Título: IGP-M desacelera, mas continua em nível elevado
Autor: Lamucci, Sergio; Bouças, Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2008, Brasil, p. A10

Sergio Zacchi/Valor Salomão Quadros, da FGV: trajetória dos preços ainda não mostra grandes pressões de demanda O comportamento da inflação no começo do ano ainda inspira cautela. Divulgado ontem, o Índice Geral de Preços de Mercado (FGV) de janeiro ficou em 1,09%, abaixo do 1,76% de dezembro, mas acima do cerca de 1% estimado pelo mercado. As cotações agrícolas e industriais no atacado continuam em níveis ainda elevados, embora tenham mostrado variação inferior à do fim do ano passado. No varejo, a alta forte dos preços dos alimentos e das mensalidades escolares levou o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), com peso de 30% no IGP-M, a subir 0,96%, bem mais que o 0,67% de dezembro e a maior alta desde maio de 2005.

Esses números mostram que o cenário para a inflação ainda não é róseo, mas não indicam que seja necessária uma elevação dos juros por parte do BC, segundo analistas ouvidos pelo Valor. A expectativa é que os indicadores desacelerem nas próximas semanas, especialmente os alimentos.

Os preços industriais no atacado subiram 0,82% no período de coleta do IGP-M de janeiro, que vai de 21 de dezembro até o dia 20 deste mês. Houve queda em relação ao 1,02% do mês passado, mas uma alta na comparação com o 0,54% apontado pelas cotações industriais no IGP-10, que mede a evolução dos preços nos 30 dias encerrados no dia 10 de cada mês.

Uma das maiores altas veio dos adubos e fertilizantes compostos, que tiveram variação de 10,73%, como nota o economista Salomão Quadros, coordenador de análises econômicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Os produtos estão em forte aceleração: haviam subido 4,39% no IGP-M de dezembro e 8,35% no IGP-10. Para Quadros, a forte demanda global por alimentos ajuda a elevar as cotações de fertilizantes, assim como os insumos para esses produtos.

O item ferro-gusa e ferro-ligas também pressionou os preços industriais no atacado no IGP-M. Os produtos subiram 4,26%, mais do que o 1,39% apontado no IGP-10. Para o economista Raphael Castro, da LCA Consultores, o forte aquecimento na construção civil pode explicar a variação dos preços. Ele diz, porém, que é cedo ver uma pressão de demanda aí, já que em novembro e dezembro o item ferro-gusa e ferro-ligas havia registrado deflação.

Os preços agrícolas no atacado mostraram um arrefecimento razoável, ainda que a alta seja forte. Eles aumentaram 2,31% em janeiro, ante 5,95% em dezembro. Outra boa notícia é que, nesse grupo, houve recuo também em relação à alta de 2,8% apontada pelo IGP-10. Produtos como bovinos, milho e feijão tiveram queda de preços - este último produto caiu 4,28%, depois de subir 43,91% em dezembro. O recuo desses preços indica uma tendência favorável para os preços no varejo nas próximas semanas, diz Quadros.

Os produtos agrícolas que mantêm a pressão no atacado são principalmente os alimentos in natura, como destaca a Rosenberg & Associados. O tomate é o caso mais emblemático: subiu 87,22%, por conta do aumento de chuvas. Castro e Quadros dizem que essas pressões são transitórias, devendo ser revertidas nas próximas semanas.

A alta de 0,96% do IPC se deveu muito à elevação dos preços de alimentos, que subiram 2,25% em janeiro, com aceleração em relação ao 1,73% de dezembro. Segundo a Rosenberg, o grupo alimentação foi responsável por 64% da variação do IPC. A maior alta foi do tomate, de 42,48%. "No caso dos alimentos in natura, o repasse do varejo para o atacado é quase que imediato", diz Quadros. Outro aumento forte foi do feijão carioquinha, que subiu 30,38%. Mas como o produto está em queda no atacado, tudo indica que as cotações devem cair nas próximas semanas.

O grupo educação, leitura e recreação também empurrou para cima o IPC, com alta de 1,61%. É uma elevação esperada, porque as mensalidades escolares sempre sobem nessa época do ano. Integrante dos serviços - e, portanto, mais sensíveis a eventuais pressões de demanda - o grupo não exibe alta exagerada, segundo Quadros. Ele nota que, em janeiro de 2007, o grupo havia subido 1,54%. "No caso do item cursos formais, houve aumento de 2,72% em janeiro de 2008, menos que os 3,11% do mesmo mês de 2007." Para o economista da FGV, não há motivos no momento para o BC elevar os juros. "Seria conservador demais."

Para Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, o IGP-M acima do esperado preocupa, mas também não a ponto de forçar o Banco Central a pensar em uma possível elevação na taxa de juros. Ele observa que a pressão na área de alimentação ainda deve se manter. Mas, como ocorreu em 2007, a variação virá das oscilações de produtos específicos, como o feijão (que em janeiro subiu 30,38% no varejo) e o tomate (42,48%) e não de uma tendência generalizada de aumentos. "A pressão sobre alimentos ainda deve se manter, novamente com altas localizadas, mas deflação agrícola está fora de cogitação."

Vale diz que alguns produtos tiveram queda no atacado em janeiro em função da entrada do período de safra - como o caso de bovinos batata-inglesa, feijão e milho - e que o efeito no varejo deve ser sentido ao longo de fevereiro. "Há tendência de desaceleração lenta, com o IPC ficando na faixa de 0,55%, ainda com pressão de alimentos e educação, e um IGP em 0,7% ou 0,6%."

Fábio Silveira, sócio da RC Consultores, considerou altos o IPC e o IPA, mas dentro de um limite de flutuações "aceitável". "A pressão no atacado está diminuindo, o que não significa que os índices no varejo recuarão com a mesma velocidade." Ele observa que os indicadores para o varejo de fevereiro tenderão ainda a registrar oscilações mais significativas por conta dos reajustes tradicionais nas áreas de educação e de alimentos. "Mas o IGP já deve vir mais baixo, numa faixa de 0,5% a 0,6%."

Segundo ele, a comercialização da colheita já iniciada de produtos como arroz, feijão, soja e milho deve ajudar a desacelerar a alta de alimentos. Um levantamento da RC com base em uma cesta de 14 produtos agrícolas negociados em São Paulo apontou queda de 1,4% nos preços no atacado na semana encerrada no dia 25, com recuo de tomate (20,4%), milho (10,3%), carne suína (9,5%), ovos (4,6%), frango (2,3%), café (0,9%) e soja (0,7%). "Os preços do álcool combustível também se enfraqueceram em janeiro e devem recuar em fevereiro. Isso pode animar o BC a reduzir os juros no fim do semestre."

O Índice Nacional de Custos da Construção (INCC), com peso de 10% no IGP-M, teve alta de 0,41% em janeiro, variação quase idêntica ao 0,43% de dezembro. Em 12 meses, o IGP-M sobe 8,38%.