Título: Alta de preços dos serviços preocupa BC
Autor: Alex Ribeiro,
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2008, Brasil, p. A3

O Banco Central e o Ministério da Fazenda passaram a monitorar mais de perto os aumentos dos preços dos serviços. O BC está preocupado com uma possível inflação de demanda, que poderia exigir maior cautela da política monetária. A Fazenda começa a definir a meta de inflação de 2010 e, para tanto, procura saber até que ponto os reajustes dos serviços são apenas um resultado natural do processo de desenvolvimento da economia brasileira.

Nos últimos anos, os reajustes dos serviços se mantiveram sistematicamente acima da meta de inflação, mas podia-se perceber uma tendência clara de queda, pelos menos até meados de 2007. De 2005 para 2006, a inflação de serviços recuou de 6,77% para 5,49%, e nos 12 meses encerrados em outubro de 2007 caiu ao seu mais baixo valor dos últimos cinco anos, com 4,7%.

Parecia apenas uma questão de tempo para que a inflação de serviços chegasse à meta geral para o índice de preços, definida em 4,5% entre 2005 e 2009. Mas, desde então, voltou a subir, atingindo 5,19% no encerramento de 2007, justamente quando a economia entrava em fase de maior aquecimento. Nos 12 meses encerrados em janeiro, recuou levemente, para 5,12%. Por enquanto, o avanço dos preços dos serviços não chega a ser explosivo. A consultoria Tendências, por exemplo, projeta um índice de 5,5% em 2008, o que não impede que a inflação como um todo fique dentro da meta.

Dentro do BC, a aceleração da inflação de serviços merece atenção redobrada, porque, embora moderada, pode ser um sinal de mudança da tendência benigna registrada nos últimos anos. Na visão do BC, o processo de desinflação da economia brasileira só estará consolidado quando a inflação de serviços convergir para a meta geral de inflação.

Nos últimos anos, a política monetária fez um grande esforço para reduzir a inflação de serviços, mas os resultados são muito lentos. Entre todos os preços da economia, os serviços são os que apresentam maior rigidez. Ou seja, quando o BC aumenta os juros, demoram mais a cair.

Uma das explicações para isso é o fato de os preços dos serviços serem reajustados com menos freqüência do que os outros preços. Estudo publicado pelo BC mostra que, em média, os serviços são majorados a cada seis meses e meio, enquanto outros bens são reajustados com freqüências entre um e três meses. Assim, se os serviços de fato entrarem num trajetória de alta, o BC terá um trabalho mais duro para baixá-los de novo.

O diagnóstico do BC é que os preços dos serviços estão se acelerando, porque a economia está aquecida. Num ambiente como esse, fica mais fácil para prestadores de serviços repassarem aos preços, por exemplo, a inflação que está sendo registrada nos alimentos. Também existe preocupação mais geral com o possível descompasso entre o consumo e a capacidade de as empresas prestarem serviços.

Como o principal insumo dos serviços é a mão-de-obra, o BC acompanha com atenção a evolução da taxa de desemprego. Quedas muito acentuadas do desemprego significam que a capacidade de produção está se esgotando e, portanto não será capaz de atender à demanda sem causar aceleração da inflação.

Em documentos oficiais, o BC assinalou que, em fins de 2007, quando a inflação de serviços voltou a se acelerar, a taxa de desemprego atingiu o patamar mais baixo na série histórica, com 7,42% em dezembro. Ou seja: existem indícios de que os preços de serviços estão subindo, porque a capacidade produtiva está chegando ao limite.

No Ministério da Fazenda, a evolução dos preços dos serviços é acompanhada com interesse bem distinto - em junho, o Conselho Monetário Nacional (CMN) deverá definir a meta de inflação de 2010. Os economistas da Fazenda estão investigando se a meta de inflação, definida em 4,5% para 2009, deve continuar nesse patamar para acomodar uma inflação de serviços, que é intrinsecamente mais elevada em países em desenvolvimento.

Em países ricos, os preços dos serviços são mais altos do que em economias que estão se desenvolvendo. Isso faz com que um corte de cabelo em Nova York ou Tóquio, por exemplo, seja mais caro do que em São Paulo. São essas diferenças que estão por trás do indicador calculado pelo Banco Mundial sobre a paridade do poder de compra (PPP, na sigla em inglês). Dados de dezembro de 2007 mostram, por exemplo, que por conta sobretudo da diferença dos preços de serviços, o custo de vida na Noruega é 143% maior que no México.

Na medida em que a economia brasileira se desenvolver, afirma um economista do governo, os preços dos serviços vão convergir para os vigentes nos países desenvolvidos. Isso já estaria ocorrendo. A meta de inflação, portanto, deve continuar maior do que a vigente em países desenvolvidos justamente para acomodar essa mudança de preços relativos.

Há várias explicações para a aceleração dos preços dos serviços nas economias em desenvolvimento. Uma delas é que os serviços são chamados bens superiores. Ou seja, quanto mais a renda da população cresce, maior a demanda por serviços. Essas diferenças podem ser observadas até mesmo dentro de um país. Em São Paulo, por exemplo, a população com renda entre 1 e 40 salários mínimos gasta, em média, 5,08% da renda com serviços pessoais, como costureiras, cabeleireiros e empregados domésticos. Em Goiânia, gasta apenas 4,45%.

Outra teoria que explica a alta de preços dos serviços em economias em desenvolvimento tem a ver com diferenças entre a produtividade na indústria e nos serviços. Na indústria, os ganhos de produtividade avançam mais rapidamente, por isso as empresas podem oferecer salários maiores aos funcionários sem reajustar preços. Para competir com a indústria pela mão-de-obra, os serviços também são obrigados a reajustar salários. Mas como nos serviços os ganhos de produtividade são mais lentos, os aumentos salariais são repassados aos preços. Entre os economistas, o fenômeno é conhecido como o efeito Balassa-Samuelson.

Uma visão alternativa dentro do próprio governo é que, embora seja fato que em países em desenvolvimento a inflação de serviços caminhe mais rápido do que o índice geral de preços, não se pode atribuir a esse fenômeno a aceleração recente dos preços dos serviços. Entre 2006 e 2007, quando a renda se expandia rapidamente, os preços dos serviços caíram. Só voltaram a subir no fim do ano, quando a taxa de desemprego despencou.

Em outros países em desenvolvimento, também houve a discussão sobre a necessidade de uma meta de inflação mais alta para acomodar o avanço dos serviços. A conclusão geral foi de que era possível manter uma meta de inflação mais baixa e, ao mesmo tempo, permitir a mudança de preços relativos.

Na Fazenda, também se atribui o avanço do preço dos serviços aos aumentos do salário mínimo. Mais da metade dos serviços pessoais é representada pelos empregados domésticos, cujos reajustes estão influenciados pelo salário mínimo. No BC, a visão é que não há necessariamente vínculo automático dos salários dos empregados domésticos com o salário mínimo. Portanto, se os patrões estão dando aumentos salariais maiores apenas porque o salário mínimo subiu, é porque a demanda por esses serviços cresceu muito..