Título: Para Marcílio, governo ignora recomendações
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 04/01/2008, Política, p. A8

O presidente da Comissão de Ética Pública do governo, Marcílio Marques Moreira, afirmou ao Valor que o poder Executivo descumpre outras normas sugeridas pela comissão, especialmente na ocupação de cargos públicos na administração pública federal. Desta forma, o fato de o titular do Ministério do Trabalho, Carlos Lupi, estar acumulando o cargo de ministro do governo e de presidente do PDT, irregularidade ética apontada pela comissão, não é o único descumprimento de recomendação. Segundo Marcílio, a comissão sugere ao Planalto que sempre indique pessoas "com capacidade técnica" para ocupar vagas em ministérios, estatais ou autarquias. E acrescenta que, para dar transparência ao processo, o ideal é que o currículo do indicado esteja publicado na página do órgão onde ele assumirá a nova função.

A Comissão de Ética não é rígida com indicações políticas, mas o presidente alerta que o fundamental é que a pessoa tenha capacidade de gestão. "Se ele for um bom gestor, um bom administrador, poderá conduzir seu trabalho, desde que se cerque de pessoas competentes". Nesse sentido, a exposição do currículo mostraria se o indicado tem ou não experiência gerencial.

Em relação à grande polêmica do momento - a permanência ou não de Carlos Lupi à frente da Pasta, mesmo ocupando simultaneamente a presidência do PDT - Marcílio procura não antecipar tensões. Logo depois do Natal, a Comissão de Ética Pública encaminhou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma recomendação de exoneração de Lupi, por considerar que a dupla função provoca "conflitos de interesses", um caso que deixa o ministro em pública transgressão ética. O presidente ainda não se pronunciou sobre o caso.

Um parecer preliminar da Advocacia Geral da União, de dezembro, apontou que, "do ponto de vista legal (não ético), não existiriam problemas no acúmulo das funções". Dentro do governo, apesar da opinião ser quase unânime a favor de Lupi, as saídas para o impasse são divergentes. Enquanto um ministro próximo de Lula acha que "a Comissão está se preocupando com questões menores, ao invés de analisar a ética como um todo", outro integrante do núcleo central palaciano acha que, para evitar atritos, Lupi poderia "licenciar-se temporariamente da presidência do PDT, enquanto o caso não for decidido pelo presidente Lula".

Marcílio prefere não antecipar qual será o futuro da Comissão - e dele próprio - caso a recomendação seja desprezada pelo presidente Lula. "Como diria um ex-ministro da Fazenda (Pedro Malan), no Brasil até o passado é incerto. Por isso, não quero prever o futuro", brincou ele. O presidente da Comissão de Ética fez questão de rebater as acusações de Lupi, de que estaria sofrendo um linchamento político. "A questão não é pessoal, não é algo pontual. Estamos defendendo a qualidade ética do serviço público".

Respondendo a outras argumentações de defensores de Lupi, segundo as quais nos países parlamentaristas é comum os presidentes de partidos chegarem, inclusive, a cargos de primeiro-ministro, Marcílio toma como exemplo a Inglaterra. "Lá não existe problema de acúmulo de funções. Mas existe um Comissário especialmente incumbido de filtrar as demandas políticas, para evitar problemas em relação à res pública e garantir a eficiência na administração", defendeu ele.