Título: Cresce segmentação no crédito
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2008, Finanças, p. C1

Com a expansão dos empréstimos para a compra de imóveis nos últimos anos, os bancos privados já começam a ampliar suas áreas internas de atendimento, a criar produtos específicos para essas linhas e a desenvolver processos para atender diferentes públicos.

Desde o fim dos anos 80, os grandes bancos de varejo praticamente deixaram de oferecer financiamentos imobiliários. A inflação do período, somada à alta inadimplência, levou a perdas enormes para as instituições. Somente o antigo Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) acumula, até hoje, déficit global de quase R$ 100 bilhões (46% da Caixa e 28% dos bancos privados).

Com isso, as áreas de concessão desses empréstimos foram praticamente fechadas nos grandes do setor. Apenas a Caixa Econômica Federal se manteve atuante por seguir interesses sociais.

Nos últimos anos, no entanto, depois de alguns ajustes regulatórios, a oferta dos privados voltou com força e praticamente dobra a cada ano. Em 2007, os bancos concederam quase R$ 28 bilhões em crédito e preparam se agora para atender uma demanda cada vez maior e mais exigente além da concorrência acirrada. "O crédito imobiliário faz parte do processo de sofisticação da oferta de produtos", afirma Paulo Renato Steiner, diretor do HSBC.

Este mercado não é dos mais rentáveis em termos de taxas, mas a fidelização de um cliente por até 30 anos desperta a atenção dos banqueiros. Estimativas dos bancos dão conta que o spread (diferença entre o custo de captação e a taxa efetivamente cobrada dos clientes) fique próximo de 1%.

A grande aposta é no segmento de baixa renda, onde há a maior demanda reprimida e déficit habitacional. No ano passado, os empréstimos para imóveis de até R$ 120 mil somaram R$ 4 bilhões (cerca de R$ 1 bilhão dos bancos privados) e já atingem quase um terço dos imóveis financiados (60 mil unidades, em 2007).

A ofensiva dos bancos, no entanto, inclui todas as faixas de renda. O segmento que mais cresceu relativamente no ano passado foi o de imóveis acima de R$ 350 mil, antes mercado cativo das construtoras, com avanço de 250%.

O Banco do Brasil, por exemplo, mantém um projeto-piloto em São Paulo e, enquanto aguarda liberação para operar com recursos da poupança, já consegue bons resultados neste segmento de imóveis acima R$ 350 mil. "Estamos bem competitivos", afirma Paulo Rogério Caffarelli, diretor do banco. No total, em pouco mais de um mês, foram analisadas mais de mil propostas, com tíquete médio de R$ 160 mil.

Os bancos privados têm ampliado, também, a oferta de linhas prefixadas. No ano passado, foi concedido pelas instituições mais de R$ 1,2 bilhão para essas linhas. O Santander, um dos bancos que mais inovaram no mercado, foi o primeiro a oferecer empréstimos com taxas prefixadas, o SuperCasa Parcelas Fixas. Em 2007, 44% da produção do banco foi prefixada, afirmou Ana Isabel Perez, vice-presidente do banco.

De fato, a preocupação vai além de apenas atender diferentes classes sociais. Os bancos se preparam para oferecer diferentes produtos e com melhor qualidade, como por exemplo, agilizar a concessão dos empréstimos ou mesmo financiar os móveis da nova casa, afirma o diretor do HSBC. A idéia é oferecer produtos para "transformar o imóvel em um lar".

Hoje a operação é absolutamente financeira, mas aos poucos os bancos começam a perceber que podem oferecer serviços agregados, como seguros e até mesmo o refinanciamento do imóvel alguns anos mais tarde. Alguns bancos já oferecem produtos como esse, comum em países como Estados Unidos e Holanda, como o Banco Fibra.

Ademir Cossiello, do Bradesco, destaca que hoje já existe, de fato, um reflexo do momento positivo do setor imobiliário na concessão de outros empréstimos, como mobiliários e eletrodomésticos.

Outras novidades recentes foram o financiamento do imóvel na planta e a incorporação de despesas com impostos e registro da escritura no financiamento. Outros bancos, como o Panamericano, possuem ainda linhas de empréstimos pessoais que usam o imóvel como garantia, semelhante à "troca com troco" dos veículos.