Título: Investimento cresce e aponta queda no nível de uso da capacidade produtiva
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 15/01/2008, Brasil, p. A4

investimento na construção civil e em máquinas e equipamentos tem crescido com força desde 2006, mas não a ponto de impedir o aumento do nível de utilização de capacidade instalada (Nuci) da indústria. Num cenário em que a demanda avança a passos rápidos e a inflação dá alguns sinais de alta, ganha importância a tentativa de mensurar qual é o prazo de maturação dos investimentos, ainda que se trate de uma tarefa bastante complexa. Para a MB Associados, as inversões das empresas levam cerca de 18 meses para maturar totalmente e começar a impactar o nível de capacidade instalada. A LCA Consultores, por sua vez, acredita que esse prazo é um pouco menor, na casa de 10 a 14 meses.

Essa diferença explica por que a MB projeta queda do nível de utilização da indústria para a segunda metade deste ano, enquanto a LCA acredita que o recuo pode ocorrer já no segundo trimestre. O Banco Central (BC) tem manifestado preocupação com a evolução do indicador, lembrando que elevações da capacidade instalada coincidiram anteriormente com aceleração inflacionária. Um recuo nos níveis de ocupação seria importante para afastar o risco de que a autoridade monetária inicie um ciclo de alta da Selic.

Os economistas da MB e da LCA alertam que essas estimativas não são precisas e podem variar muito de setor a setor. O economista-chefe da MB, Sérgio Vale, lembra que "essa relação pode ser bastante variável, e depende da sustentabilidade do crescimento da economia".

Com isso, se a expansão da atividade econômica for menos estável e tiver perspectiva positiva para os próximos anos, o prazo estimado para a maturação de investimentos tende a diminuir. "Assim, pode ser que, com o tempo, esses 18 meses de impacto comece a cair", afirma Vale. "De qualquer modo, isso também serve de alerta para os perigos de considerar os investimentos como descompressores imediatos de pressões inflacionárias", adverte Vale.

Ele estima que o investimento cresceu 13,3% em 2007, um ritmo forte, e que seu deu em cima da expansão robusta registrada em 2006, de 10%. É um avanço inegavelmente firme, mas que não impediu a elevação do nível de utilização da indústria, que subiu de 80,4%, em dezembro de 2005, para o nível recorde de 82,8% em outubro de 2007, na série livre de influências sazonais.

Se a formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o que se investe na construção civil e em máquinas e equipamentos) cresceu com força em 2006 e 2007, por que não foi suficiente para manter a capacidade instalada estável? A primeira e mais óbvia resposta é que nem todos esses investimentos maturaram. Não houve tempo ainda para que a compra de uma máquina, por exemplo, se traduza em expansão da capacidade produtiva.

O economista Bráulio Borges, da LCA, diz ainda que o investimento na virada de 2005 para 2006 era mais fraco do que atualmente. Naquele momento, andava na casa de 5%, e hoje avança a um ritmo próximo de 15%, diz ele, que também projeta alta de 13,3% da FBCF em 2007.

Borges lembra que a produção industrial tem crescido a um ritmo superior ao imaginado pelos analistas no começo de 2006. Em vez de um avanço de 4,5%, como era previsto, a indústria, tudo indica, encerrou 2007 com alta de 6%. De janeiro a novembro, a produção de bens de capital cresceu 19,5% em relação ao mesmo período de 2006, enquanto a de bens duráveis aumentou 9%.

Vale diz que os investimentos ficaram por muito tempo concentrados em setores produtores de commodities, começando a se disseminar por outros segmentos da economia principalmente a partir do fim do primeiro semestre do ano passado. Por esse raciocínio, há vários setores em que as inversões no aumento da capacidade produtiva ocorreram há pouco tempo. Devem maturar ao longo dos próximos meses.

Para 2008, a perspectiva é que o investimento siga em alta expressiva, o que é favorável para a ampliação da capacidade produtiva da economia. Borges prevê uma alta de 13,4% da FBCF neste ano, enquanto Vale vê um número um pouco menos significativo, de 9,9%.

Os dois economistas acreditam que nos próximos meses o nível de utilização de capacidade instalada vai ceder. Vale é um pouco mais cauteloso, e só vê isso ocorrendo no segundo semestre. Isso ajuda a explicar as visões diferentes que os dois têm para a trajetória da Selic. Borges acredita que o BC ainda cortará a taxa neste ano, no segundo semestre, levando a taxa a fechar 2008 em 10,75% ao ano. Vale, por sua vez, vê a Selic estável o ano inteiro, encerrando dezembro em 11,25%.

Para Borges, uma alta dos juros seria inoportuna para o processo de expansão do investimento. A elevação da Selic tenderia a afetar mais a FBCF do que o consumo das famílias, o que teria um efeito negativo sobre a ampliação da capacidade produtiva do país, avalia. A sua previsão de uma alta do investimento de 13,4% para 2008 pressupõe um corte da Selic, e não uma alta.

Se a utilização de capacidade reagir como ele espera, caindo no segundo trimestre, a possibilidade de um aumento dos juros diminuirá consideravelmente, e uma queda da Selic poderá voltar a ser cogitada com mais força no mercado. O problema é que, como os economistas admitem, há muitas incertezas nas projeções sobre o prazo de maturação dos investimentos.

Uma notícia positiva é que os preços industriais no atacado se mantêm relativamente comportados. O economista Caio Prates, do grupo de conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), nota que em 2004, quando houve uma alta forte do Nuci e o BC começou um ciclo de elevação da Selic, o Índice de Preços no Atacado (IPA) industrial teve alta de 19,5%. Em 2007, o aumento foi bem mais modesto, de 4,42%. Vale diz, porém, que os preços industriais no atacado mostram aceleração recente- em dezembro, aumentaram 1,01% no IGP-DI, um número bem mais forte que o 0,41% de novembro.

Como se vê, há muitas dúvidas quanto ao comportamento da capacidade instalada da indústria. Aumentos do nível de utilização não necessariamente implicam pressões inflacionárias preocupantes, como diz Prates. Mas, com o risco de o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) superar o centro da meta definido para este ano, de 4,5%, o indicador vai ser cada vez mais monitorado com lupa pelos economistas.