Título: Brasil cresce aos olhos da americana GE
Autor: Balarin , Raquel ; Ribeiro , Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 10/01/2008, Empresas, p. B6

Na terceira visita ao Brasil, Jeffrey Immelt, presidente da GE, diz que quer ser grande fornecedor da Petrobras e que infra-estrutura é uma de suas grandes apostas para a América Latina: "Nossa presença era inferior ao potencial da região" O hotel Hyatt, na zona sul de São Paulo, viveu dias movimentados no início da semana. Por lá passaram grandes líderes brasileiros, como os banqueiros José Safra, Gabriel Jaramillo e Fábio Barbosa e os empresários Eike Batista, da MMX, David Feffer, da Suzano, Vitor Hallack, da Camargo Corrêa, e David Barioni e Marco Bologna, da TAM, além do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Todos foram ao encontro de um dos maiores nomes do mundo corporativo: Jeffrey Immelt, presidente executivo e do conselho de administração da gigante americana General Electric, uma das maiores companhias do globo, com valor de mercado de cerca de US$ 362 bilhões - duas vezes o valor das reservas cambiais brasileiras.

Immelt, um americano de 51 anos que sucedeu o lendário Jack Welch na presidência da GE, fez questão de se encontrar com alguns de seus maiores clientes e parceiros nessa sua terceira visita ao Brasil desde que assumiu o comando da companhia, no fatídico mês de setembro de 2001. O corpo-a-corpo diz muito sobre as intenções da GE para o Brasil. "A América Latina é uma região-chave de crescimento para a companhia nos próximos anos", diz Immelt, em entrevista exclusiva ao Valor, a primeira que ele dá a um jornal local. Hoje, a região representa apenas 3,5% do faturamento de US$ 172 bilhões da General Electric, companhia que fabrica de equipamentos hospitalares a microondas, locomotivas, compressores e até turbinas de avião, além de prestar serviços financeiros. Mas essa participação certamente será maior em alguns anos.

Em um mea culpa raro entre grandes executivos americanos, Immelt diz que grandes companhias dos EUA, por um longo período de tempo, olharam para o Leste e o Oeste, e não para o Sul. "De muitas maneiras, os europeus fizeram um trabalho muito melhor que os americanos ao olhar para a América do Sul", afirma. Ele também ressalta que a globalização e o advento da China fizeram com que países de economias baseadas em matérias-primas e no agronegócio - como Brasil, Colômbia, Venezuela e Equador - passassem a ser percebidos de outra maneira pelo mundo. "Agora, estamos crescendo agressivamente na região, onde a companhia tem uma penetração inferior à que tem em outros países."

A meta de Immelt é de que as receitas da GE alcancem na América Latina de US$ 10 bilhões a US$ 12 bilhões em 2010. Desse total, o Brasil deverá contribuir com um terço. "Isso significa um crescimento de 15% a 20% a cada ano, acima da expansão projetada para toda a companhia", diz o executivo, bem-humorado. Para 2008, a GE trabalha com a previsão de crescimento global do faturamento de 10% - um número que pode soar otimista, tendo em vista que o país-sede da companhia, os Estados Unidos, vive um momento de forte desaceleração econômica.

O crescimento em meio à turbulência americana é fruto da estratégia consolidada por Immelt à frente da GE. O executivo decidiu ir fundo no conceito de globalização e hoje a companhia está presente em cem países. Em 2007, pela primeira vez, mais da metade da receita veio de operações fora dos Estados Unidos. E a diversificação de produtos e de localização geográfica ajuda a compensar desempenhos mais fracos em um ou outro país.

No Brasil, que recentemente substituiu o México no papel de sede dos negócios da GE na América Latina, uma das suas grandes novidades para 2008 será a entrada no setor imobiliário. Immelt diz que quer repetir aqui o exemplo bem-sucedido da GE no México e não esconde que está em busca de um parceiro local. O nome é mantido sob sigilo, mas o Valor apurou que, entre as opções apresentadas pelo banco JP Morgan estaria a Cyrela. A empresa imobiliária, controlada por Elie Horn, tem uma subsidiária que se encaixa como uma luva nos planos de Immelt, a Cyrela Commercial Properties, voltada para empreendimentos comerciais.

"Tipicamente iniciamos nossas operações com edifícios comerciais, shoppings, depósitos e empreendimentos desse tipo. Temos investimentos em imóveis comerciais na Europa Oriental, no México, Tailândia, Índia", explica Immelt, indicando que está disposto a ter participação acionária em uma empresa desse ramo no Brasil. Em um segundo momento, o executivo da GE não descarta a concessão de financiamentos para pessoas físicas adquirirem suas casas. Mas ele deixa claro que, para isso, precisaria ter um conhecimento muito mais profundo do mercado brasileiro. A operação na área residencial, portanto, não está no radar no curto prazo.

A área imobiliária está no centro das atenções da GE no Brasil, mas está longe de ser a única oportunidade vislumbrada por Immelt no país. "Provavelmente, 80% dos negócios da companhia, talvez mais, terão presença no Brasil de alguma forma." Uma das grandes apostas é a área de infra-estrutura, que hoje representa 40% do faturamento global da GE. A empresa, que já exporta locomotivas até para a Jordânia a partir do país, quer ampliar sua presença em ferrovias, petróleo e gás e, principalmente, em energia. Em dezembro, por exemplo, a companhia anunciou um investimento de US$ 54 milhões na aquisição de uma participação em um navio para perfuração de petróleo na costa brasileira. O Peregrine I presta serviços para a estatal brasileira Petrobras, que também participou de conversas com Immelt em sua visita ao país.

Na área de petróleo, Immelt quer ser um grande fornecedor de tecnologia para a Petrobras, em equipamentos para exploração em águas profundas ou em transporte. "Há uma enorme descoberta na costa brasileira (a reserva de Tupi) e podemos ser um grande provedor de tecnologia para a exploração de petróleo na camada abaixo do mar, o que pode gerar uma tremenda receita para nós ou para qualquer um que venha a desenvolver as descobertas de petróleo offshore no Brasil."

Com relação aos biocombustíveis, a visão de Immelt é um pouco diferente. Seu maior foco são as usinas, para as quais pode fornecer de equipamentos para tratamento da água a produtos para geração de energia. Já está em desenvolvimento na GE uma turbina para geração de energia a partir do etanol. Immelt diz que, em suas visitas ao Brasil, faz questão de estudar a questão dos biocombustíveis, a tecnologia da cana-de-açúcar e que isso faz diferença na sua forma de avaliar o etanol nos EUA, por exemplo. Mas ele prefere o etanol a partir do milho ou da cana-de-açúcar? A resposta é uma sonora gargalhada e um comentário sobre como os fazendeiros poderiam utilizar sua informação.

Na área financeira, a GE já atua no Brasil em duas frentes. A primeira é a de financiamento ao consumo, por meio de sua GE Money. A segunda é a área comercial, com leasing de aeronaves, por exemplo. E também na área financeira novidades estão a caminho.

Immelt, por exemplo, admitiu que a força de competidores locais impediu um forte avanço na área de financiamento ao consumo. A estratégia será se associar a um parceiro para aproveitar o bom momento do crédito. Nas finanças comerciais, o executivo crê que o esperado "investment grade" (classificação dada por agências de risco indicando uma boa segurança do investimento), previsto para este ano, poderá ampliar os negócios da GE no país. "Quanto à indústria, a questão é ter a tecnologia e os projetos corretos. E isso independe de o Brasil ser ou não investment grade. Em serviços financeiros, isso pode ajudar."

Falante ao discorrer sobre os negócios do grupo ou sobre as perspectivas de crescimento na América Latina, Immelt é bem cuidadoso ao comentar cenários políticos e econômicos da América Latina. Interrompe a repórter em uma pergunta cuja premissa era a sobrevalorização do real: "Isso é o que você diz", para depois emendar que a estratégia da GE é fabricar produtos de alta tecnologia e alto valor agregado, que podem suportar oscilações do câmbio. E a regra está sendo seguida por aqui. "O Brasil está se transformando em um país rico. Países ricos têm moedas mais fortes. São coisas boas. Os consumidores podem comprar mais por aqui. É um ciclo virtuoso", diz Immelt, que esteve com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na primeira visita ao Brasil em 2005. Detalhe: na época, a maioria dos homens de negócios dos EUA se referia à Lula como aquele que era chefe de um sindicato de esquerda.

Com seu afiado tino político, Immelt evita se estender muito na avaliação de Lula ou de suas políticas econômicas, limitando-se a dizer que há no Brasil uma convergência entre o que a sociedade quer e o que está acontecendo com o país. Ele ainda se estende em elogios sobre a América Latina sobre como a alta das matérias-primas, a maior transparência e a eleição de bons governantes tiveram um impacto positivo para a região. Alertado que a região também elegeu presidentes como Evo Morales, na Bolívia, ou Hugo Chávez, na Venezuela, Immelt diz que suas referências são gerais, para a região, e que não está citando de forma específica um ou outro país.