Título: País está em período de 'grande moderação'
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 14/01/2008, Brasil, p. A5

Ruy Baron / Valor Mário Mesquita, diretor de Política Econômica do Banco Central: a variação do crescimento se tornou menor O diretor de Política Econômica do Banco Central, Mário Mesquita, arrisca afirmar que o Brasil entrou em um período que os economistas chamam de "a grande moderação", depois crescer por 23 trimestres consecutivos, no mais longo ciclo de expansão desde o início da década de 1990. "A economia não apenas cresce a altas taxas", afirmou. "A variação do crescimento também se tornou menor, o que indica que o Brasil pode ter iniciado a grande moderação."

Desde 1984, o crescimento dos EUA e de outros países desenvolvidos passou a ter altos e baixos mais suaves. Os economistas começaram a estudar o fenômeno no início da década, mas foi a partir de 2004 que a grande moderação ganhou maior visibilidade, ao ser citada em exposição do hoje presidente do Federal Reserve (o BC dos EUA), Ben Bernanke. Recentemente, a calmaria passou a ser ameaçada pela crise do mercado americano de hipotecas de segunda linha.

"Com certeza o Brasil iniciou o seu período de grande moderação", afirma o gerente de política monetária do Itaú, Joel Bogdanski. "À primeira vista, parece razoável dizer que o Brasil iniciou o que se chama 'a grande moderação'", afirma o economista José Júlio Sena, da MCM Consultores. "A grande moderação na economia mundial ainda é uma hipótese a ser testada, sobretudo em um momento de incerteza como o atual, mas é certo que a economia brasileira tende a ser muito menos volátil do que foi no passado", afirma o estrategista do ABN Amro Asset Management, Hugo Penteado.

Por muito tempo se acreditou que as economias não conseguiriam ter, ao mesmo tempo, baixa volatilidade da inflação e baixa volatilidade do crescimento. Um BC só seria capaz de manter a inflação estável se, ao menor sinal de alta dos preços, reagisse com energia, deprimindo a economia.

Há várias teorias que tentam explicar o que mudou na economia mundial, iniciando o período de grande moderação. Alguns economistas acham que foram os avanços tecnológicos, sobretudo na área de informática. "Antes, as lojas de varejo tinham informações imperfeitas sobre estoques e demoravam mais a se ajustar", afirma Sena. "As encomendas às indústrias eram mais voláteis e a produção mais sujeita a paradas bruscas."

Outros economistas avaliam que a grande moderação se deve à maior eficiência da política monetária, seja porque os banqueiros centrais se tornaram mais habilidosos ou porque houve avanços institucionais importantes, como a adoção do regime de metas de inflação em várias economias.

E um grupo não pequeno de observadores sustenta, com base em estudos econômicos, que o período de calmaria econômica se deve à pura sorte, já que faz um bom tempo que o mundo não é atingido por turbulências de grandes proporções, como a crise do petróleo dos anos 1970.

No caso do Brasil, esses três fatores parecem ter dado uma contribuição importante para a redução da volatilidade do crescimento. Mas os analistas econômicos dizem que um quarto fator teve um peso ainda mais importante no país: a redução da vulnerabilidade externa, por meio de superávits comerciais expressivos, do acúmulo de reservas, da redução da dívida externa e da eliminação da dívida interna indexada ao câmbio.

"Apesar de a economia brasileira ser relativamente fechada, o câmbio sempre foi um preço importante", diz Bogdanski. "Desvalorizações cambiais causavam aceleração da inflação, exigindo reação mais dura da política monetária, que levava à queda do crescimento." Hoje, com a economia externa mais sólida, são menos prováveis grandes oscilações do câmbio.

A economia se tornou mais sólida a choques, em parte, porque as políticas fiscal e monetária se tornaram mais sólidas no Brasil. "A sorte também foi importante", afirma Sena, argumentando que foi mais fácil fazer o ajuste externo e colocar a economia interna em ordem em um período de forte crescimento mundial e de alta dos preços de commodities. "Pode-se discutir se o Brasil poderia ter aproveitado mais as oportunidades. Ficou devendo em vários aspectos, mas aproveitou em alguns aspectos cruciais."

Os economistas ainda discutem se a moderação veio para ficar no Brasil ou se, até agora, apenas tivemos a sorte de não ter tido uma grande crise para testar a robustez da economia. "O teste já aconteceu em setembro de 2007 e passamos com tranqüilidade", afirma Bogdanski, referindo-se ao período de maior turbulência registrado até agora na crise das hipotecas.

Penteado acha que a crise das hipotecas é uma mostra de que a economia mundial continua a criar desequilíbrios, por falha dos órgãos reguladores e do próprio mercado, e por isso não se pode falar em algo como a grande moderação. "O grande teste seria uma recessão nos EUA", afirma. "O Brasil está mais sólido para enfrentar um teste como esse, mas o teste ainda está por acontecer."