Título: Anatel poderia decidir caso, diz Guerreiro
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 14/01/2008, Empresas, p. B3

Nelson Perez / Valor Guerreiro, consultor e ex-presidente da Anatel: "É preciso ser explicitado o que a sociedade vai ganhar com isso" A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) teria autonomia para deliberar sobre a consolidação entre a Oi (ex-Telemar) e a Brasil Telecom (BrT), mas o peso político do negócio faz com que o mais adequado seja um decreto presidencial. Essa é a opinião de um dos formuladores dos regulamentos que nortearam as privatizações do setor de telecomunicações, Renato Navarro Guerreiro, que presidiu a agência desde sua instalação, em novembro de 1997, até 2002.

De acordo com Guerreiro, existem dois pontos a ser avaliados nesse processo. Um deles é o espírito e outro, a letra da regulamentação. "Sob o ponto de vista da letra da regulamentação, pode-se considerar que é desnecessário um decreto. A Lei Geral das Telecomunicações (LGT), no artigo 202, diz que, passados cinco anos da edição do Plano Geral de Outorgas (PGO), a agência pode autorizar a transferência do controle acionário da concessão, se entender que os objetivos do que estava previsto foram alcançados", explica.

Entretanto, Guerreiro reconhece que essa interpretação tem complexidade do ponto de vista dos valores avaliados. "A Anatel estaria tomando uma medida que seria revogar o PGO que foi editado por um presidente da República, o que poderia levantar questionamentos sobre se a agência não estaria usurpando o poder de uma autoridade superior", observa.

Por isso mesmo, na interpretação do primeiro presidente da Anatel, o problema não é a regra e sim "o espírito do regulamento". Ele lembra ainda que, desde 2002, todas as concessionárias passaram a poder atuar nas áreas umas das outras. O Plano Geral de Metas de Universalização estabelecia que as operadoras teriam esse direito ao antecipar o cumprimento das metas que estavam previstas para 2003.

As três concessionárias de telefonia local - Telefônica, Oi e BrT - atuam fora da área onde têm a concessão. Porém, fazem isso de forma discreta, no atendimento ao mercado empresarial. Nenhuma delas aventurou-se em concorrer na telefonia fixa para o segmento residencial, alegando que o investimento necessário seria elevado e não traria retorno.

Recentemente, a Oi adquiriu licenças para operar telefonia móvel de segunda e terceira gerações no Estado de São Paulo. A meta da companhia, com os celulares, é oferecer serviços de voz e banda larga em grande escala - e não apenas para assinantes empresariais. Com isso, Oi e BrT terão presença nacional, já que atuam em áreas complementares.

Guerreiro vê com naturalidade a união das duas concessionárias, mas avalia que o governo deveria impor contrapartidas. "Para a mudança ser legitimada é preciso ser explicitado o que a sociedade vai ganhar com isso. A criação de uma grande empresa nacional é uma motivação importante, mas não basta", diz.

"Fala-se em redução de tarifas. Mas é pouco diante do que empresários controladores irão auferir com o negócio. A empresa precisa assumir compromissos em contrato, com obrigações determinadas", afirma.

Nas regras da privatização das teles foram definidas contrapartidas para as operadoras. As metas de universalização dos serviços de telefonia fixa são um exemplo disso. O cumprimento das metas abria novas oportunidades, como a possibilidade de explorar outros serviços e outras áreas. O direito de atuar na telefonia móvel só foi aberto às concessionárias após o atendimento de determinadas exigências.

O ex-presidente da Anatel diz que entre os compromissos a ser fixados deveria estar o de internacionalização da companhia, e com metas pré-definidas. Segundo ele, poderia ser estabelecido que, em determinado prazo, 20% da receita deveria vir de atividades no exterior e esse percentual cresceria ao longo dos anos.

Guerreiro mostra simpatia pela consolidação entre as teles. Em sua avaliação, é interessante o Brasil ter uma grande empresa de capital nacional em setor estratégico. O apoio do BNDES ao negócio também faz sentido para o consultor. Ele frisa, porém, que "o país precisa explicitar as contrapartidas".

"É preciso olhar para o futuro dessa empresa, pensá-la para frente e também fixar regras de alienação do controle; evitar a venda para estrangeiros, evitar que tenhamos uma AmBev das telecomunicações", afirma.