Título: Títulos projetam inflação acima da meta
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 25/01/2008, Finanças, p. C7

A inflação embutida nos títulos públicos federais chegou a 4,85%, ultrapassando as metas oficiais de inflação de 2008 e de 2009, estabelecidas em 4,5%. Em parte, a inflação implícita nos papéis federais subiu devido a oportunidades de lucros em operações de curto prazo. Mas também reflete a deterioração das expectativas inflacionárias do mercado financeiro.

No início da semana, quando o mercado foi fortemente afetado pelas turbulências internacionais, a inflação embutida nos títulos federais chegou a superar 5%. Ontem, com a melhoria dos mercados, caiu um pouco.

"Talvez tenha havido algum exagero, que foi corrigido", afirma o economista da Renascença DTVM, Francisco Cintra.

Segundo ele, a alta da inflação implícita nos títulos federais reflete o clima de maior incerteza sobre a inflação.

Cintra cita um estudo divulgado no ano passado pelo BC ("Brasil: domando as expectativas inflacionárias", de Afonso Bevilaqua, Mário Mesquita e André Minella) que mostra que as expectativas de inflação têm um papel importante na determinação da inflação implícita nos títulos públicos.

Economicamente, a inflação implicita representa a remuneração adicional que os investidores exigem do Tesouro Nacional, nos leilões de títulos públicos, para compensar a inflação esperada. Tecnicamente, a inflação implícita é calculada pela diferença entre a remuneração dos títulos prefixados (ou dos juros prefixados negociados nos mercados futuros) e os juros dos títulos remunerados pela inflação.

No caso, a inflação de 4,85% toma como base os contratos DI negociados na Bolsa de Mercadoria & Futuros (BM&F) com vencimento em 2010, que ontem fechou em 12,74% ao ano, e a remuneração paga por um título público vinculado ao IPCA, as NTN-Bs, também com vencimento em 2010, ontem em 7,53% ao ano.

Sérgio Goldenstein, da Arx Capital Management, pondera que a alta da inflação implicita não deve ser integralmente atribuída à deterioração das expectativas inflacionárias. "É bom lembrar que as expectativas de inflação medidas pela pesquisa de mercado do BC estão em 4,37% para 2008 e em 4,15% para 2009."

Segundo Goldenstein, a alta da inflação corrente turbinou a rentabilidade obtida em aplicações de curto prazo nas NTNs-B. A pesquisa de expectativas de mercado do BC aponta uma inflação de 0,58% para janeiro, e parte dos analistas prevê índices tão altos quanto 0,7% para o mês. Com a alta da inflação de curto prazo, o rendimento da NTN-B chega a uma taxa anual de cerca de 16%, bem acima do custo de captação no mercado, de 11,25%.

O bom rendimento prometido pelas NTNs-B aumentou a procura pelo papel e reduziu os juros pagos - o que, como efeito colateral, ampliou a inflação implícita. Goldenstein lembra que, no primeiro semestre de 2007, quando a inflação corrente chegou a níveis tão baixos como 0,2% ao mês, o interesse do mercado pelas NTNs-B caiu muito. Na época, isso produziu uma queda na inflação implicita nos títulos federais, que chegou a 3,1%, bem abaixo da expectativa de inflação da ordem de 4% medida na época pela pesquisa de mercado do BC.

Goldenstein poderá, por outro lado, que a alta da inflação implícita também reflete um ambiente de maior risco no mercado financeiro, criado pelas turbulências internacionais, que tornam mais incerta a trajetória de inflação. E também incorpora a deterioração que, de fato, aconteceu nas expectativas de inflação desde meados de 2007.