Título: Foco no risco
Autor: Pavini , Angelo
Fonte: Valor Econômico, 09/01/2008, EU & Investimentos, p. D1

O ano para os fundos multimercados começa com a ressaca de 2007, que terminou com vários deles devolvendo boa parte dos ganhos do primeiro semestre em meio à crise das hipotecas americanas a partir de agosto. Olhando para os gestores independentes com estratégia macroeconômica, que têm a gestão mais sofisticada, podemos acompanhar o baque. Numa amostra feita pelo Valor com base no site Fortuna, de 47 carteiras, 25 superaram o CDI no ano. No primeiro semestre, quando havia 49 fundos, 42 ganhavam do referencial. Nenhum, porém, fechou o ano no vermelho.

Entre 13 carteiras com patrimônios acima de R$ 300 milhões, nove superam o CDI, de 11,82% em 2007. O destaque fica com o fundo da Black River, braço de gestão de recursos da multinacional Cargill, que acumulou lucro de 22,12%, com ganhos especialmente no mercado de juros e inflação e mecanismos de proteção em bolsa.

Independentemente do patrimônio, chama a atenção entre os fundos macro o da gaúcha Solidus, que lucrou 80%. Criado em fevereiro do ano passado, o fundo é bastante agressivo e chegou a ficar com 100% da carteira em Petrobras - que subiu 84% em 2007 -, o que explica o forte ganho, diz a gestora Débora de Souza Morsch. "Avisamos o cliente que este fundo pode ficar totalmente em renda fixa ou em um papel só", explica. Não por menos, o indicador de risco da carteira, o Value at Risk (VaR), mostra possibilidade de perda de 41% ao ano - acima dos 35% de muitos fundos de ações.

Porém, muitas estrelas sofreram. O Gávea Brasil, do ex-presidente do BC Armínio Fraga, teve perdas em agosto, mas conseguiu fechar o ano acima do CDI. Já os fundos de dois ex-diretores do BC, o Ciano, de Ilan Goldfajn, e o Mauá, de Luiz Fernando Figueiredo, terminaram abaixo. O Lacan, do também ex-diretor do BC Luis Augusto Candiota, por sua vez, tirou proveito da crise. E o JGP, onde está o ex-diretor Rodrigo Azevedo, também não fez feio.

Ninguém estava com visão negativa no começo do ano passado, o que aumentou o impacto da crise de agosto, lembra Ilan Goldfajn, da Ciano. "Agora, a situação mudou e, com o mundo mais incerto, os multimercados voltam a ser opção por serem ágeis para se ajustar ao cenário, extraindo valor das lições do ano passado." Goldfajn não acredita em recessão nos EUA, mas espera um primeiro semestre difícil e melhora no segundo. No Brasil, ele acha que a inflação não está em níveis "assustadores" e destaca que o juro projetado já embute um aumento razoável de 2 pontos da taxa básica. "A notícia ruim já foi captada".

Na Mauá, a maior parte das perdas ocorreu na parte de arbitragem com ações, ou long/short, explica Luiz Fernando Figueiredo. Este ano, o peso do long/short nas carteiras foi reduzido, mas mesmo assim a Mauá reforçou sua área de gestão e análise de renda variável. "Achamos que, depois das quedas do ano passado, há ativos com bom potencial de ganho, apesar do risco maior hoje dos mercados pela incerteza nos EUA", diz Figueiredo. Ele também não acredita em recessão nos EUA, nem vê necessidade de alta nos juros no Brasil, pois as pressões sobre a inflação tendem a ser menores. Para Figueiredo, o mais importante para o setor de multimercados é que, apesar da crise, não houve nenhum desastre. "E o investimento tem se mostrado interessante para parte dos recursos no longo prazo".

A capacidade de ler corretamente o cenário econômico internacional fez a diferença em 2007, avalia Walter Maciel, diretor da Quest Investimentos, empresa que tem o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros como sócio. A Quest apostou no descolamento das economias emergentes da americana e ganhou com papéis como Vale, beneficiada pelo aquecimento chinês. "Olhamos também o mercado interno, o aquecimento dos setores imobiliário, automotivo, de varejo eletrônico e o setor elétrico, em que a falta de chuvas pode pressionar o preço da energia." A casa também ganhou com a aposta nos cortes de juros no primeiro semestre e na queda do dólar, e soube se proteger da crise com hedge no exterior. Para 2008, o cenário é positivo, mas os riscos cresceram, não só pela economia americana, mas pelo desaquecimento também em Europa e Japão. "Há risco de crises imobiliárias também em países europeus."