Título: Para analistas, cenário não valida previsões sombrias
Autor: Barros, Carlos Mendonça de ; Miguel, Paulo Pereira
Fonte: Valor Econômico, 14/01/2008, Finanças, p. C10

Davilym Dourado / Valor Roberto Padovani, economista do Banco WestLB, não vê necessidade de aumento da taxa Selic este ano O Banco Central deverá mexer o menos possível na política monetária ao longo deste primeiro trimestre do ano na esperança de que os indicadores de inflação e atividade, além do ambiente externo, fiquem mais claros e permitam uma visão de mais longo alcance. Será importante, na visão de economistas de bancos, instituições e consultorias ouvidos pelo Valor na sexta-feira, que a volatilidade movida a incertezas dos mercados não contamine as decisões de política monetária e os textos legais, como os comunicados emitidos após as reuniões do Copom, as atas e o Relatório Trimestral de Inflação. Enquanto coordenador das expectativas inflacionárias do mercado, o BC não pode, sem ter alguma certeza sobre a rota da inflação, agir como incendiário.

O economista-chefe do Banco WestLB, Roberto Padovani, acredita que o BC não terá nenhuma pressa em tomar uma decisão. Por vários fatores. Ele precisa saber, em primeiro lugar, se as pressões inflacionárias são localizadas e temporárias, como crê Padovani, ou se ameaçam generalizar-se, assumindo um caráter permanente. Ficará de olho, em segundo lugar, nas expectativas de inflação fornecidas pelo Boletim Focus. No entender de Padovani, como o IPCA do primeiro trimestre tende a manter um comportamento mais sossegado, após o repique de dezembro, não há clima para a projeção de IPCA para o ano ou os próximos 12 meses deteriorar-se de forma progressiva, subindo dos atuais 4,3% para 4,4% e depois para 4,5%, rompendo, então, a meta. Um Focus apontando para 4,7% talvez já fosse suficiente para o Copom iniciar um ciclo de alta da Selic. Mas, na visão de Padovani, não é o que deve acontecer. "O BC está operando com um horizonte de médio prazo. E o que enxerga é uma importante ampliação do PIB potencial. Os investimentos crescem, a produção de bens de capital bate recorde e a produtividade da economia se expande", diz o economista. Padovani diz que, se ele estiver errado e o BC tiver de subir o juro, não será necessário nenhum choque de 3 a 4 pontos percentuais de alta na Selic. A política monetária está hoje muito mais potente e eficaz e o BC não precisa atuar pesadamente porque não se trata mais, como em 2004, de desinflacionar a economia. Agora é só uma questão de controlar a taxa para que não saia da meta. "Os movimentos do BC podem ser muito mais suaves, sem perda de eficácia", diz Padovani.

A economista do ABN AMRO Real Zeina Latif diz que o cenário não está suficientemente claro a ponto de autorizar uma tomada imediata de posição pelo BC. Embora o choque agrícola já possa ser caracterizado como de demanda e não de oferta, ainda não estão perfeitamente nítidos fatores fundamentais como o dinamismo da demanda e os efeitos sobre o câmbio do cenário externo turbulento. É por isso que o BC não tende a se precipitar.

O economista Francisco Pessoa, da LCA Consultores, não vê ameaças inflacionárias decorrentes da demanda aquecida, dos alimentos ou da disseminação de ambos para os outros setores. "A expansão dos investimentos é muito forte, as importações estão crescendo e já se vê deflação em itens como feijão", diz Pessoa. O importante é que a demanda, embora forte, não está se acelerando. Ela tende a se acomodar, mesmo porque a base de comparação é elevada.

Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, lembra que será importante acompanhar o tom da revisão que o BC irá fazer no cenário para a inflação do primeiro trimestre. Isso deve ser feito na próxima ata do Copom. O cenário oficial hoje disponível ainda foi traçado antes do choque agrícola. Mas as pressões inflacionárias não devem ser agora tão intensas quanto foram no ano passado, até porque refletiam a conjunção de diversos choques difíceis de se reproduzir novamente. Mesmo assim, todos os componentes do IPCA têm uma tendência altista, o que é claramente percebido na evolução do núcleo sem preços monitorados e alimentação. Se o IPCA cravar a meta de 4,5%, o que o BC deve fazer? "Não podemos esquecer que ele trabalha com a meta dentro de um intervalo. Ficar em cima da meta ou um pouco acima não necessariamente justificaria um aumento de juros", diz Sérgio Vale. A alta se justificaria se a inflação estivesse em aceleração, estimulada por uma demanda mais forte. Não é o que as previsões de PIB do Focus indicam. A taxa de crescimento deve recuar de 5,3% no ano passado para 4,5% em 2008. Como a perspectiva é de desaceleração do crescimento não só para este ano como para 2009, "é provável que os gargalos entre oferta e demanda tendam a diminuir um pouco ao longo dos próximos trimestres", diz Vale. Tudo indica que uma Selic estabilizada em 11,25% dará conta do serviço.

É o que também aponta o cenário básico traçado pelos economistas da Austin Rating. Nele, segundo o economista-chefe Alex Agostini, a inflação já parte da meta de 4,5%, podendo chegar a 4,7%, mas sem exigir um aperto monetário. "Nesse cenário mais provável, o BC tem pouca margem para mexer nos juros para baixo, mas como a inflação fica perto da meta, nossa aposta é que o Copom poderá retomar os cortes a partir de setembro, com uma baixa de 0,25 ponto., pois já estará de olho na meta de 2009", observa Agostini.

Na avaliação do economista-chefe da CMA Análises Luiz Rogê Ferreira, existe hoje uma probabilidade entre 60% a 70% de o BC elevar os juros em algum momento ao longo de 2008. "A inflação, após o choque dos preços agrícolas, que devem permanecer pressionados ao longo do ano, também tem sofrido a pressão da demanda interna por bens e serviços", diz Rogê Ferreira. Ainda contribui para o crescimento da demanda interna, principalmente via consumo, o efeito retardado do processo de queda da taxa Selic ao longo dos dois últimos anos.