Título: Petróleo e excesso de oferta desafiam aéreas em 2008
Autor: Campassi , Roberta
Fonte: Valor Econômico, 09/01/2008, Empresas, p. B2

Os dirigentes das companhias aéreas não têm tido muito sossego. Se, por um lado, a turbulência nos aeroportos brasileiros deu trégua durante as festas de fim de ano, o preço do barril do petróleo bateu os US$ 100 e ameaça a rentabilidade das empresas do setor.

Neste ano, as companhias aéreas de abrangência nacional tentarão achar o ponto de equilíbrio entre duas forças antagônicas. De um lado, há uma forte pressão a favor do aumento dos custos com combustível. De outro, existe pouca margem para elevar os preços das passagens e, assim, compensar o aumento dos gastos.

As projeções para o preço do petróleo nos próximos meses são variadas (US$ 82, para a Merrill Lynch, US$ 75 para o Santander ou US$ 150 para a Agência Internacional de Energia), mas boa parte dos analistas acredita que o barril será negociado a preços superiores a US$ 72,4, cotação média em 2007. O querosene de aviação (QAV), derivado de petróleo utilizado nos aviões, deve acompanhar a elevação (ver tabela acima sobre a correlação entre os preços dos produtos).

A Gol Linhas Aéreas, vice-líder do mercado brasileiro, projeta o barril de petróleo a US$ 90 para 2008. A TAM, líder, não informa sua estimativa. Nas duas empresas, o combustível corresponde a cerca de 40% de todos os custos envolvidos nas suas operações. A proporção já foi menor no passado - em 2003, por exemplo, era de 30% no caso da Gol - mas não resistiu ao aumento contínuo no preço do petróleo. Um cálculo apresentado pela TAM em novembro do ano passado dá uma idéia do real impacto dessa elevação. Para cada US$ 5 de aumento no preço do barril em Nova York (WTI), a conta de combustível da empresa sobe aproximadamente R$ 300 milhões ao ano.

"O QAV continuará pesando na conta das aéreas mesmo que o petróleo se estabilize", afirma Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE). "O patamar já está muito alto."

Como quaisquer grandes companhias aéreas, TAM e Gol têm políticas de "hedging", operações financeiras de proteção ao risco das oscilações de preços. O ponto-chave é saber se vale a pena lançar mão dessas políticas agora, diante de um cenário instável. Desde novembro, a TAM elevou a proporção de sua conta de combustível com "hedge". Antes, a fatia protegida era de 37% para os primeiros dois trimestres de 2008. Agora, 42% do combustível está protegido até janeiro de 2009, segundo a assessoria de imprensa da companhia.

A Gol, por sua vez, não forneceu a porcentagem que está protegida, mas estima que conseguirá gastar menos neste ano, por litro de QAV, do que gastou no ano passado. Em 2007, ela pagou R$ 1,65 por litro de combustível e, em 2008, projeta gastar R$ 1,60 - mesmo projetando uma alta no preço do petróleo. "Essa projeção é bem otimista, inclusive porque o 'hedge' da Gol é de curto prazo, não tem impacto muito longo", afirma Caio Dias, analista do banco Santander.

Portanto, sem controle total sobre o preço do combustível, as empresas farão outros esforços de economia. Com novos aviões, será possível reduzir proporcionalmente o consumo de QAV. A partir deste ano, a TAM terá uma frota composta apenas por aviões Airbus, mais econômicos, uma vez que devolveu os últimos Fokker 100. A Gol, por sua vez, trocará 13 Boeings 737-300 por 13 do modelo 737-800, mais modernos e eficientes. Também estão previstos reduções em outros gastos que, no total, devem chegar a 7%, na TAM e 3,5%, na Gol. A valorização do real frente ao dólar também é positiva para o balanço das aéreas.

Uma reportagem publicada pelo "Financial Times" e reproduzida pelo Valor, ontem, mostra que as companhias aéreas americanas também estão às voltas com o problema da alta do petróleo e ainda mais preocupadas com o fantasma da recessão nos Estados Unidos. O desaquecimento da economia levaria à redução da demanda e à impossibilidade de repassar os custos aos passageiros.

No Brasil, a demanda não será problema, ao que tudo indica. O setor aéreo projeta um crescimento entre 8% e 12%, ou cerca de o dobro do aumento estimado para o Produto Interno Bruto (PIB). Mas as companhias aéreas terão a mesma dificuldade em repassar uma eventual elevação dos custos e manter a rentabilidade, ainda que o motivo disso não seja recessão e sim o excesso de oferta.

Gol e TAM, que juntas, detinham 94% do mercado doméstico em novembro, vão ampliar sua oferta com a chegada de um total de 21 novos aviões em 20% e 14%, respectivamente. Portanto, para fomentar a demanda e manter os vôos cheios, as companhias terão que oferecer tarifas mais baratas. Essa tendência será ainda maior se o tumulto nos aeroportos continuar ocorrendo e afastando passageiros. Alguns analistas acreditam que as empresas podem vir a adiar a chegada de alguns aviões para melhorar a ocupação das aeronaves. A OceanAir, com 2% do mercado, não divulga informações financeiras e não deu entrevista.

As melhores perspectivas para 2008 estão no mercado internacional, desde que o Brasil continue crescendo. A Varig, pertencente à Gol, vai inaugurar vôos de longo curso para Nova York, Miami, Madri e Cidade do México e consolidar aqueles inaugurados no segundo semestre de 2007. A TAM pretende criar três novos vôos ou freqüências. Entre os destinos estudados estão Los Angeles, nos Estados Unidos, e África do Sul.