Título: Nova proposta para Doha dá mais proteção a emergentes
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Fonte: Valor Econômico, 11/02/2008, Brasil, p. A4

O Brasil e demais países emergentes poderão proteger um número maior de produtos industriais nas negociações da Organização Mundial de Comércio (OMC). Pelo menos é o que dá a entender a proposta do mediador da negociação de produtos não-agrícolas, Don Stephenson. A mudança pode ajudar a destravar a combalida Rodada Doha.

No rascunho do acordo, divulgado sexta-feira, o mediador voltou atrás e deixou em aberto o percentual de produtos "sensíveis", ou seja, que sofrerão cortes menores de tarifas, para os países em desenvolvimento. Desde de julho de 2007 estava definido que os países poderiam excluir totalmente 5% das linhas tarifárias ou aplicar metade do corte previsto para 10%.

Parece um retrocesso, mas, na avaliação da indústria brasileira, foi uma estratégia para avançar. "É um grande avanço para a negociação", diz Carlos Cavalcanti, vice-presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Abriu as portas da negociação", afirma Soraya Rosar, coordenadora de negociações internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Com possibilidade de excluir um percentual maior de produtos, pode se tornar mais fácil para os países emergentes aceitar os cortes de tarifas. Para o Brasil, a proposta em discussão significa cortes médios entre 56% a 60% nas tarifas industriais. "A barganha será entre cortes e flexibilidade", diz Soraya.

Como Brasil e Argentina não conseguiam chegar a uma lista comum de produtos sensíveis, o Mercosul havia solicitado elevar o limite para 16% no caso das uniões aduaneiras. A União da África Austral (Sacu, da sigla em inglês) argumentou que os países de menor desenvolvimento do bloco, que é liderado pela África do Sul, seriam muito prejudicados.

O texto do mediador agrícola, Crawford Falconer, também foi divulgado sexta-feira. Pela primeira vez, o rascunho tratou das salvaguardas e dos produtos especiais para países em desenvolvimento. Falconer aceitou como base para negociação os 20% de produtos especiais, solicitados pelos países liderados pela Índia. E também admitiu salvaguardas de volume e preço, com altas tarifas, o que preocupa países exportadores agrícolas, como o Brasil.

André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), diz que, na salvaguarda por volume, o mediador estabeleceu como teto as tarifas da Rodada Uruguai, uma demanda brasileira. Mas não fez o mesmo com a salvaguarda de preços. O receio é que a proteção nesse caso supere os níveis atuais. Para o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, os textos revisados deixam os países "um passo mais perto" de encontrar "um balanço final para uma Rodada ambiciosa e voltada para o desenvolvimento". (RL)