Título: Dilma mostra novo estilo diplomático
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Fonte: Correio Braziliense, 02/02/2011, Opinião, p. 16

Não se aguardava que a visita da presidente Dilma Rousseff à Argentina, a primeira ao exterior, conseguisse dissolver algumas das persistentes tensões econômicas entre os dois países. Nem poderia ser de outra forma. A motivação de ambas as governantes, Dilma e Cristina Kirchner, era a de reafirmar a importância das relações bilaterais, valor político que deve inspirar a acomodação futura de divergências contenciosas. A ocasião servia, como de fato ocorreu, para a troca de amenidades úteis a uma interação pessoal mais consistente, não simples platitudes ditadas pelo protocolo.

A ida de Dilma à Argentina, antes de viajar aos Estados Unidos, maior parceiro comercial do Brasil, mostra a relevância que atribui ao intercâmbio regional. Diferente do antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, destacou-se por transitar de um a outro evento com absoluta discrição. Nada de gestos exagerados, exibições à margem das disciplinas protocolares, discursos gongóricos ou apelos a tiradas humorísticas. Sinalizou no sentido de que usará a circunspecção como estilo pessoal de agir no plano externo. No plano interno, tal conduta se mantém desde a posse.

A estada da presidente em Buenos Aires valeu, sobretudo, pelo precioso recado à comunidade internacional. Disse ela: ¿Fiz a primeira viagem para a Argentina porque considero que a Argentina e o Brasil são cruciais para que possamos transformar este século 21 no século da América Latina¿. Ditas no contexto de diálogo entre as duas nações mais pujantes da região, as palavras de Dilma contrapõem os que pensam o mundo como espaço das nações mais ricas. Definem rumo mais avançado às ações da política exterior, chamada a intensificar o intercâmbio com os mercados mais dinâmicos do mundo sem frustrar maior entrosamento das economias latino-americanas.

É possível prever que, na esteira da nova dimensão diplomática, a presidente Dilma Rousseff cogite ações específicas, no âmbito do bloco, para apressar a conversão do Mercosul em verdadeira união aduaneira. Entre as muitas causas que dificultam a consumação do projeto, figura o superavit brasileiro nas transações econômicas com o vizinho (US$ 4,1 bilhões, em 2010, e previsão de US$ 5,5 bilhões, este ano). Empresários do outro lado da fronteira acusam empresas brasileiras de praticar dumping.

Se depender do secretário argentino de Comércio, Guilhermo Moreno, em breve haverá novas barreiras ao ingresso de bens made in Brasil. O empenho de Dilma e de Cristina em garantir a associação estratégica dos dois países ¿ segundo revelado à imprensa ¿ com certeza operará mecanismos conjuntos para a busca da conciliação. Quanto aos 15 acordos celebrados, é notório que representaram apenas manifestação de intenções. O que importa é a abertura, na administração Dilma, da primeira porta para busca de convivência harmoniosa com a Argentina.