Título: Ministro bombardeia frigoríficos
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2008, Agronegócios, p. B13

Davilym Dourado/valor Stephanes: "Tenho certeza de que [os frigoríficos] exportaram bois para a União Européia rastreados e não-rastreados" Em meio às complicadas negociações para retomar as vendas de carne bovina brasileira à União Européia, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, declarou ontem, em audiência pública no Senado, que frigoríficos brasileiros vinham driblando as exigências do bloco ao embarcar produto derivado de gado sem registro no sistema de rastreamento mantido pelo governo (Sisbov).

"Tenho certeza de que [os frigoríficos] exportaram bois para a União Européia rastreados e não-rastreados", revelou. E foi além, ao questionar a situação das empresas certificadoras credenciadas pelo próprio ministério: "É um escândalo. Nunca auditaram as certificadoras. Eram 71 e são agora 50. Mas muitas ainda serão eliminadas [do Sisbov]", disse.

Na mesma mesa, a representante da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Leslie Cohen, limitou-se a afirmar que "não estamos felizes porque todos fomos prejudicados", em referência à decisão da UE de suspender, no início deste mês, a compra de carne brasileira. Também presente à audiência, o presidente da associação das certificadoras (Acerta), Vantuil Carneiro Sobrinho, não se pronunciou sobre as afirmações do ministro.

As declarações de Stephanes surpreenderam os parlamentares. "Essas declarações são gravíssimas e colocam em xeque o sistema de rastreamento", avaliou a senador Kátia Abreu (DEM-TO). "A Abiec nunca ergueu um dedo para ajudar o Sisbov, mas o ministério defende os frigoríficos, que são os maiores beneficiados e estão felizes porque vão vender a pouca carne a preço de ouro".

Não foi a primeira vez que Reinhold Stephanes criticou os exportadores de carne. Em abril de 2007, recém-nomeado ao cargo, o ministro acusou, na Câmara dos Deputados, a Abiec de manter "um cartel e um monopólio" nas vendas de carne à UE.

Em defesa de sua gestão, Stephanes afirmou ter ficado surpreso com a "radicalização" da UE de restringir as compras a uma lista prévia de fazendas aprovadas pelo Sisbov. O ministro reafirmou tratar-se de um tema "especificamente de ordem comercial", sem conotação sanitária. O Sisbov, disse, "não atinge objetivo de saber se carne tem sanidade ou não tem".

Em seguida, Stephanes voltou a dirigir-se aos frigoríficos, apelando para que "assumam posição de liderança quanto a essa questão, apoiando os produtores que vendem carne rastreada". O ministro voltou a reclamar das indústrias. "Se os frigoríficos não liderarem o processo de rastreabilidade, ele não acontece. É preciso fidelizar clientes, ou seja, fornecedores e pagar um adicional. É exagerado, mas é possível cumprir", afirmou.

O clima da audiência ficou mais tenso quando a representante da Abiec tentou rebater o ministro ao considerar "irrelevante" a discussão sobre diferencial de preços para o gado rastreado: "Os frigoríficos pagam, mas sempre será considerado insuficiente", disse Leslie Cohen. Isso provocou um bate-boca com três senadores. E sobraram acusações ao chefe de Leslie, o ex-ministro Pratini de Moraes.

"O Pratini não veio [ao debate] porque está feliz. Ele é o grande responsável por ter assinado o acordo com a União Européia, junto com Luiz Carlos Oliveira [ex-secretário de Defesa Agropecuária e atual diretor de Assuntos Sanitários] que, infelizmente, ainda está no nosso ministério", atacou a senadora Kátia Abreu.