Título: Importações abastecem 30% da alta da demanda
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 21/02/2008, Brasil, p. A8

O crescimento superior a 20% das importações de bens e serviços em 2007 abasteceu cerca de 30% da expansão da demanda doméstica e das exportações no ano passado, tendência que pode se acentuar em 2008 e 2009. Embora as compras externas tenham um peso ainda modesto na economia brasileira, a sua expansão acelerada, favorecida pelo câmbio valorizado, tem sido decisiva para evitar pressões inflacionárias relevantes, mesmo num cenário de aquecimento da atividade econômica.

O departamento de economia do Credit Suisse prevê que as importações devem responder este ano por 13% da oferta total de bens e serviços, aumentando em relação aos 11,9% estimados para 2007. Embora o percentual seja modesto em relação à oferta, o ponto é que o ritmo de expansão das compras externas tem sido significativamente maior que o dos demais componentes do PIB do ponto de vista da demanda (consumo das famílias, consumo do governo, investimentos, variação de estoques e exportações). Para 2007, a estimativa é de que as quantidades importadas de bens e serviços tenham aumentado 21%, muito acima da alta de 6% da produção industrial. "Nesse cenário, nós estimamos que as importações abastecerão um terço da da expansão da demanda doméstica e das exportações em 2008 e 2009", afirmam os analistas do Credit Suisse. A previsão é de que, em 2007, a participação tenha ficado em 31%.

Se respondem apenas por 13% da oferta total de bens e serviços na economia, as importações têm um peso mais relevante quando a conta se limita à indústria. A fatia dos importados no consumo brasileiro de produtos industriais atingiu 20% no período de 12 meses encerrado no terceiro trimestre de 2007. No fim de 2004, quando começou o mais recente período de valorização do real, esse percentual estava em 15,6%. O cálculo considera o consumo aparente, que é a produção doméstica somada às importações, menos a exportação.

Francisco Pessoa Faria, economista da LCA Consultores, diz que o "significativo" aumento na participação das importações ocorreu em um período de forte crescimento da produção industrial. Ele acredita que a produção doméstica não foi prejudicada pelas importações, porque a demanda brasileira cresceu muito, impulsionada pelo crédito e pelos juros mais baixos. "É um cenário diferente do que ocorreu em 1995, no Plano Real, quando foram adotadas medidas monetárias contracionistas."

As importações ganharam uma relevância maior na economia brasileira de forma generalizada. De 21 setores industriais analisados pela LCA, apenas quatro registraram queda na fatia dos importados no período: extrativa mineral, petróleo e carvão, químico diversos e abate de animais. No setor de petróleo, os investimentos da Petrobras para aumentar a produção, quase atingindo a auto-suficiência, contribuíram para a queda das importações, apesar do crescimento da economia.

Nas atividades em que os produtos importados ganharam espaço, destacam-se veículos, têxtil e móveis. Entre o fim de 2004 e os 12 meses encerrados no terceiro trimestre de 2007, a participação das importações no consumo cresceu 115%, 78% e 70%, respectivamente. Em automóveis, por exemplo, o share dos produtos vindos do exterior subiu de 4,9% para 10,6% no período. Em máquinas e tratores, a alta foi de 27,8% para 29,3%. Faria lembra que a produção doméstica de automóveis e máquinas também cresceu significativamente.

Na avaliação da LCA, o crescimento da compra de bens industriais importados complementou a produção doméstica e contribuiu de significativamente para que não houvesse pressões inflacionárias no curto prazo. O economista explica que, apesar de uma participação minoritária, a concorrência dos importados ajuda a frear o aumento de preços de itens nacionais.

A consultoria estima que a fatia das importações no consumo industrial brasileiro deve continuar subindo e atingir 22% este ano, mantendo sua contribuição para o controle da inflação. Com base em um cenário de desaceleração controlada na economia dos EUA, Faria diz que a quantidade de produtos importados deve seguir crescendo acima da produção industrial.

A fatia do aumento da demanda abastecida pelas compras externas mudou de patamar nos últimos anos, segundo o Credit Suisse. Em 2004, ano de forte crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), as importações abasteceram 23% da alta do consumo. Em 2006, o número chegou a atingir 36%, caindo para os já citados 31% no ano passado, indicando a capacidade de reação da indústria brasileira.

Para os economistas do Credit Suisse, esse recuo se deveu ao crescimento mais robusto da produção doméstica de bens e serviços no ano passado, ainda que as importações tenham crescido 21% em 2007, mais que os 18,5% do ano anterior. A produção industrial, que cresceu 3,1% em 2006, avançou 6% no ano passado.

Os serviços, por sua vez, tiveram expansão de 4,8% em 2007, segundo estimativas do banco, mais que a alta de 3,8% de 2006. Como a produção doméstica tem um peso bem maior no total da oferta da economia, o avanço mais forte da indústria e do setor de serviços explica por que as importações abasteceram uma fatia um pouco menor da alta da demanda doméstica e das exportações em 2007.

Para este ano e para o próximo, o banco acredita que poderá haver um novo aumento. As importações continuam a crescer com força, e é provável que a economia sofra alguma desaceleração. Em vez dos 5,4% esperados para 2007, o PIB deve avançar algo como 4,5%, estima o Credit Suisse.

Se confirmado, é um cenário bastante favorável para o controle da inflação. A economia pode continuar a crescer a um ritmo robusto sem pressionar demais os índices de preços. "Nossas simulações sugerem que é o crescimento das compras externas, e não o seu nível, o que mais influencia a dinâmica da inflação", dizem os analisas do banco.

Esse é um dos motivos que fazem o Credit Suisse apostar num Índice de Preços ao Consumidor (IPCA) de 4% em 2008, abaixo da projeção do mercado, de 4,39%. Não por acaso, o banco acredita que os juros voltarão a cair neste ano, estimando uma taxa Selic, hoje em 11,25% ao ano, de 10,75% em dezembro.

O câmbio deve se manter favorável às importações. A LCA prevê que o dólar deve continuar se apreciando, atingindo a média de R$ 1,70 este ano. Faria enumera os motivos para o real forte: o diferencial entre os juros doméstico e internacional ainda é alto, existe uma expectativa positiva de entrada de investimentos estrangeiros direitos no país, e os preços das commodities devem subir mais, garantindo maior entrada de dólares.