Título: UE insiste em lista com 300 fazendas
Autor: Zanatta, Mauro; Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 15/02/2008, Agronegócios, p. B14

Autoridades sanitárias da União Européia (UE) voltaram a exigir na quinta-feira a redução da lista de fazendas brasileiras aptas a exportar carne bovina para o bloco comercial. Em reunião com o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Inácio Kroetz, os europeus ratificaram a posição de restringir as compras a somente 300 propriedades. Kroetz havia levado uma lista de 520 fazendas.

Os europeus voltaram a insistir que o número está baseado na avaliação do próprio ministério brasileiro, transmitida numa reunião ocorrida em Cuiabá (MT), em novembro do ano passado. Na ocasião, os brasileiros afirmaram que o ministério teria capacidade para auditar 3% das fazendas incluídas na base de dados do sistema de rastreamento de bovinos (Sisbov), então com cerca de 10 mil propriedades. Daí, a restrição a 300 fazendas.

As negociações de ontem, previstas para continuar hoje em Bruxelas, também foram contaminadas pela declaração do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, que afirmou, em audiência pública no Senado, na última quarta-feira, que os frigoríficos brasileiros venderam ao bloco carne de bois não-rastreados. O clima da reunião foi tenso e marcado pela desconfiança dos europeus em relação à consistência da lista proposta pelas autoridades brasileiras.

A revisão da lista preliminar de 2.681 fazendas apresentadas pelo Brasil no fim de janeiro deixou algumas lacunas, na opinião dos europeus. Algumas fazendas tiveram o total do rebanho alterado, o que teria gerado mais suspeitas de manipulação dos dados. A revisão reduziu a lista a 683 fazendas, mas os seis Estados habilitados a exportar para a UE enviaram uma relação ainda maior, de 1.058 propriedades, ao ministério nesta semana. A confusão de números e a profusão de interlocutores também reforçaram as suspeitas dos europeus sobre a consistência dos dados brasileiros.

No encontro de quinta-feira, os europeus voltaram a abordar a necessidade de apresentação de todos os documentos comprobatórios sobre as condições sanitárias das propriedades e as garantias de rastreamento dos bois, informou uma fonte graduada da UE. "O que o ministro disse ontem [quarta] nós já sabíamos. Tanto que rejeitamos a lista com 2.681 fazendas. Queremos, agora, um compromisso do governo brasileiro de que as fazendas escolhidas estarão aptas para a exportação", afirmou a fonte.

Com a rejeição da lista proposta pelo secretário Kroetz, as discussões na Comissão Européia passaram a girar em torno da missão técnica da UE que deve chegar ao Brasil no próximo dia 25. A missão técnica quer inspecionar uma amostragem das propriedades brasileiras entre as 300 escolhidas pelo bloco europeu. Estima-se que sejam sorteadas entre 40 e 50 fazendas para um "pente-fino" dos auditores europeus. Fontes da embaixada brasileira em Bruxelas afirmaram que a recusa dos europeus em discutir a lista com mais de 300 fazendas restringiu os debates iniciados ontem. "A reunião ficou centrada sobre a evolução da implementação da rastreabilidade no Brasil. A lista era apenas um dos vários assuntos da pauta", minimizou a fonte.

Diante do impasse nas negociações, o pessimismo voltou a contaminar dirigentes do governo brasileiro. Chegou-se até a cogitar, em alguns gabinetes, que nem mesmo as 300 fazendas poderiam ser incluídas na lista da UE. Mesmo após a visita da missão veterinário ao Brasil.

Se na Europa algumas fontes tentaram minimizar as declarações do ministro Reinhold Stephanes, fontes das indústrias entendem que estão "cada vez mais distantes" as discussões sobre uma solução "menos traumática e mais rápida" para o fim da suspensão das compras pela UE. Essas mesmas fontes acusam o governo de não "ser preciso" no encaminhamento dessas discussões. Dirigentes da indústria avaliam que o governo "está perdido" e que "não sabe o quer" da UE. Assim, a posição negociadora do Brasil estaria irremediavelmente comprometida, segundo essa análise.