Título: Recompra de ações aumenta na crise
Autor: Valenti, Graziella ; Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 29/01/2008, Empresas, p. B3

O cenário de instabilidade e correção dos preços na Bovespa, por conta da crise dos mercados financeiros globais, acelerou o lançamento de programas de recompras de ações pelas companhias abertas. Só neste mês, oito empresas aprovaram a aquisição de seus próprios papéis como forma de investimento do caixa.

Anunciaram programa de recompra Gerdau, Tegma Gestão Logística, Drogasil, Localiza Rent a Car, ABNote, Coteminas, Banco Pine e Bradespar. Considerando a média das cotações dos últimos 30 dias no pregão paulista, as intenções de compra dessas empresas somariam R$ 407 milhões. No entanto, as aquisições podem ser feitas durante até 12 meses, conforme a duração do programa de cada companhia. Além disso, há a possibilidade de que as recompras não se concretizem. Após lançar o programa, a empresa pode ou não executá-lo.

O volume acima não considera as recompras feitas e programadas por Telemar Norte Leste e CSN, tradicionais usuárias dessa ferramenta. Só essas operações podem chegar a R$ 426 milhões. A siderúrgica, porém, estipulou prazo curto para a possível aquisição dos papéis: até 27 de fevereiro.

É comum que em momentos de baixa no mercado de ações as companhias tomem tal atitude. "É uma sinalização importante da empresa. Significa que, de todas as aplicações que pode fazer com o dinheiro, as suas ações são a melhor", afirma Catarina Pedrosa, analista-chefe do Banif Investment Banking. A especialista destaca ainda que, ninguém melhor do que a própria companhia para saber o valor de seu negócio. Por isso, a indicação que os papéis estão baratos é relevante.

Pedro Rudge, sócio da gestora de recursos carioca Investidor Profissional, explica que a recompra de ações muitas vezes se torna opção interessante para a companhia nesses períodos em que as cotações em mercado estão baixas. "A conta que a companhia considera é se o potencial de ganho é superior ao que foi projetado com a rentabilidade prevista do próprio negócio que ela está tocando."

A iniciativa é regulada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) desde 1980. As empresas podem recomprar até 10% das ações em circulação no mercado e deixa-las em tesouraria por até 90 dias. Depois, devem optar por cancelar esses papéis ou revendê-los no mercado. Tais programas de recompra devem ser aprovados pelo conselho de administração e podem ficar abertos por até um ano.

Reginaldo Alexandre, vice-presidente da Apimec-SP, associação dos analistas de investimentos, explica que os programas de recompra também contribuem para melhorar a liquidez, enquanto vigentes, em tempos de instabilidade. "Provê liquidez para quem, naquele momento, precisa ou quer vender as ações", diz ele, lembrando que além da queda na cotação, muitas vezes, cenários assim prejudicam as negociações pela diminuição do dinheiro em circulação.

Por conta da prerrogativa que a empresa possui de não executar o programa, Rudge recomenda acompanhar o tema com atenção, para verificar se os papéis foram efetivamente comprados. "A questão é que só se consegue observar se a recompra foi feita ou de que tamanho foi quando saem as informações trimestrais seguintes, a não ser que a própria empresa anuncie", observa ele. "Por isso, é preciso ter um cuidado com a credibilidade, ou seja, para que não se use isso apenas como uma maneira de enviar uma sinalização positiva", diz.

Para lançar um programa de recompra, a companhia não pode comprometer recursos superiores ao saldo de lucros ou reservas disponíveis no último balanço publicado. No final do ano passado, a Rodobens teve sua iniciativa vedada pela CVM por não possuir reservas suficientes.

Alexandre, da Apimec-SP, lembra que a aplicação de dinheiro na compra de ações de sua própria emissão não pode comprometer projetos de crescimento do negócio no longo prazo e nem a eficiência da aplicação financeira do caixa. Em geral, para adotar tal estratégia, a companhia deve ter um excedente de dinheiro disponível.

Dentre as empresas que anunciaram programas estão algumas das novatas da Bovespa, que abriram capital em 2007, visando a capitalização para aquisições de outras companhias ou novos projetos. As ações dessas empresas estão dentre os destaques negativos da crise em razão da liquidez reduzida. As pesadas vendas feitas às pressas pelos estrangeiros por conta das turbulências puxaram as cotações para baixo.

A despeito de ser uma sinalização positiva para os investidores, os especialistas alertam para alguns cuidados, especialmente, no caso das companhias que captaram recursos recentemente. "É importante que a empresa não deixe de cumprir o que prometeu no prospecto. Afinal, foi o que formou o preço na oferta das ações", afirma Edison Garcia, superintendente da Associação dos Investidores do Mercado de Capitais (Amec).

Outro cuidado é avaliar se a retirada das ações de circulação, no médio prazo, não prejudicará a liquidez dos papéis - especialmente, no caso das empresas que já padecem com esse problema. Nessa situação, a companhia deve avaliar revender as ações, no lugar de cancelar, embora essa seja a opção preferida dos investidores. O cancelamento das ações em tesouraria amplia o lucro e o dividendo pago por ação, uma vez que diminui o total de papéis emitidos.