gás vai chegar quando precisarmos. O que posso dizer é que vai atender toda a demanda térmica da Petrobras em 2008. Temos uma necessidade teórica de complementar alguns volumes e isto já foi providenciado", diz.

A demanda a que ela se refere é a do polêmico Termo de Compromisso (TC) assinado entre a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Petrobras, em maio do ano passado, e que hoje é objeto de uma multa de R$ 84 milhões (contestada pela Petrobras) por descumprimento por parte da estatal.

Pelo TC, a Petrobras se compromete a fornecer combustível (seja gás natural ou óleo combustível) para 22 usinas no Nordeste, Sudeste e Sul, algumas próprias. O compromisso é de que elas gerem 3.970 megawatts (MW) de energia no primeiro semestre de 2008 e 4.675 MW no segundo semestre, aumentando os volumes até 2011.

A diretora diz que não adianta fazer contas porque não é possível adivinhar quanto GNL será importado para suprir as usinas incluídas no acordo. Segundo ela, essas térmicas vão usar gás nacional e importado, seja da Bolívia ou GNL.

Mas tudo indica que o GNL vai ajudar a geração de energia no Nordeste. Graça Foster diz que agora negocia com a Aneel uma forma de não pagar em dinheiro, já que a Petrobras entende que a multa é indevida. "Temos conversado. No entendimento da Aneel nós devemos pela não geração de energia, pelo nosso entendimento, não devemos. Não reconhecemos a falha, a falta, mas somos disciplinados. Solicitamos à Aneel a negociação da fórmula de recomposição daquilo que, na visão deles, deixamos de gerar. Preferimos não pagar em dinheiro, mas que haja participação maior da Petrobras na geração de energia no valor que eles estipularem", explica.

Graça Foster assumiu o cargo há três meses e comanda uma das diretorias mais problemáticas da Petrobras. A área de gás e energia contabiliza um prejuízo de quase R$ 900 milhões no acumulado até setembro. O prejuízo embute o pagamento de R$ 263 milhões em encargos contratuais de fornecimento de gás e energia elétrica.

A área abriga as participações societárias ou o controle de 14 usinas, sendo 11 térmicas que têm capacidade de gerar 4.462 megawatts (MW) de energia, sem incluir a NorteFluminense (801 MW e da qual a Petrobras tem 10%) e Araucária (484 MW dos quais 20% da estatal). O montante não leva em conta as usinas que usam combustível fornecido pela estatal sob contrato e são controladas por grupos privados. Caso todas as térmicas a gás do país precisarem entrar em operação para gerar energia elétrica, elas consumiriam diariamente 38 milhões de metros cúbicos de gás natural. Considerando-se que a produção média brasileira de gás em 2007 foi de 43 milhões de metros cúbicos/dia, esse volume representa 88,4% da produção, que nem toda é aproveitada.

Dado o peso das termelétricas para o suprimento de energia do país - em novembro essas usinas consumiram em média 10,34 milhões de metros cúbicos/dia de gás, o equivalente a 25% de todo o insumo ofertado no Brasil e na semana do Natal chegou a 12 milhões - a Petrobras tem sido alvo constante de pressões do Ministério de Minas e Energia, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para suprir a demanda elétrica.

Na última semana do ano passado a companhia contabiliza uma geração média de 2.224 MW médios de energia diariamente. No dia 27 de dezembro a geração foi de 2.600 MW, incluindo 2.105 MW de térmicas a gás e 407 MW a óleo. No Nordeste, as térmicas Petrolina, TermoCabo e Bahia I, a óleo - todas operadas pela Petrobras - estavam a plena carga. Outras usinas da região deveriam atingir carga máxima esta semana, entre elas a usina da Enguia no Ceará e Piauí e a térmica de Camaçari (BA), que na sexta-feira passada enfrentava dificuldades de suprimento de óleo, devido à sobrecarga no sistema de logística da BR Distribuidora.

No cargo antes ocupado por Ildo Sauer, Graça conta que não dorme sem pensar em dois assuntos: a geração de energia pelas usinas da Petrobras e a importação de GNL. Na entrevista, a diretora faz uma avaliação diplomática das muitas vezes tensas discussões envolvendo a Petrobras e outros membros do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) em Brasília. Ela diz que a companhia tem se esforçado para tornar-se competitiva no mercado de energia elétrica e considera as desavenças um aprendizado.

"A Petrobras precisou aprender como funciona e opera um gerador de energia hídrica e o geradores de base hídrica viram o que é o mercado de gás e o de petróleo. Houve momentos difíceis para todos", admite a executiva, que assistiu à maioria das reuniões do CMSE seja como secretária executiva do MME na gestão de Dilma Rousseff, ou como presidente da BR Distribuidora.

Outro desafio, segundo suas próprias palavras, é reverter os prejuízos da área que comanda ao mesmo tempo atendendo o mercado de energia elétrica. Ela lembra que nos últimos dias a Petrobras antecipou o fornecimento de gás para a TermoPernambuco (controlada pela Neoenergia) 26 dias antes do previsto. Ela deveria gerar 177,9 MW apenas no primeiro semestre de 2008.

Graça diz que a Petrobras "vem tirando o máximo que pode" do seu consumo para o mercado, mas frisa que a companhia não se sente penalizada. E nem gosta do que ela chama de "pressão moral para gerar energia". Ela diz que quer manter a discussão no nível técnico, econômico e racional. "Até porque o esforço de geração tem de ser recompensado em termos de pagamento justo para a nossa geração. E esse é um ponto normalmente de bastante stress entre todos nós", admite.

Não por acaso, a recente resolução nº 8 do MME foi elogiada pela diretora, que considerou a medida "uma glória" porque permite a remuneração das usinas pelo custo do combustível de cada uma (seja gás ou óleo) sem "contaminar" o preço do mercado livre, ou preço de liquidação de diferenças (PLD). Essa resolução permite que o ONS determine a geração de térmicas mais caras sem obedecer a ordem de mérito econômico, de modo a poupar água nos reservatórios. A medida foi vista por alguns analistas como intervenção do governo nos preços do mercado, mas a diretora da Petrobras acha que foi uma decisão necessária.