Título: Pressão dos Estados mantém alíquota de 2% do ICMS
Autor: Izaguirre , Mônica ; Safatle , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2008, Especial, p. A16

O governo federal mudou de idéia e não vai mais propor o fim da incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas vendas interestaduais. A proposta de reforma tributária, cuja parte constitucional será encaminhada hoje ao Congresso, reduz mas não acaba com a alíquota dessas operações, atualmente de 7% ou 12%. Ao fim do período de transição para o novo ICMS, que deverá ser de oito anos, os Estados de origem poderão continuar cobrando até 2% de imposto quando um produto for vendido a outro Estado.

Decidida essa semana, a mudança na proposta foi anunciada ontem pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, durante reunião com empresários. O objetivo é estimular os fiscos de origem a recolher e a fiscalizar também o ICMS a que tem direito o Estado destino. O governo concluiu que, sem reter uma parte do ICMS na forma de alíquota interestadual, os Estados de origem não aceitarão a responsabilidade pelo recolhimento e repasse do tributo ao destino.

Em contrapartida, Appy informou que, mesmo mantido, o Imposto sobre Produtos Industriais (federal) deixará de ser cobrado da maioria dos segmentos da indústria. Segundo ele, a alíquota do IPI só não cairá a zero para alguns produtos supérfluos, como cigarros e bebidas, e nos casos em que serve como instrumento de política industrial. Um exemplo são os produtos que concorrem com os fabricados na Zona Franca de Manaus, para não neutralizar a vantagem fiscal concedida às empresas lá instaladas. Para os demais produtos, a "zeragem" da alíquota do IPI será compensada na calibragem da alíquota do imposto sobre valor adicionado (IVA-F), que substituirá quatro contribuições federais (PIS, Cofins, ambas sobre faturamento, salário-educação, incidente sobre a folha salarial das empresas, e a Cide, paga pelo setor de combustíveis).

No total, cinco contribuições federais vão sumir com a reforma. A que tributa o lucro líquido das empresas (CSLL), será absorvida pelo Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). Ao substituir contribuições pelo IVA-F e pelo IRPJ, além de simplificar o sistema e facilitar a vida do contribuinte, o governo diversificará a base de partilha de receitas federais com Estados e municípios, formada basicamente por impostos (exceto os regulatórios). De todas as contribuições atuais, só a Cide é partilhada.

Num primeiro momento, essa reestruturação "será neutra", no que se refere à partilha, pois a fatia de Estados e municípios nos impostos federais será calibrada de modo a manter o mesmo volume real de repasses de 2006, informou Bernard Appy. Mas terá fim a histórica reclamação de prefeitos e governadores de que o governo federal só divide as perdas, usando impostos na hora de fazer desonerações tributárias e criando contribuições na hora de elevar tributos. Com o fim das contribuições (com exceção daquelas muito específicas, como as previdenciárias), perdas e ganhos serão partilhados entre União, Estados e municípios, destacou o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Segundo Mantega, desta vez a proposta de reforma tem todas as condições para ser aprovada rapidamente pelo Congresso, ainda este ano, após as eleições municipais. "O melhor momento para fazermos uma reforma tributária é quando há crescimento econômico e agora nos despertamos para o crescimento sustentável", disse.

O ministro garantiu que o emprenho do governo na aprovação desse projeto "será total". Há várias razões para isso. "Temos agora uma visão desenvolvimentista de fazer as reformas que façam acelerar o crescimento do país", citou o Ministro, lembrando que as tentativas de reforma do passado recente esbarram em crise fiscal e crise externa. "Entramos num círculo virtuoso onde o crescimento gera mais arrecadação e não precisamos mais ficar inventando contribuições para aumentar as receitas".

Outra questão relevante da reforma tributária é que ela ao reduzir custos das empresas, juntamente com as desonerações que virão, compensará a forte valorização cambial e, portanto, ajudará o país a competir no mundo globalizado.

Conforme Bernard Appy, a reforma também pretende ser neutra no que se refere às vinculações de receitas federais. Assim, a seguridade social (Saúde, Previdência e Assistência Social), à qual são vinculadas atualmente a Cofins e a CSLL, terá direito a um percentual "carimbado" do IVA-F. Também haverá percentuais do IVA-F para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT, que banca o seguro desemprego) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que ficam hoje com a receita do PIS.

No caso específico da Previdência, a intenção é vincular ainda uma parcela adicional do IVA-F, correspondente ao que deixará ser arrecadado com a queda da contribuição das empresas sobre a folha salarial, cuja alíquota cairá de 20% para 14%, em seis anos). Com essa vinculação, o governo pretende tranqüilizar as centrais sindicais sobre o financiamento da Previdência Social, sem deixar de promover uma desoneração de fato. As centrais queriam que a perda de receita decorrente da desoneração da folha fosse compensada com elevação de alíquota do IVA-F. Mas o ministro da Fazenda entende que essa perda pode ser absorvida pelo crescimento vegetativo de arrecadação que decorrerá do maior crescimento econômico proporcionado pela reforma.

Na reunião com os empresário, ontem, Mantega disse que, quando implantada, a reforma tributária abrirá espaço para um aumento de 0,5 ponto percentual na taxa real de crescimento econômico.

Bernard Appy, que falou em seguida, destacou que a efetiva desoneração dos bens de capital retirará dos investimentos produtivos um custo que hoje varia de de 2,6% a 8%, conforme a situação de cada empresa. Esse custo é decorrente do tempo que as empresas demoram para receber de volta, na forma de utilização de crédito tributário, os gastos com Cofins, PIS e ICMS sobre a aquisição de equipamentos para seu processo produtivo. Essa devolução atualmente é parcelada em 24 meses, no caso de PIS e Cofins, e em 48 meses, no caso do ICMS. Esses prazos cairão gradualmente com a reforma. No caso do ICMS, o uso integral do crédito deixará de ser parcelado a partir de 2016. Já em relação a PIS e Cofins, o governo ainda não definiu em que ritmo nem quando se completará a transição.

Para Bernard Appy, a redução do prazo precisa ser gradual porque implica custo fiscal, de R$ 13 bilhões para a União e de R$ 18 bilhões para os Estados. O custo das empresas também cai porque os impostos pagos sobre bens e serviços não utilizados diretamente no processo produtivo darão direito a crédito tributário.