Título: E agora, vai?
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 13/02/2008, Eu, p. D1

Ao ultrapassar ontem a marca de 61.200 pontos - e fechar aos 61.805 pontos, com alta de 1,92% -, o Índice Bovespa (Ibovespa) voltou a assumir tendência de alta no curto prazo. Segundo os analistas técnicos - os chamados grafistas, que identificam a direção dos preços em representações estatísticas sem levar em conta o ambiente macro -, o indicador rompeu uma importante resistência e agora está livre para buscar o topo histórico de 66.500 pontos, de 7 de dezembro, e, quiçá, alçar a casa dos 70 mil pontos já em março. Isso não quer dizer que a trajetória até lá não será entremeada de percalços. Os analistas alertam que subidas rápidas, invariavelmente, desencadeiam movimentos de realização de lucros.

Por trás das interpretações gráficas estão teorias como a chamada "seqüências de Fibonatti", que diz que tudo na natureza tem padrões de comportamento repetitivo, obedecendo certas freqüências matemáticas. Os analistas técnicos identificam tais freqüências nos movimentos da bolsa e, ao observar o passado, projetam uma série de expectativas de preços futuros. Daí saem termos como "resistência" (nível mais alto de preços em que pode haver pressão de venda), "suporte" (ponto mais baixo de preços que pode desencadear compras) ou os "canais de alta ou de baixa", formados entre duas retas paralelas, indicando bom momento para compra ou para venda.

Após superar os 61.200 pontos, o mercado retomou a força compradora de curto prazo, afirma o analista da Itaú Corretora Márcio Lacerda. Ele cita que no pregão de ontem, na esteira das valorizações dos pregões internacionais - e também do vencimento do Ibovespa futuro hoje -, muitos papéis passaram a ter indicação gráfica de compra, como Net PN (preferencial, sem voto), Vale PNA e ON (ordinária, com voto), além de Lojas Renner ON e B2W ON. "As varejistas chegaram aos níveis da primeira fase da crise do subprime, quando o Ibovespa estava em 45 mil pontos, e o preço baixo acabou atraindo novos investidores."

Apesar dos tombos sistemáticos do mês passado, a longa tendência de alta do Ibovespa, iniciada em outubro 2002, foi preservada e seguiu bem marcada, diz o gerente de mesa da HSBC Corretora, Jeferson do Amaral. Mas a pressão vendedora chegou a assustar. "De 11 a 23 de janeiro, quase todos os pregões foram para baixo e aquela série quase se confirmou como tendência", lembra. De dezembro para cá, o que mais preocupava era que a inclinação de alta de longo prazo vinha mostrando sinais de enfraquecimento, com as máximas atingidas pelo indicador caindo sucessivamente de pontuação. Ontem, o topo de 61.805 pontos foi diferente dos quatro anteriores. "Pode ser um sinal de reversão da tendência declinante."

Isso não quer dizer que seja o momento de comprar ações a torto e a direito. Amaral sugere que investidor espere a tendência de alta se confirmar e então faça uma análise detalhada dos papéis que lhe interessam, utilizando a análise técnica em conjunto com a fundamentalista. "Os fundamentos ajudam a escolher o ativo, enquanto os gráficos são mais eficientes para identificar o momento de compra ou venda." Tal discurso, hoje recorrente até entre fundamentalistas de carteirinha, mostra que o histórico embate entre as duas escolas de análise começa a encontrar pontos de convergência. "O gráfico transparece todo o sentimento do mercado e nele é possível se ter a percepção do que arbitradores e especuladores estão fazendo", diz Amaral. "Até o que os fundamentalistas pensam acaba sendo expresso nas curvas."

A alta de curto prazo sinalizada nas linhas e figuras traçadas pelos grafistas também não encerra os tempos de volatilidade para a bolsa brasileira. A analista do Santander Sílvia Afonso diz que 2008 ainda promete muita incerteza. "Não será um ano fácil para a bolsa, diferentemente dos últimos cinco anos em que era possível carregar ações sem muito medo de errar", diz. "As altas e baixas têm sido muito rápidas." Para a especialista, o Ibovespa deve oscilar numa faixa entre 52.500 e 66.500 pontos. Se o caldo azedar, para menos de 52.500, daí o indicador tende a testar outros suportes, primeiro os 45 mil pontos e depois os 42.500. Ao investidor com apetite para operar volatilidade, ela recomenda ficar atento a esses movimentos de curtíssimo prazo. No médio e longo prazo, sugere reduzir as posições em ações.

Enquanto o gráfico diário mostra que o Ibovespa saiu do canal de baixa, tendo iniciado um pequeno rali, os gráficos longos ainda não mostram uma tendência firme, diz o analista da Ativa Corretora Rubens Góes. No gráfico mensal, o suporte e a resistência estão em 53 mil e 66.500 pontos, respectivamente, intervalo no qual o mercado deve trabalhar nos próximos meses.

Comparada ao mercado americano, a bolsa brasileira tem mostrado melhor forma, explica o instrutor de análise técnica da CMA, Rivadavila Malheiros. Na segunda quinzena de janeiro, o Standard & Poor's 500 chegou a cair abaixo dos 1.300 pontos, retomando os níveis de agosto de 2006, enquanto o Ibovespa apenas devolveu a alta acumulada até setembro de 2007. Mesmo com a valorização desenhada no curto prazo, ele diz que o momento não é para "casar" com os papéis, apenas "ficar". "Sai de cena o investidor que compra aleatoriamente e começa a ganhar destaque o mais especializado, que identifica o momento mais propício de comprar e vender."