Título: Nova regra do BC pode frear o crédito
Autor: Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 06/02/2008, Finanças, p. C8

Magdalena Gutierrez/Valor Gustavo Loyola, ex-presidente do BC: medida eleva custo e afeta spread A nova regra que obriga os bancos a recolherem compulsoriamente parte dos depósitos interfinanceiros das empresas de leasing, anunciada na última quinta-feira pelo Banco Central, pode ajudar a frear o avanço acelerado do crédito no país, na opinião de analistas ouvidos pelo Valor.

A partir de março, os bancos terão de recolher 5% de compulsório das captações via debêntures, feitas pelas subsidiárias de arrendamento e repassadas às tesourarias dos próprios bancos. A alíquota subirá cinco pontos percentuais a cada dois meses, até atingir 25% em janeiro de 2009.

A medida não visa restringir a oferta de arrendamento mercantil diretamente, mas sim reduzir a capacidade global de os bancos concederem empréstimos por meio da diminuição dos ativos disponíveis das instituições.

Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central e consultor da Tendências, acredita que a incidência de compulsório sobre operações com debêntures de leasing elevará o custo geral de captação e pode afetar um pouco o spread bancário, mas ainda não está claro em qual proporção.

Ele pondera, no entanto, que a medida "desperta a desconfiança de que o BC esteja aderindo à tese equivocada de que política monetária se faz por meio de controles quantitativos e não via taxa de juros". Em relatório, Loyola afirma que essa tese é "equivocada".

A política monetária, que visa controlar a inflação, tem diversas ferramentas e o próprio BC, na ata da última reunião do Copom, publicada no dia anterior, acenou com a possibilidade de adotar uma "postura diferente", ajustando os "instrumentos de política monetária".

Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, destaca o fato de o BC ter utilizado o termo "instrumentos", no plural, ao invés de "instrumento" (a taxa de juros). "A alternativa seria o aumento do compulsório, que também é um instrumento de política monetária e poderia ter um impacto mais direto sobre o consumo, através do canal do crédito."

Para ele, essa ação já foi tomada. "O compulsório sobre os depósitos interbancários captados de sociedades de arrendamento mercantil (leasing) já pode ser lida como uma ação de aperto monetário, utilizando outro instrumento diferente da taxa de juros", disse em relatório de análise econômica.

Os economistas do Banco Fibra, Maristella Ansanelli e Flávio Mendes, afirmam que "o texto da última ata expressa ainda mais claramente os riscos derivados do aumento da demanda sobre os preços, e a decisão recente de elevar os depósitos compulsórios também reflete essa preocupação".

Para as entidades do setor, a medida é preventiva. Luiz Montenegro, presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef), afirma que a ação foi, de fato, para segurar um pouco a liquidez do mercado.

Montenegro pondera que as operações de leasing não devem ser afetadas. Em uma primeira análise, a Anef entende que apenas o dinheiro depositado nos bancos terá compulsório. Portanto, quanto mais operações de leasing forem feitas, menor o dinheiro aplicado nos bancos e, consequentemente, depositado no BC. Haveria, portanto, um incentivo à concessão de arrendamento mercantil.

Renato Oliva, vice-presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), não vê a decisão como uma medida para conter o crédito, mas pondera que a alteração, ao uniformizar o compulsório, dá maior eficiência à política monetária. "Se o governo quisesse fazer arrocho, teria de ser muito mais feroz, porque boa parte estava fora de alcance."

Rafael Cardoso, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Leasing (Abel), disse que o BC está agindo "preventivamente e com prudência para que não haja um excesso de liquidez e uma oferta de crédito que possa comprometer a meta de inflação". Os recursos disponíveis para empréstimos (funding) poderão ser reduzidos em até R$ 50 bilhões, segundo análise do economista do Banco JP Morgan, Fabio Akira.

Assim, a nova medida poderá ter impacto, mesmo que pequeno, no crescimento do crédito, afirma Lika Takahashi, chefe de análise da Fator Corretora. Como as instituições usavam suas subsidiárias de leasing para captar recursos, os bancos agora tendem a captar menos, emprestar menos e o custo dos empréstimos pode subir.

A medida atinge os bancos grandes, que possuem subsidiárias de arrendamento mercantil e vinham emitido sistematicamente debêntures. Os papéis eram comprados pelos próprios bancos e vendidos a investidores em operações compromissadas.

A mudança poderá ter impacto tanto na oferta de crédito quanto na rentabilidade das instituições. Na semana passada, ações dos grandes caíram: Bradesco recuou 4,2%; Itaú, 5,89%; e Unibanco, 5,56%.

Consultado sobre o impacto do compulsório em operações compromissadas com debêntures já contratadas, o Itaú informou que não se pronunciaria sobre o assunto porque está em período de silêncio antes da publicação de seu balanço. Bradesco e Unibanco também não se pronunciaram.

Mesmo os bancos pequenos e médios terão algum impacto na captação. O Conselho Monetário Nacional (CMN) alterou a forma de contabilização das operações de cessão de crédito, principal funding dessas instituições.

Ademiro Vian, assessor técnico da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), acredita em elevação dos custos para os bancos menores, mas afirma que a medida foi positiva pelo aumento de transparência do processo. (Colaborou Tatiana Bautzer)