Título: Previdência em ebulição
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2008, Investimentos, p. D1

A turbulência de janeiro não poupou os planos de previdência com renda variável. Diversos fundos de grandes seguradoras do mercado apresentaram prejuízos no primeiro mês do ano. Apesar da limitação de se aplicar até 49% do patrimônio das carteiras em renda variável, as perdas chegaram a mais de 5% no mês, segundo dados do site Fortuna. O Índice Bovespa (Ibovespa) caiu, no mesmo período, 6,88%. No entanto, conhecedores de que aplicar em um PGBL ou um VGBL é investir tendo em vista o longo prazo e fazer vistas grossas para a oscilação, os participantes continuam a aplicar com mais intensidade nos planos agressivos.

No total, a captação da previdência privada apresentou queda em relação ao mês de dezembro - quando sazonalmente se concentram, em média, 20% dos depósitos no ano - e também em comparação com janeiro do ano passado. No entanto, o impacto maior foi verificado nos planos puros de renda fixa, que tiveram até mais resgates (ou transferências) do que depósitos em janeiro. Dos planos de renda fixa, saíram R$ 716 milhões em janeiro, enquanto nos planos com ações - balanceados e multimercados - ingressou R$ 1,298 bilhão. No saldo total, foram depositados R$ 581 milhões nos planos em janeiro.

Mas ainda que a captação dos planos com ações tenha se acelerado em janeiro, o volume total do setor de previdência privada apresentou queda em janeiro sobre o mesmo mês do ano passado. Os R$ 581 milhões captados por fundos de investimento em cotas de planos PGBL e VGBL ficaram 28% abaixo dos R$ 808 milhões de janeiro de 2007. A queda foi motivada principalmente pelo recuo das aplicações e aumento dos resgates na Bradesco Vida e Previdência, maior seguradora do setor. Procurada, a Bradesco não se manifestou ontem sobre a queda na captação.

Mesmo com a conjuntura menos favorável às ações, a tendência de migração para ativos com mais risco se mantém, diz Marcelo D'Agosto, diretor do site Fortuna. De acordo com dados da consultoria, foi exatamente em agosto do ano passado, quando foi deflagrada a crise do setor imobiliário americano, que os planos com ações passaram a ter captação muito maior do que os de renda fixa, que, em alguns meses, tiveram mais saques que aportes.

A bolsa é mais recomendável para o longo prazo, por isso é natural que quem aplica mais em previdência seja menos sensível à volatilidade, explica Osvaldo do Nascimento, presidente da Itaú Vida e Previdência. "Essa volatilidade fará cada vez mais com que o investidor avalie melhor seu apetite de risco e horizonte, ele fica mais consciente."

Mesmo com esse fluxo intenso de recursos para os planos com renda variável, Edson Franco, diretor-presidente da Real Tokio Marine Vida e Previdência, diz que ainda é pequeno o volume da previdência aberta efetivamente aplicado na bolsa. No mercado, há uma proporção de cerca de 80% do patrimônio total investido em planos exclusivamente de renda fixa. Dos 20% que permitem aplicar em renda variável, há o limite legal de 49% do patrimônio do fundo em ações a ser respeitado. O que faz com que apenas cerca de 10% do patrimônio total de R$ 130 bilhões nesses planos esteja em ações. Os participantes ainda estão, portanto, pouco expostos a riscos, diz. "Estamos vivendo um momento em que eles estão revendo suas estratégias e montando posições de renda variável."

Também é fato que os participantes não se assustaram tanto com os momentos de crise e volatilidade das ações, diz Franco, da Real Tokio Marine. "O aplicador olha mais para o longo prazo mesmo, diferentemente do investidor de fundo de curto prazo."

Mariano Mesquita Cirello, superintendente de investimento da Mapfre DTVM, diz que o investidor de longo prazo é mais paciente com o resultado das ações. Ele comenta que, entre os planos da Mapfre Seguros com renda variável, foram aqueles mais agressivos os que mais captaram nos últimos meses. Ele explica que, pelo limite de 49% a ser respeitado na gestão desses recursos, o impacto da turbulência no curto prazo é menor. "Os fundos de investimento sofrem mais", diz.

Em termos de rentabilidade, em média, os multimercado tiveram prejuízo de 2,86% em janeiro, segundo o Fortuna, e os balanceados, de 1,18%. Já os planos de renda fixa ganharam 0,96%. Em 12 meses, os planos de renda fixa rendem 11,28%, enquanto os balanceados avançam 13,56% e os multimercados, 15,19%.

A idade das carteiras também joga contra a captação líquida dos planos com renda fixa em comparação com os balanceados e multimercados. Como antes praticamente só se aplicava em planos DI ou renda fixa, essas carteiras estão mais velhas, e alguns aplicadores estão próximos da data de resgates, sem grande apetite por correr mais riscos, explica Franco. Já os planos com ações estão apenas começando a receber dinheiro de aplicadores.