Título: De calças curtas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 19/02/2008, Investimentos, p. D1

Os fundos de arbitragem de ações, ou long/short - que montam carteiras e depois fazem hedge (proteção) apostando na queda de papéis relacionados -, são sempre indicados pelos especialistas como alternativas mais seguras para quem quer evitar os sobressaltos do investimento puro em ações. Mas, no ano passado, o que se viu foi que a maioria dessas carteiras - que se tornaram uma coqueluche há dois anos, levando até à criação de uma categoria separada dos demais multimercados na Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid) - foi pega no contrapé pelas turbulências nas bolsas de valores e perdeu dinheiro. E a situação se repetiu no mês passado. Poucos conseguiram se manter neutros em relação à queda de 6,88% do Índice Bovespa em janeiro.

Olhando a lista de 33 fundos que compõem a carteira do Índice de Fundos Long Short (ILS) da consultoria RiskOffice, o que se observa é que 20 deles fecharam no vermelho em janeiro. E, num período mais longo, 12 meses encerrados em janeiro, 17 ficam abaixo do CDI, de 10,65% no período, sendo que um deles teve perdas e vários ficaram bem longe desse percentual. Com isso, o ILS, que faz uma média ponderada dessas carteiras, terminou janeiro com uma perda de 0,53%, maior que a dos fundos multimercados tradicionais, como mostra o Índice de Multimercados (IFM) da RiskOffice, que perdeu 0,30% no caso dos abertos e 0,23% nos fechados para captação. Em 12 meses, o retorno dos long/short está em 9,84%, apanhando também dos 10,23% do IFM de carteiras abertas e 11,63% do IFM-NR, de fundos fechados.

Os resultados dos multimercados e dos long/short no ano passado também contradizem outra máxima do mercado: de que essas carteiras vão melhor nos momentos de maior volatilidade, diz Fernando Lovisotto, sócio da RiskOffice. "E a volatilidade aumentou muito em 2007, de 20% ao ano da média histórica para 45% ao ano", diz. Basta lembrar que o Ibovespa chegou a oscilar 4 mil pontos durante um único dia, ou seja, quase 6% de variação em questão de horas.

Junto com a volatilidade, veio o descolamento de Petrobras e Vale a partir do segundo semestre principalmente. Com isso, o ILS, que vinha bem até julho, ficou praticamente zerado até dezembro. Como muitos fundos não apostavam na alta de Petrobras e Vale e acreditavam na queda do índice futuro, acabaram indo mal. "Mas se pegarmos gestores que não são tão concentrados em poucos papéis, ou não fazem hedge em índice futuro ou tinham Petrobras e Vale na carteira, esses foram bem", diz Lovisotto. Isso atingiu também fundos que não eram puramente long/short, mas que usavam a estratégia para aumentar os ganhos. Alguns, diz Lovisotto, resolveram abandonar a estratégia ao menos até terem estrutura para acompanhar melhor ações e usar menos o índice futuro.

Para Lovisotto, o impacto de Petrobras e Vale foi uma surpresa para os gestores e não necessariamente um erro de estratégia. "No começo de 2007, ninguém queria Petrobras e, até maio, o papel caía enquanto o índice subia puxado por Vale", lembra. Depois, em seis meses, a estatal subiu quase 100%. "E muitos gestores estavam vendendo Petrobras, foi meio inesperado". Ele dá o exemplo também dos fundos de ações. "De 206 fundos ativos, só uns dez bateram o Índice Bovespa em 2007".

Foi o equilíbrio entre a carteira de ações comprada (que apostava na alta) e a vendida (papéis em que esperava queda) que fez o Orbe Balance fechar janeiro com retorno de 1,14%, para 0,92% do CDI no mês, e, em 12 meses, de 26,75% - mais que o dobro do referencial. "Somos especializados em renda variável e usamos nossa experiência para não ficar dependendo do Índice Bovespa, que é muito concentrado", diz Fernando Camargo, sócio da Orbe Investimentos. O Orbe Balance trabalha, em média, com 15 papéis comprados e 20 vendidos. "E nossa idéia, na ponta vendida, não é ganhar dinheiro com a queda, mas ficar neutros, ou seja, fazer a proteção da carteira comprada". As apostas de Camargo incluíram empresas menos negociadas como Karsten, Unipar e Banco Alfa, além de Contax, Marcopolo e Klabin. Para ele, a bolsa este ano vai ser pior do que no ano passado. "A economia do mundo está mais sensível e isso aumenta a percepção de risco e volatilidade".

Os gestores tiveram praticamente dois anos em 2007, diz Marcelo Cavalheiro, gestor de renda variável da Hedging-Griffo. "O primeiro foi normal até julho, com vários fundos escolhendo ações e fazendo hedge no Ibovespa futuro", lembra. O segundo, a partir de agosto, foi de um enorme descasamento entre primeira e segunda linhas. "Não foi só a primeira linha que subiu, a segunda e a terceira linhas caíram, pois houve uma saída generalizada, especialmente de fundos estrangeiros que carregavam posições expressivas de ações novas compradas em ofertas públicas", explica. Para ele, foi um período difícil que não deve se repetir sempre. "Tanto que quem ganhou um pouco se destacou dos demais", lembra. Cavalheiro diz que o fundo HG Strategy não mudou de estratégia, mas aumentou as posições mais líquidas, como Petrobras e Vale, e aumentou um pouco o dinheiro em caixa.

Para ele, as perdas do ano passado servem também para mostrar as diferenças entre os vários fundos long/short do mercado. Alguns, explica, trabalham com pares de ações, outros com pares setoriais, há os que têm uma carteira mais de longo prazo e outra mais curta, outros usam o índice futuro para fazer o hedge e compensam a concentração de Petrobras e Vale, mas todos são tratados da mesma forma. Ele diz também que não há grandes saídas de investidores da Hedging-Griffo, "mas isso depende da casa e também do histórico do fundo". "Se o fundo perdeu 5% em um mês e no seguinte recuperou 3,5%, o investidor fica, mas se a carteira nunca perdeu nada e tem um prejuízo alto, assusta, pois a expectativa é de que ele vai demorar mais para se recuperar".