Título: Garibaldi teme que CPI paralise o Legislativo
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 18/02/2008, Politica, p. A10

O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), busca saídas para evitar que o impasse em torno da composição da CPI dos cartões corporativos paralise o Legislativo. Marcou sessão do Congresso (deputados e senadores juntos) para quarta-feira, com a finalidade de começar as votar os vetos presidenciais acumulados há anos.

Garibaldi pretende propor aos líderes partidários a votação, no plenário do Senado, pelo menos da proposta da emenda constitucional (PEC) que acaba com o voto secreto do parlamentar em casos específicos. "Esse é um tema consensual, mais fácil de sustentar, porque ninguém vai obstruir um projeto tão esperado, tão ético", afirmou.

Sua preocupação é com a ameaça do PSDB e do DEM de obstruir a pauta de votações do Senado se o governo não ceder à oposição um dos postos-chave (presidente ou relator) da CPI dos cartões. O pedido de suspensão da obstrução para apreciação da PEC do voto secreto será feita aos líderes partidários amanhã.

Garibaldi convidou para o encontro o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). O deputado fará um apelo aos senadores para que haja entendimento em torno do texto que está sendo examinado na Câmara de uma PEC que altera o rito de tramitação de medidas provisórias. A idéia é que, por acordo, o texto saia da Câmara e seja aprovado rapidamente pelo Senado. Chinaglia e Garibaldi querem mudar a regra atual, que determina trancamento de pauta quando uma MP não é votada dentro de determinado prazo.

A Câmara começa essa semana enfrentando esse problema. A MP que cria a TV Pública está trancando a pauta e a oposição na Casa, que discorda da criação da empresa, está decidida a fazer obstrução. O governo tem maioria folgada na Câmara e deve aprovar a MP. Mas a oposição tem condições de dificultar os trabalhos, lançando mão de procedimentos regimentais de obstrução.

Se a obstrução na Câmara é por uma questão de mérito da proposta em discussão, no Senado o comportamento da oposição tem outra motivação. PSDB e DEM reivindicam presidência ou relatoria da CPI dos cartões corporativos, cujo requerimento foi protocolado na noite de quinta-feira.

Enquanto o PT da Câmara e o PMDB do Senado não abrem mão do controle da investigação, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), é favorável a uma negociação. Na quinta-feira, ele se reuniu com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com o ministro José Múcio (Relações Institucionais) e insistiu na necessidade de ceder uma das vagas à oposição, sob pena de paralisação dos trabalhos legislativos.

Acirrando as relações no Congresso, o PT da Câmara indicou Luiz Sérgio (RJ) para relator e o PMDB do Senado, Neuto de Conto (SC) para presidente. No caso do PMDB, o gesto é interpretado como forma de pressão para que o governo nomeie logo os indicados do partido para o setor elétrico.

Jucá defendia que os integrantes da CPI fossem indicados ao longo desta semana e só depois se desse a negociação por presidente e relator. Até lá, a previsão é que a questão dos cargos no setor elétrico esteja equacionada - abrindo caminho para o PMDB ceder a vaga de presidente da CPI para a oposição.

A Lula e Múcio, Jucá argumentou que o governo terá maioria numérica dos integrantes da CPI, tanto da Câmara quanto do Senado. Portanto, terá votos para evitar aprovação de requerimentos de convocação de testemunhas e de quebra de sigilos. Seria um gesto de boa vontade negociar com a oposição um dos cargos do comando da CPI.

Além de impedir votações, PSDB e DEM do Senado ameaçam boicotar essa CPI mista, caso o governo ocupe a presidência e a relatoria. Nesse cenário, o líder do DEM, José Agripino (RN), defende que a oposição parta para uma CPI exclusiva do Senado - na qual teria o direito de ocupar uma das funções, por causa da proporcionalidade das bancadas.

O assunto já foi discutido com Jucá - que não descartou a solução. Os tucanos estão mais cautelosos. Em reunião no gabinete do presidente da sigla, senador Sérgio Guerra (PE), decidiram lutar pela presidência ou relatoria da CPI, mas, se não for possível, a idéia é participar da comissão atentos a quaisquer movimentos de blindagem do governo. No primeiro, a oposição abandonaria os trabalhos e partiria para a CPI do Senado.

O governo pode esbarrar em outras dificuldades no Senado. Amanhã, os integrantes da CPI que apura repasse de recursos para Organizações Não-Governamentais (ONGs) se reúnem para tentar um acordo que resulte na votação dos cerca de 70 requerimentos engavetados, de convocação de depoimentos ou de quebra de sigilos.

Esses requerimentos não são votados porque a base governista, que é majoritária, não permite. Agora, a oposição alega que a CPI recebeu denúncias graves e ameaça vazar para a imprensa esses documentos, caso o governo continue dificultando a investigação.

Pelo menos na quarta-feira deve haver a votação dos vetos. Mas há divergências de mérito.

A oposição - com apoio de senadores das regiões Norte e Nordeste - insiste em votar os vetos referentes às leis de criação da Sudam e da Sudene. Há uma mobilização para que esses vetos sejam derrubados, porque os congressistas consideram que os vetos retiraram a autonomia financeira dos órgãos.

Mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pediu na quinta-feira a Garibaldi que não inclua esses vetos na pauta de quarta-feira, assim como o da chamada Emenda 3 - dispositivo da lei que criou a Super Receita, que retirava dos auditores fiscais o poder de fiscalizar contratos de trabalho entre empresa e Pessoa Jurídica de um só profissional.

Setores da oposição e da base governista querem derrubar esse veto, porque o governo prometeu regulamentar a questão das relações de trabalho envolvendo PJ e não cumpriu. Promessa semelhante ocorreu no caso dos vetos da Sudam e da Sudene e até hoje não foi concretizada.

Mantega pediu a Garibaldi que deixe a votação dos vetos relativos a esses três assuntos - Sudam, Sudene e Emenda 3 - para depois que o governo enviar ao Congresso a proposta de reforma tributária, o que deve ocorrer nos próximos dias. O ministro alegou estar muito envolvido na elaboração do projeto.

Mais de 800 dispositivos de projetos de lei aprovados pelo Congresso foram vetados pelos últimos presidentes - o mais antigo é do governo Itamar Franco.