Título: Aplicação na planta
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2008, EU & Investimentos, p. D1

Um passo importante para o desenvolvimentos dos fundos de investimento imobiliários (FII) foi dado ontem. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicou edital de audiência pública para reformular as regras dessas aplicações com um texto que indica maior flexibilização de regras e possibilidade de expansão do setor. Quando as mudanças forem colocadas em prática, o mercado espera desengavetar algumas ofertas de fundos imobiliários para aplicadores de varejo, a partir de R$ 1 mil.

Nos últimos anos, a rentabilidade desses fundos saltou aos olhos em meio à queda do lucro da renda fixa tradicional após os cortes na Selic. A Receita Federal também ajudou, tornando isento o ganho da pessoa física nessas carteiras. Com isso, cresceu a liquidez das cotas já existentes no mercado, mas as ofertas novas para o público em geral são escassas. No ano passado, por exemplo, de quase R$ 1 bilhão lançado, a grande maioria foi de distribuições dirigidas a poucos investidores qualificados. Hoje, os FII ativos acumulam patrimônio de cerca de R$ 3 bilhões. Mas os principais sucessos do setor, como o fundo Pátio Higienópolis, o Europar, o Hospital da Criança e o Almirante Barroso têm mais de três anos.

O objetivo do governo é levar a tradição de investimento em imóveis do brasileiro para esse mercado mais sofisticado e protegido, explica o superintendente de Registros da CVM , Carlos Alberto Rebello. Por isso a Receita teria também concedido a isenção de IR.

As mudanças eram esperadas pelo mercado desde 2001, quando muitas das novidades que agora constam da audiência foram sugeridas à CVM. Outros avanços vieram de adaptações de normas já em vigor para os demais fundos, como o limite de concentração em títulos de crédito - em vias de serem permitidos nos FII. A nova regulamentação, que tem por objetivo substituir a atual Instrução 205 de fundos imobiliários, poderá receber sugestões até o dia 15.

Pelo edital de ontem, a CVM estaria disposta a permitir que fundos imobiliários invistam não apenas em bens prontos ou em construção, mas também em papéis com lastro no setor, como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), fundos de direitos creditórios (Fdics), créditos hipotecários e até ações de incorporadoras. A proposta também é distinguir os fundos em subcategorias pela classes de ativos em que investem, com ou sem recebíveis. "Essas novidades deverão ajudar a expandir o volume de ofertas de fundos e a trazer novos gestores para esse mercado", diz o advogado Carlos Eduardo Ferrari, que estrutura fundos pelo escritório Navarro Advogados.

No entanto, alguns impedimentos para a evolução e popularização dos FII vão além das questões regulatórias. Primeiramente, o apetite dos investidores estrangeiros tem sido voraz, deixando poucas migalhas para serem repartidas em fundos para pequenos aplicadores. Outro medo é de que as regras sejam tão paternalistas com os pequenos aplicadores que acabem inviabilizando ofertas públicas de cotas, algo similar com o que ocorreu com o CRI destinado ao varejo. De acordo com a sugestão para os FII, assim como no CRI, no máximo 20% do patrimônio do fundo podem estar atrelados a um único devedor em distribuições para pequenos aplicadores. Isso pode dificultar as ofertas.

Embora haja reservas, a animação de quem atua no setor de FII é evidente. "Não tenho dúvidas de que teremos muito mais ofertas neste e no próximo anos", diz Luiz Eugenio Junqueira Figueiredo, diretor da Rio Bravo. Instituições nacionais e estrangeiras com cotas de fundos exclusivos existentes poderão fazer ofertas secundárias no mercado, para mais aplicadores.

A nova regra proposta pela CVM facilita o aumento de capital dos fundos já existentes. Hoje, gestores como Hedging-Griffo têm de formar novos fundos sempre que fazem uma outra rodada de captações. Com a norma proposta, poderá ser mais fácil e eficiente elevar o patrimônio dos já existentes - o que colaboraria com a liquidez das cotas desses fundos no mercado secundário, sem diluir negócios entre muitas carteiras. No entanto, aperfeiçoamentos nas propostas ainda deverão apontar mais claramente se esse caminho será viável.

A norma em discussão também prevê que fundos que não tenham sucesso em captar o total previsto em suas emissões possam ir a mercado com um valor menor. Por enquanto, se um fundo de R$ 100 milhões, por exemplo, capta apenas R$ 90 milhões, o administrador é obrigado a devolver o valor aos cotistas, explica Rebello, da CVM. Além disso, a audiência sugere também que, logo no início da captação da aplicação, já seja criado o fundo com CNPJ específico, para proteger o investidor de problemas de solvência da entidade administradora. Atualmente, o fundo só é formado quando se integralizam as cotas.

A autarquia também colocou em debate a possibilidade de criação de fundos de investimento em cotas de outras carteiras imobiliárias. Agentes do setor acreditam que haveria bancos e gestores com pouca familiaridade com o ramo imobiliário interessados em lançar fundos que escolheriam as carteiras. Além disso, o fundo de fundos poderia oferecer ao aplicador uma diversificação mais eficiente de risco. Está em debate, ainda, a permissão de alavancagem nos FII.

Na audiência dos FII, a CVM também espera receber sugestões quanto à manifestação à distância dos cotistas em assembléias gerais, permitindo o voto eletrônico, por internet ou e-mail, por exemplo. "A idéia é fazer desses fundos um embrião para avaliar mudanças possíveis na representação de acionistas em assembléias de empresas", diz Rebello. A possibilidade de voto à distância, existente nos EUA, já foi levantada por associações de acionistas e de relações com investidores no Brasil, mas esbarra em regulação tanto da CVM quanto da própria Lei das S/A. Os FII seriam uma experiência viável para avaliar opiniões do mercado sobre isso e, se aprovado, os resultados práticos.

A norma final é esperada ainda para este semestre. O texto está disponível no site www.cvm.gov.br . (Colaborou Fernando Torres, do Valor Online)