Título: Crescimento de receita ameniza crise da CPMF
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 21/01/2008, Opinião, p. A10

A arrecadação de impostos e tributos federais bateu novo recorde. Em 2007, chegou a R$ 596,984 bilhões, registrando crescimento real (já descontada a inflação) de 12,19%. Trata-se de um resultado estupendo sob qualquer ponto de vista. Mostra que as receitas do governo central, incluída a arrecadação da contribuição previdenciária sobre folha, estão crescendo num ritmo duas vezes superior à taxa de expansão da economia.

Em moeda sonante, a arrecadação cresceu, em termos reais, R$ 64,88 bilhões, um montante bem superior ao recolhimento da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). No ano passado, a CPMF recolheu R$ 37,23 bilhões aos cofres públicos. Para 2008, a expectativa do governo era recolher R$ 40 bilhões com o tributo, extinto em 1º de janeiro.

Considerando-se, portanto, o ganho de arrecadação ocorrido em 2007, o governo não deveria, em tese, ter grandes dificuldades para equilibrar o orçamento em 2008, mesmo tendo perdido a receita da CPMF. É evidente que a questão orçamentária é um pouco mais complexa do que isso porque, em 2007, o governo aumentou fortemente os gastos correntes, apropriando-se de grande parte do ganho de arrecadação. Além disso, a peça orçamentária de 2008, elaborada contando-se com os recursos da CPMF, encerra o desejo de uma nova elevação da despesa pública. Por isso, os cortes são indispensáveis.

Há um componente pró-cíclico na arrecadação de tributos no Brasil que explica o desempenho de 2007. Quando a economia acelera, o governo arrecada mais, numa velocidade superior à de evolução do PIB. Uma possível explicação para o fenômeno está no fato de o sistema tributário brasileiro estar amparado em tributos que incidem sobre o faturamento - quase um quarto da arrecadação provém de dois tributos dessa natureza (Cofins e PIS/PASEP).

Nesses tributos, não importa se as empresas são lucrativas ou não. Quanto maior é a atividade econômica, maior é o faturamento das companhias, por conseguinte, maior é a fatia abocanhada pelo Fisco. Em 2007, o faturamento das empresas explodiu. De janeiro a novembro do ano passado, as vendas cresceram, segundo o IBGE, 13,9% quando comparadas ao mesmo período de 2006.

A Receita Federal explicou que o dinamismo da economia também impulsionou o recolhimento de tributos no último ano. De fato, o número recorde de ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês), refletindo uma melhora na governança corporativa das empresas brasileiras, movimentou, segundo a Bovespa, algo em torno de R$ 56 bilhões, face a R$ 15,4 bilhões do ano anterior. A tributação dessas operações, pelo ingresso de receitas, ou dos ganhos de capital, pela valorização das ações, engordou o Imposto de Renda recolhido tanto de pessoas jurídicas quanto físicas.

Há alguns anos, a Comissão de Valores Mobiliário estimou que as empresas de capital aberto, por estarem mais sujeitas legalmente a regras de maior transparência contábil, pagam, em média, 30% mais imposto do que as de capital fechado. Em 2007, 62 empresas abriram o capital no Brasil, um movimento recorde, indicativo de um novo momento vivido pelo setor privado. Ademais, o lucro líquido das 220 maiores companhias com ações listadas na Bovespa cresceu 46%.

Não deve ser negligenciado, na análise dos números da arrecadação federal, o esforço da Receita Federal no combate à sonegação, fato que também explica o excelente resultado obtido em 2007. O recolhimento de multas e juros cresceu, no período, 30,7% e a recuperação de depósitos judiciais, 46,21%.

Os números mostram que, em grande parte, os ganhos obtidos pelo governo na arrecadação tributária têm caráter permanente, ou seja, vieram para ficar. Além disso, a economia brasileira, apesar do aumento das incertezas no cenário externo, segue crescendo de forma acelerada, o que vai se refletir, mais uma vez, no comportamento positivo das receitas públicas. Se o governo tem um problema orçamentário a resolver - o fim da cobrança da CPMF -, está claro que a dificuldade é moderada pelo desempenho de sua poderosa máquina arrecadadora, que ano após ano aumenta o recolhimento de tributos.