Título: Portaria proíbe crédito a empresa que desmatar
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 25/01/2008, Brasil, p. A3

Marina Silva: "Nos últimos anos, Mato Grosso tem colaborado bastante e reduzido seus índices de desmatamento" O governo federal vai proibir os bancos federais de financiar empresas que desmatam terras de maneira ilegal na Amazônia. Esta é uma das principais decisões de uma portaria que será publicada hoje no "Diário Oficial das União", regulamentando decreto editado em dezembro. A mesma portaria vai trazer uma lista com as 36 cidades responsáveis por 50% do desmatamento na região, além de proibir qualquer novo desmatamento nessas cidades. Os proprietários terão ainda que fazer um recadastramento, sob pena de perder o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR).

Sem esse documento legal, a produção será embargada e toda a cadeia produtiva que comercializar esses produtos será considerava co-responsável pelo desmatamento. "Os embargos já existiam, mas, muitas vezes, o produtor recorria da multa e comercializava seus produtos. Agora, não apenas ele, mas quem comprar esses produtos poderá ser considerado cúmplice de desmatamento", afirmou o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco.

Preocupado com o avanço do desmatamento - no ano passado, entre agosto e dezembro, chegou a 3.233 km2 da floresta amazônica, , embora o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) estime que a devastação tenha superado os 7.000 km2 -, -, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva realizou ontem reunião de emergência para tratar do assunto. Agora, ele pretende se reunir com os governadores dos Estados e os prefeitos das cidades que mais devastam a Amazônia. Participaram do encontro de ontem sete ministros, além do diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa.

Diante dos ministros, Lula disse que não é hora de acusar ninguém, mas ordenou aos presentes que fossem até o local verificar o que está acontecendo. "Temos de redobrar os esforços para chegarmos em agosto com uma redução nesses números", disse o presidente. Os números surpreenderam até mesmo o governo. A ministra de Meio Ambiente, Marina Silva, comentou ontem que, por causa das chuvas, os desmatamentos não ocorrem normalmente nesta época do ano. Por isso, ela não soube precisar se houve um recrudescimento na ação das madeireiras.

Marina não escondeu a irritação com alguns agentes locais, como o governador de Rondônia, Ivo Cassol, que recolheu 45 policiais militares destinados a escoltar um grupo de fiscais do Ibama que investigariam uma denúncia de desmatamento. Os demais Estados - Amazonas, Pará e Mato Grosso - são governados por aliados do governo Lula. Marina disse que, nesses casos, é preciso ter uma ação republicana. "Contravenção é contravenção e devemos agir da mesma forma", afirmou ela.

Marina defendeu, no entanto, parceria com o governador de Mato Grosso, Blairo Maggi (PR), acusado de ser um dos maiores responsáveis pelo desmatamento da região. Maggi é um aliado fiel do presidente Lula desde o segundo turno das eleições presidenciais. "Nos últimos anos, o Estado de Mato Grosso tem tido uma colaboração importante e reduzido seus índices de desmatamento", elogiou a ministra.

Para tentar intensificar as ações de repressão, a Polícia Federal programou uma série de ações na região, que vão começar a partir de 21 de fevereiro. Segundo o diretor Luiz Fernando Corrêa, a inteligência da PF já sabe quem são os responsáveis pelo desmatamento, mas, alegando questões estratégicas, ele preferiu não revelar nomes. Serão encaminhados 300 homens para as superintendências estaduais - um acréscimo de 25% no efetivo total -, além de outros 780 para 11 postos móveis em cidades como Trevo do Lagarto (Mato Grosso), Barra do Garça (Mato Grosso), Itaituba (Pará) e São Cruz (Maranhão).

Além das operações da Polícia Federal, o governo espera que outro conjunto de ações diminua o desmatamento da Amazônia: o controle da agropecuária; a criação de Unidades de Conservação às margens da BR 319; o bloqueio do financiamento para atividades que provoquem desmatamento (Banco do Brasil, Banco da Amazônia e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); além do monitoramento imediato e mensal das áreas embargadas nos municípios críticos através de sobrevôos por aviões do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia.

Ontem, o presidente da Comissão Nacional de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Assuero Veronez, afirmou que o desmatamento na Amazônia só será controlado de forma adequada se o governo federal não se preocupar apenas em punir, mas oferecer políticas compensatórias para que os produtores evitem a derrubada de árvores.

"Na hora em que a floresta de pé valer mais do que a floresta derrubada, vamos conseguir consolidar números para baixo e atingir o desmatamento zero", afirmou Veronez. Ele ressaltou, entretanto, que não enxerga, da parte do governo, disposição para discutir uma legislação ambiental "condizente" com a importância do agronegócio para o país: "Há muita ideologia e ignorância".

Para Veronez, seria hipocrisia dizer que a expansão da soja e da pecuária não influenciou no desmatamento da Amazônia nos últimos cinco meses de 2007. Ele relativizou a dimensão dos 3.235 km2 detectados como devastados: "Não é para causar tanta comoção. Historicamente, não é muito. Houve uma redução significativa do desmatamento na região nos últimos três anos, e acredito que isso não vá retroceder." (Com agências noticiosas)