Título: Lucro precioso
Autor: Monteiro, Luciana; Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 15/02/2008, Investimentos, p. D1

A queda do dólar no mercado internacional em meio ao receio de uma recessão nos Estados Unidos deu impulso às cotações do ouro. Do início de 2007 para cá, o ouro subiu 42,59% em dólar no exterior. Já no Brasil, a alta foi menor - 14,94% em reais até ontem - uma vez que a moeda brasileira também se valorizou em relação à americana e a commodity é cotada sempre em dólar, que caiu 18,0,6%. Mesmo menor em reais, o ouro subiu mais que os 13,22% do CDI no período, perdendo apenas para o Ibovespa, que acumula alta de 39%.

A explicação é a busca por proteção diante do risco de uma crise mundial. Em janeiro, com a piora do cenário externo, o metal subiu 8,06% no Brasil. Já em fevereiro, com a melhora das perspectivas externas, o grama caiu 4,4%, acumulando no ano alta de 3,31%. Lá fora, a alta em 2008 é de 8,12%.

Além do peso da valorização do real, a aplicação em ouro é complicada para pessoas físicas. É preciso pagar para manter o metal guardado no banco ou, para quem quer levar sua barrinha para casa por sua conta e risco, será preciso entregá-la a uma fundidora autorizada para derretê-la e comprovar sua pureza na hora de revender. Jóias perdem logo na saída, porque paga-se também pelo trabalho do ourives. Além disso, a continuidade de sua valorização no curto e médio prazos vai depender da piora das economias americana e mundial.

O ouro deve continuar em alta no médio prazo, acompanhando a desvalorização do dólar e a queda dos juros nos EUA, afirma Lance Reinhardt, representante no Brasil da gestora de recursos suíça Superfund. As carteiras da gestora no exterior têm fortes posições em ouro. "Temos uma expectativa de que os juros americanos continuarão caindo para evitar a recessão e, com isso, a inflação deve subir e o dólar, perder valor", explica. "Os investidores vão, então, procurar alternativas de proteção, o que poderá levar o ouro a US$ 1.100, US$ 1.200 a onça-troy (31,1 gramas) nos próximos 12 meses", avalia Reinhardt. Grandes fundos soberanos de países como China e Cingapura podem ajudar nessa valorização, trocando parte de seus ativos em dólar por ouro. Uma alta para US$ 1.200 significaria um ganho de 32% para o metal em relação ao fechamento de ontem, a US$ 908 a onça-troy.

Com o dólar mais fraco, o ouro vem atraindo muitos investidores em busca de uma reserva de valor, diz Bolívar Godinho, professor do Laboratório de Finanças da FIA. Na avaliação dele, a aplicação em ouro tornou-se muito arriscada, já que a cotação está em níveis historicamente altos. Godinho chama a atenção ainda para os custos de custódia.

O investidor interessando em aplicar no metal pode comprar contratos de ouro na Bolsa de Mercadorias Futuros (BM&F). Para isso, deve procurar uma corretora de valores, que irá intermediar a operação. Assim, ele terá de pagar corretagem, além dos emolumentos (custo cobrado pela bolsa). Cada contrato de ouro equivale a 250 gramas, o que representava ontem R$ 12.500, com o grama cotado a R$ 50. Há também contratos fracionários de 10 gramas e de 0,225 grama, mas que praticamente não têm liquidez na BM&F. "Quem compra o ouro fica com um certificado e, portanto, tem de pagar uma taxa de custódia para guardá-lo", lembra Godinho.

O ouro tende a ir bem em momentos de aversão a risco maior, queda nos juros e inflação mais alta, como proteção de capital, afirma Gustavo Schwartzmann analista de fundos da Hedging-Griffo. "Vemos o ouro mais como uma moeda, que varia de acordo com os juros e o risco, do que como uma commodity", diz.

Schwartzmann observa que o ouro já subiu bastante pela queda dos juros americanos e pelo receio de uma recessão mundial. "Há, portanto, o risco não desprezível de uma realização de lucros ou de uma queda das commodities metálicas, e o ouro poderia ir junto", diz. Ele lembra que o ouro não tem fluxo de caixa, ou seja, não paga juros como um título de renda fixa ou uma ação. "É o custo de oportunidade, você aplica em um título em reais e pode ganhar 11,25% ou até mais que isso", afirma. Mas se a crise americana se aprofundar muito, o juro nos EUA, hoje em 3% ao ano, cair a 1% ao ano e os preços das commodities metálicas não despencarem, o ouro ganhará suporte. "Fora isso, há a demanda secular por jóias, que está aumentando nos países emergentes, especialmente na Ásia, por conta do crescimento da região, e que pode ajudar o metal", diz. Mas Schwartzmann hoje prefere outras aplicações, como ações brasileiras de segunda linha que caíram bastante. "Nesse nível de preço, o ouro só vale a pena como proteção."