Título: Anatel inicia processo para mudar regras e viabilizar "supertele"
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 13/02/2008, Empresas, p. B3

Foi dada oficialmente a largada à provável mudança de regras para permitir a criação de uma megaempresa brasileira de telefonia. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) encaminhou ontem um ofício ao Ministério das Comunicações instando o governo a orientá-la sobre a revisão do Plano Geral de Outorgas (PGO), o marco legal da telefonia fixa no país, que hoje impediria a compra da Brasil Telecom pela Oi. Não há prazo para uma resposta, mas não é segredo que o ministro Hélio Costa deve dar sinal verde ao órgão regulador para estudar um novo plano de outorgas. Esse é o primeiro passo para alterar a legislação do setor.

Segundo assessores, Costa está aberto a avaliar uma mudança mais ampla no setor, que envolva também a abertura do mercado de televisão por assinatura às operadoras de telefonia. Hoje as teles estão impedidas pela Lei do Cabo, de 1995, de oferecer esse tipo de serviço na mesma área de concessão onde atuam. As operadoras protestam contra essa restrição e querem aproveitar a rede de banda larga para lançar pacotes aos seus clientes com serviços de voz, internet e TV por assinatura ao mesmo tempo - o chamado "triple play". No fim do ano passado, a BrT estreou um serviço de TV com programas sob encomenda (vídeo sob demanda) em que os dados são transmitidos diretamente pela internet.

Em ofício enviado para a Anatel na sexta-feira passada, a Abrafix, associação que representa as concessionárias de telefonia fixa, pediu formalmente uma revisão do plano de outorgas atual. A entidade quer que as mudanças na legislação não se limitem apenas a permitir a união entre duas operadoras com áreas de atuação diferentes. Para a Abrafix, chegou a hora de discutir uma reformulação mais ampla das leis, derrubando boa parte das barreiras existentes hoje.

"O mundo evoluiu, o país evoluiu, as tecnologias são outras", afirmou o presidente da Abrafix, José Fernandes Pauletti. No documento à Anatel - fruto de um consenso entre BrT, Oi e Telefônica -, Pauletti sublinha a importância de mudar o PGO, criticando a divisão regional da telefonia fixa. "É de se reconhecer, cada vez mais, que as plataformas de telecomunicações deixam de ser regionais e tendem a ser nacionais, quando não globais", escreve o executivo na carta à agência reguladora. E continua, referindo-se à integração dos serviços e à queda dos obstáculos atuais no mercado de televisão por assinatura. "Do ponto de vista de prestação dos serviços, tem-se que os usuários crescentemente aspiram dispor de múltiplos serviços providos através de um mesmo terminal, com mobilidade e oferecidos, preferencialmente, por um mesmo prestador, mas sem abdicar de seu poder de escolha."

Costa até simpatiza com esse ajuste mais amplo de regras, mas faz questão de que dois aspectos sejam ressaltados, segundo assessores próximos: os benefícios aos usuários e a manutenção de um ambiente de competição. Politicamente, o ministro sabe que é mais conveniente fazer uma mudança das leis que resolvam demandas de outras empresas, como forma de não ser vista como tendo o objetivo único de viabilizar a aquisição da BrT pela Oi.

Aproveitando uma entrevista coletiva em que fez um balanço de seus primeiros seis meses à frente da agência, o presidente da Anatel, Ronaldo Sardenberg, declarou-se favorável a uma "revisão das regras", mas preferiu não entrar em detalhes. "Estamos debaixo de forte pressão. A escala das operações está aumentando brutalmente. Mesmo a telefonia fixa voltou a crescer. A telefonia móvel cresceu 21% no ano passado, muito mais do que a expectativa do mercado", disse.

Sardenberg alegou que espera uma resposta do Ministério das Comunicações sobre as linhas gerais das mudanças, que servirão de base para estudos e a elaboração de um novo plano de outorgas pela Anatel - a ser apreciado futuramente pelo ministério e pelo Palácio do Planalto. A consulta da agência foi motivada pelo documento da Abrafix. O embaixador preferiu não especificar que mudanças defende pessoalmente. Justificou que, pela condição de presidente, é o "voto de minerva" entre os cinco conselheiros da Anatel e não quer exercer nenhuma influência, entre os colegas, na consulta pública que deverá ser aberta, nem sobre o mercado. "O importante é que não há nenhuma intenção da Anatel de enfiar goela abaixo coisa alguma", destacou.

O presidente da Anatel sepultou a hipótese de uma alteração do PGO que não passe por um decreto presidencial. Especialistas aventaram a possibilidade de que o plano de outorgas pudesse ser declarado "caduco", dez anos depois da privatização das teles, ou fosse alvo de mudanças apenas por resolução da agência.

Sardenberg afirmou "duvidar" de que isso seja juridicamente possível. Ele disse que os conselheiros da Anatel estão prontos para avaliar não apenas casos específicos de empresas, se atendem cotidianamente a regulamentação em vigor, mas também para debruçar-se sobre uma visão "estratégica" do setor.