Título: Renovação de cafezais volta a ter recursos do governo
Autor: Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 20/02/2008, Agronegócios, p. B14

Pela primeira vez depois de 14 anos, a cafeicultura deverá receber investimentos do governo para a renovação das lavouras. Dos R$ 2,4 bilhões previstos no orçamento do Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira) para 2008, R$ 240 milhões deverão ser destinados à renovação dos cafezais e em inovação tecnológica dos parques industriais do setor.

Nos últimos anos, mais de 95% dos recursos do Funcafé foram destinados ao financiamento do custeio, colheita, estocagem e pré-comercialização. Concentrados nas mãos do setor produtivo, esses recursos geraram forte polêmica no ano passado, colocando em lados opostos cafeicultores e indústrias, estas apoiadas pelos exportadores.

Mas com a aprovação desses recursos para investimentos, os ânimos se acalmam por ora, uma vez que toda a cadeia se beneficia. "Com boa parte dos cafezais velhos, a produtividade das lavouras fica mais baixa. Essa renovação estimulará maior produtividade no campo", diz Nathan Herszkowicz, diretor da Associação da Indústria do Café (Abic). Esses recursos, aprovados durante reunião do CDPC (Conselho Deliberativo da Política do Café) no início de fevereiro, ainda depende da aprovação de voto no CMN (Conselho Monetário Nacional). Um grupo de trabalho será criado para discutir como esses recursos serão utilizados.

Os custos de renovação dos cafezais são altos, em torno de R$ 2 mil por hectare. Com um total de 2,1 milhões de hectares plantados com café no país, o ideal é que pelo menos 10% da área seja renovada por safra. No entanto, menos de 3% tem recebido investimentos nos últimos anos, afirma Gilson Ximenes, presidente do Conselho Nacional do Café (CNC). "O certo mesmo é arrancar as árvores de café a cada 15 a 20 anos", afirma ele.

Embora muitas regiões do país tenham produtividade média acima de 30 sacas por hectare, a média nacional gira em torno de 20 sacas. Na Costa Rica, a média por safra gira em torno de 27 sacas. "A Costa Rica investiu muito na renovação dos cafezais", afirma Herszkowicz.

Mesmo com os preços internacionais do café batendo o maior patamar de quase dez anos, os produtores argumentam que os custos de produção no país cresceram, inviabilizando os investimentos no campo. Com um endividamento superior a R$ 2 bilhões, concentrado sobretudo no Sul de Minas Gerais, os produtores estão concentrando seus esforços para a rolagem de dívida.

Analistas ouvidos pelo Valor afirmam que o programa de rolagem de dívida estimula o setor produtivo a segurar as vendas. O setor produtivo passou por uma forte crise no início dos anos 2000, mas a recuperação dos preços do café no mercado internacional nos últimos três anos voltou a dar fôlego para o setor. "É preciso lembrar, contudo, que os custos de produção do setor subiram neste período", afirma Sérgio Carvalhaes, do Escritório Carvalhaes, de Santos (SP).

Apesar de aprovada pelo orçamento, a liberação dos recursos do Funcafé para investimentos em lavouras e parques industriais não deverá ocorrer tão cedo. Este pleito não deverá ser votado na próxima reunião do CMN, previsto para a última semana de fevereiro, segundo Lucas Ferreira, diretor de café do Ministério da Agricultura.

Embora ainda esteja sob "embargo", a aprovação desses recursos é uma conquista para Abic, uma vez que a proposta foi levada pela entidade às discussões do CDPC. As indústrias deverão se beneficiar diretamente desses recursos, já que uma parte deverá ser destinada para a melhoria do parque industrial. "Pequenas empresas poderão renovar seus equipamentos e investir em produtos de melhor qualidade."

Desde que foi criado pela Abic, em 2004, o Programa de Qualidade do Café (PQC), voltado para as torrefadoras, já certificou 263 marcas de café no país (de mais de 2 mil), envolvendo 48 indústrias. Deste total, 53% são marcas tradicionais. O restante refere-se ao produto gourmet e especiais.

Estimulados pela melhoria da qualidade do grão, o consumo no país tem crescido. No ano passado, o Brasil consumiu 17,1 milhões de sacas de café. Para este ano, a meta é atingir 18 milhões de sacas, segundo Herszkowicz.