Título: Seleções em baixa
Autor: Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 26/02/2008, EU & Investimento, p. D1

Os fundos multigestores - que compram cotas de outros fundos de badalados gestores do mercado - estão perdendo investidores em meio à queda de rentabilidade dos multimercados e da bolsa. Em seis meses, uma amostra de 22 desses fundos - dois de ações e 20 multimercados abertos para o público em geral - apresenta uma saída líquida de R$ 1,856 bilhão, ou 28% do total aplicado, o que reduziu o patrimônio dessas carteiras para R$ 4,589 bilhões. Boa parte da saída ocorreu nos últimos 90 dias, com resgate líquido de R$ 1,123 bilhões, dos quais R$ 348 milhões só nos últimos 30 dias encerrados dia 21, conforme dados do site Fortuna.

A explicação para a saída está na rentabilidade. Em 12 meses, apenas três multimercados apresentam ganho superior ao CDI. Em seis meses, também há três acima do CDI - Caixa Estratégico, Itaú Personnalité Multiestratégia e Nossa Caixa -, mas a distância dos demais em relação ao referencial é maior. Já no caso dos fundos que selecionam gestores de ações, as perdas de patrimônio foram menores, limitadas às carteiras oferecidas ao varejo no Unibanco, mas a rentabilidade ficou muito abaixo do Índice Bovespa.

As saídas dos fundos multigestores de multimercados mostram um movimento de aprendizado do investidor, diz Aline Sun, responsável pela área de fundos de fundos da Unibanco Asset Management (UAM). A instituição acompanha mais de 200 gestores e aplica em 57, a grande maioria multimercados. "O cliente está aprendendo o risco do mercado", diz. Ela lembra que, nos Estados Unidos, o investidor só agora está indo para fundos hedge, mais agressivos. No Brasil, o investidor tinha renda fixa, foi para multimercado para ganhar um pouco mais e, num terceiro momento, está indo para ações. "Aqui, o referencial dos multimercados sempre foi o CDI, grande parte do lastro dessas carteiras está no indexador e isso acaba servindo como um colchão contra as perdas", explica Aline. Isso, diz, funciona para o bem e para o mal: o fundo não tem perda muito grande no mês, no máximo 0,50% - o que em termos absolutos, não é muito -, mas em compensação há sempre a expectativa de que ele vai garantir pelo menos o CDI.

Para ajudar, a bolsa no ano passado caiu bastante, mas se recuperou e o cliente acabou ficando com a idéia de que ações voltam e os multimercados, não. Por isso, os saques estão ocorrendo mais nos multimercados do que nos fundos de ações. "Isso é bom porque o cliente não está saindo totalmente do risco", diz Aline.

Neste mês, porém, os multimercados estão recuperando boa parte das perdas, como mostram os ganhos nos últimos 30 dias - só dois fundos dos 20 multigestores da categoria estão abaixo do CDI. E o cliente, vendo essa recuperação, deve voltar, diz ela. "Mas o cliente precisa entender que multimercado não é só alegria."

Aline admite que a correlação entre os multimercados e a bolsa é grande. Mas, mesmo assim, o risco é muito menor que o de um fundo de ações. Enquanto uma carteira multimercado tem uma volatilidade anual de 5%, uma de ações fica por volta de 30%. Hoje, diz Aline, os gestores estão também procurando fazer mais hedge das carteiras, diminuindo a correlação com juros, câmbio e dólar. "Em um mercado volátil, é preciso ter esse cuidado", diz. Mas, apesar dos resgates, Aline não acha que todo mundo vai voltar para a renda fixa. "É um processo de conquistar a confiança do investidor, o gestor perde e recupera em dois meses e, na perda seguinte, o cliente vai esperar mais antes de resgatar."

O investidor brasileiro ainda trabalha atrasado em relação ao que acontece no mercado, avalia Dany Rappaport, da gestora de recursos InvestPort, responsável pelo fundo de fundos IPort. "Além disso, o que afetou mais os multimercados no ano passado foi o descolamento do Índice Bovespa do resto do mercado, e não um erro de avaliação macroeconômica", diz ele, referindo-se ao fato de Petrobras e Vale, com peso expressivo no índice, terem disparado no fim de 2007. Sem essas ações, o Ibovespa teria fechado em baixa no segundo semestre. Isso foi particularmente ruim para multimercados que faziam operações de arbitragem de ações (long/short), comprando ações de segunda linha e vendendo o Ibovespa futuro. Como o índice subiu e as ações de segunda linha caíram, muitos fundos long/shorts - que também entram nas carteiras dos multigestores - ou multimercados que usavam essa estratégia, perderam.

Mas esse movimento, alerta Rappaport, tende a se reverter em algum momento, com as ações de segunda linha acompanhando a alta das mais líquidas. "E quem sair agora dos multimercados perde o bonde da recuperação." O problema, diz ele, é que o cliente e o gerente do banco olham quanto o fundo rendeu no mês passado e sacam. "Mas eu acho que este semestre vai ser bom para os multimercados, pois vai ser mais previsível, o que ajuda as carteiras macro."

Rappaport explica também que esses fundos têm mecanismos de controle de risco rígidos que, ao mesmo tempo em que limitam as perdas para os investidores, impedem uma recuperação rápida. "Quando a volatilidade aumenta, os multimercados têm de reduzir as carteiras, e aí, quando o mercado sobe, o ganho é menor", diz.

Neste mês, o patrimônio dos fundos de fundos da Caixa está se estabilizando, diz Roberto Madoglio, gerente nacional de fundos especiais. "A rentabilidade está melhorando e o investidor está sacando menos", diz. Mas ele admite que o futuro vai depender do desempenho das carteiras. A Caixa, assim como o Unibanco, tem fundos de fundos multimercados com aplicações a partir de R$ 1 mil, o que dá uma idéia do comportamento do investidor de varejo. Na Caixa, os multigestores aplicam em fundos de cinco casas: Votorantim, BNP, UBS Pactual, SulAmerica e Credit Suisse.

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