Título: Para combater desmatamento, aperto no crédito deve atingir cadeia produtiva
Autor: Barros, Bettina
Fonte: Valor Econômico, 12/02/2008, Brasil, p. A4

Fabiano Cerchiari/Valor Capobianco: tomador de crédito terá de provar que tem matéria-prima legal O governo federal receberá na semana que vem a definição de uma série de mecanismos que passarão a ser adotados pelos bancos públicos para propriedades e empresas que desmatarem a floresta amazônica além do permitido por lei. Convocados pelo Palácio do Planalto para reunião ontem à tarde em Brasília, ministérios e bancos oficiais apresentaram ações preliminares, que serão discutidas e aprofundadas em reuniões técnicas quinta e sexta-feiras.

"O presidente Lula quer o mais rápido possível a implementação do decreto para o combate ao desmatamento", afirmou o secretário-executivo do Ministério Ambiente, João Paulo Capobianco. O corte do crédito público com juros subsidiados a atividades associadas à devastação da Amazônia é o ponto nevrálgico na estratégia do governo.

Em um primeiro momento, apenas os bancos públicos serão envolvidos no cerco ao financiamento de quem desmata mais que pode. Posteriormente, os bancos privados também "fecharão as torneiras", conforme sugeriu o ministro da Fazenda, Guido Mantega, após a reunião. Segundo ele, o Conselho Monetário Nacional deverá avaliar a medida.

Uma novidade será a inclusão da cadeia produtiva como um todo no aperto ao crédito. "Isso é importantíssimo, porque a partir de agora o tomador de crédito terá de provar que ele tem matéria-prima legal", diz Capobianco. Em outras palavras, isso significa que um frigorífico que opera ou compra carne na Amazônia Legal terá de provar que o seu boi não está em terras desmatadas.

Além disso, o governo estuda criar linhas de crédito específicas para financiar ações como recuperação de áreas degradadas, de reserva legal, áreas de proteção permanente (APP) e também para o desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis.

O cerco financeiro está contemplado no decreto presidencial publicado em 21 de dezembro, no qual o governo federal prevê também o recadastramento de todas as propriedades rurais localizadas em 36 municípios declarados como campeões no desmatamento da maior floresta tropical do mundo.

A "lista negra" do ambiente engloba 19 cidades no Mato Grosso, 12 no Pará, quatro em Rondônia e uma no Amazonas. A lista desagradou governadores e prefeitos, que contestaram os dados de desmatamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Segundo o órgão, 3.233 quilômetros quadrados de floresta foram derrubados entre agosto e dezembro passado, sendo que 1.922 somente entre novembro e dezembro, quando a derrubada de árvores é geralmente menor, devido ao período de chuvas.

Ontem, representantes de 19 municípios mato-grossenses anunciaram uma reunião hoje com deputados e senadores da bancada federal. Contando com o apoio da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso, o grupo pretende pressionar pela suspensão do decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Segundo o deputado federal Homero Pereira, a medida trará sérias conseqüências econômicas e sociais. "O problema é sério, pois atinge milhares de famílias dos municípios inseridos na lista. Nós, da bancada federal, precisamos estar unidos e amarrar uma solução emergencial para o problema."

O Mato Grosso é o maior produtor de soja do país e um dos maiores do mundo. O avanço do grão, juntamente com o da pecuária, são os principais vilões da Amazônia.