Título: Xstrata quer que Vale pague US$ 95 bi
Autor: Balarin, Raquel ; Ribeiro, Ivo
Fonte: Valor Econômico, 13/02/2008, Empresas, p. B9

O valor que a Vale do Rio Doce pretende pagar pela anglo-suíça Xstrata e o que os acionistas da mineradora querem receber está muito mais distante do que as pessoas imaginam. A Vale fez chegar à Glencore, que detém 35% do capital da Xstrata, sua intenção de formalizar a oferta de compra por um preço equivalente a pouco menos de 40 libras por ação, ou US$ 76 bilhões pelo capital total. A Glencore e a Xstrata, segundo apurou o Valor, querem no mínimo 50 libras por ação, ou algo como US$ 95 bilhões.

Formalmente, a oferta da Vale não foi feita e, portanto, não tem como ter sido rejeitada. Mas o apetite da mineradora brasileira diminuiu consideravelmente desde que a Xstrata indicou que não estava satisfeita com a indicação de preço. Ou, pelo menos, a companhia tem sinalizado que seu apetite diminuiu - sempre é bom lembrar que o blefe faz parte desse tipo de operação. Há rumores no mercado, por exemplo, de que a gigante russa de alumínio Rusal (da qual a Glencore detém uma participação de cerca de 12%) não teria feito qualquer aproximação com a Xstrata. O nome da companhia teria surgido como forma de pressionar a Vale a fazer uma oferta melhor pela anglo-suíça.

"Creio que o negócio entre Vale e Xstrata ficou mesmo mais complicado de sair. A Vale não chega aos US$ 95 bilhões de jeito nenhum", diz uma fonte que acompanha as negociações, ressaltando que a companhia brasileira está fazendo de tudo para não perder o grau de investimento, classificação dada pelas agências de rating que indica investimento de baixíssimo risco. Segundo ela, o fato de a oferta de US$ 150 bilhões da BHP Billiton pela Rio Tinto estar complicada também influencia o interesse da Vale. Juntas, BHP e Rio Tinto disparariam no ranking mundial de mineradoras e controlariam quase 40% das exportação de minério de ferro transoceânica.

Embora os ganhos de sinergia entre Vale e Xstrata sejam inegáveis e que o aumento da participação da Vale em mercados como cobre e carvão tenha valor estratégico, é bom ressaltar que a mineradora anglo-suíça já foi oferecida há cerca de dois anos à brasileira. E a Vale, à época, rejeitou qualquer aproximação. É por isso que alguns vêem o interesse agora com um pé atrás e crêem ser possível que a mineradora brasileira esteja preparando um plano B.

O alvo mais provável para a segunda aquisição de porte mundial seria a americana Alcoa, que tem foco na produção de alumínio: o metal responde por um terço de seu faturamento de US$ 30,4 bilhões. O valor de mercado da Alcoa, ontem, fechou em US$ 28,3 bilhões. "A Vale conseguiria comprar a Alcoa totalmente em cash, sem ter de emitir ações. Ela já tem garantido um empréstimo de US$ 50 bilhões de sete bancos privados", diz um banqueiro de investimentos. Mesmo com um prêmio de 30%, o valor de aquisição de uma Alcoa ficaria próximo de US$ 37 bilhões. Nesse patamar, a Vale tem garantida a manutenção do grau de investimento. E, somando sua produção (alumina e metal) aos 12 milhões de toneladas de alumina e 3,8 milhões de alumínio por ano da Alcoa, passaria a disputar a liderança mundial com Rio Tinto Alcan e UC Rusal.

O setor de alumínio e alumina é um dos focos da Vale hoje. A companhia vê oportunidades de desenvolver negócios integrados com operações de baixo custo. Em alumina, a empresa pretende duplicar sua produção, de 4,3 milhões de toneladas (2007) para 8,2 milhões em 2012. Além disso, toca outro projeto com a Norsk Hidro com porte semelhante. Em bauxita, a empresa desenvolve projeto gigante na Amazônia e faz pesquisas no sudoeste do Pará, em áreas contíguas à da Alcoa, em Juruti, além de deter 40% da MRN, consórcio em que a Alcoa tem quase 20%.

A perspectiva da Vale é de que o mercado de alumínio tem forte potencial de crescimento. Prevê uma demanda aquecida nos próximos cinco anos, a exemplo do que ocorreu de 2001 a 2006, quando a procura pelo metal cresceu 7% ao ano. O cenário é influenciado pela queda dos estoques de alumínio desde 2002, a maior demanda dos países emergentes do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) e o aumento dos custos de produção. Só o consumo da China, por exemplo, deverá saltar de 25,5% do mercado mundial em 2006 para 41% em 2011. Esse quadro deve dar suporte aos preços do metal, hoje na faixa de US$ 2,4 mil a tonelada.

No caso da Alcoa, especialistas dizem que será difícil para uma empresa sobreviver de um só metal - e a companhia é altamente dependente do alumínio. A americana vem enfrentando a concorrência crescente da produção de países como Omã e Dubai, das estatais chinesas e da Alcan, que acaba de ser comprada pela anglo-australiana Rio Tinto. No caso das usinas do Oriente Médio, o custo é bem menor por conta dos campos de gás natural debaixo do deserto - a eletricidade responde por um terço do custo total do produto.

A Alcoa tornou-se fragilizada desde o fracasso de Alain Belda em comprar a Alcan no ano passado. A rival acabou nos braços da Rio Tinto, que hoje é alvo da BHP Billiton. Recentemente, o "The Wall Street Journal" informou que uma das esperanças da empresa era a de que um acordo entre a BHP e a Rio Tinto levasse à venda de ativos, entre eles alguns da Alcan. A resposta da Alcoa ao jornal americano foi a de que a empresa acabara de completar seu mais lucrativo ano em 120 anos de história.