Título: Superávit primário de municípios vira déficit, aponta relatório da CNM
Autor: Rittner, Danie
Fonte: Valor Econômico, 12/02/2008, Brasil, p. A2

Os municípios brasileiros conquistaram avanços sociais expressivos nos últimos anos, como o aumento dos jovens matriculados no ensino público e a redução da mortalidade infantil, mas ainda enfrentam o desafio de melhorar esse desempenho sem deteriorar as contas fiscais nem piorar os indicadores de gestão. Na média, a situação financeira das prefeituras não pode ser qualificada como dramática - o endividamento continua longe do teto de 120% e o gasto com pessoal está abaixo do limite de 60% da receita corrente líquida, patamares fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Mas a análise das contas municipais revela que o superávit primário de 4,33% da receita líquida em 2005 se transformou em déficit de 0,45% no ano seguinte. As despesas com pessoal aumentaram de 44,14% para 45,78% no período. Outros indicadores de gestão, como custeio da máquina e até gasto com câmaras municipais, também apresentaram leve deterioração.

É isso o que aponta a edição 2006 do Índice de Responsabilidade Fiscal, Social e de Gestão, divulgado ontem pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). O relatório seleciona indicadores das prefeituras brasileiras para analisar a situação delas não somente do ponto de vista financeiro, mas de eficiência administrativa e de atendimento das obrigações sociais. Para o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, a maioria dos municípios tem conseguido elevar suas boas práticas sociais com indicadores fiscais mais saudáveis, mas ele detecta a necessidade de generalizar esse equilíbrio e ampliar a capacidade de investimento.

Ziulkoski não vê a ausência de superávit primário como um fato negativo. Aponta que o alto resultado de 2005 justifica, em parte, o gasto do excedente no ano seguinte. As grandes cidades, em geral endividadas, obtiveram superávit. O importante - e ele garante que tal passo está sendo dado - é que o aumento das despesas sociais ocorra com responsabilidade no uso do dinheiro e com melhor qualidade do gasto.

"O esforço de vencer esse desafio será tanto maior quanto maiores as necessidades de contratação de pessoal para atender às crescentes responsabilidades nas áreas sociais - o que reduz o espaço fiscal - e quanto maiores as restrições de financiamento", conclui o relatório. Ziulkoski diz que tem ficado para os municípios o "resgate da dívida social", com fortes contrapartidas a programas que levam o carimbo do governo federal, mas sem todas as transferências de recursos necessárias para dar conta do desafio.

Mesmo assim, de 2005 para 2006 as prefeituras usaram o caixa próprio para aumentar, por exemplo, gastos em educação e saúde. No total, a taxa de investimento subiu de 8,78% para 11,55% da receita líquida e garantiu melhor performance em vários indicadores. Subiram o percentual da população matriculada no ensino público municipal - de 16,16% para 17,66% -, a proporção de professores com nível superior e a cobertura vacinal.

Entre os cem municípios mais bem classificados no índice social da CNM, 41 estão no Estado de São Paulo. Mas entre as cem prefeituras com melhores indicadores fiscais, 47 estão no Rio Grande do Sul. Foram considerados critérios para a análise da situação fiscal o endividamento, a suficiência de caixa (restos a pagar do orçamento em relação às disponibilidades de caixa), gasto com pessoal e superávit primário. Nos indicadores de gestão (custeio da máquina, taxa de investimento e custo legislativo), os municípios de São Paulo e Minas tiveram a melhor classificação.

A nova versão do estudo da CNM abrangeu 4.938 dos 5.562 municípios brasileiros, dos quais 46% têm entre 5 mil e 20 mil habitantes. No topo da lista estão cidades praticamente desconhecidas. O maior índice fiscal foi obtido por Iracema (RR), enquanto o título de cidade com a melhor qualidade de gasto público ficou com São Miguel da Baixa Grande (PI). Os melhores resultados sociais foram conquistados pelo município goiano de Lagoa Santa. Entre as capitais, Vitória foi a mais bem classificada no cômputo geral.