Título: PT se diz preterido em acordo por comando da CPI
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 29/02/2008, Política, p. A10

O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, defendeu ontem o acordo feito pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), com aval do Palácio do Planalto, que garante ao PSDB o direito de ocupar a presidência da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Cartões Corporativos. Como a bancada do PT da Câmara dos Deputados resolveu contrariar o entendimento e disputar o cargo de presidente da comissão, o ministro buscará convergência entre os aliados até terça-feira.

O gesto dos deputados petistas foi motivado pelo desejo de afirmação política da bancada, que sente-se preterida na interlocução com o Planalto. No caso da CPI, a bancada avalia que o papel do presidente terá mais relevância que o do relator, já que não terá produção de investigação. O trabalho se baseará na análise de informações sigilosas ou disponíveis na internet, no portal da Transparência. Quanto à sigilosas, caberá ao presidente requisitar e receber, tendo condições de vazar para a imprensa antes mesmo de dar conhecimento ao relator.

O PT, de acordo com deputados petistas, não fará um cavalo-de-batalha pela presidência. A intenção maior é marcar posição. Se os trabalhos começarem a comprometer o presidente e o partido, a bancada terá avisado. Mas eles deixam claro que não se trata de rebelião contra o Planalto. É um gesto político, na tentativa de fortalecer a bancada.

"O comando da CPI será compartilhado. É uma forma de distender as tensões no Senado", disse Múcio. "A discussão agora é só sobre quem vai para que lugar", completou. Ele se reunirá, provavelmente na terça, com Jucá e os líderes do governo e do PT na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), e Maurício Rands (PE), para discutir o assunto. A preocupação do Planalto é evitar que a oposição crie uma CPI exclusiva do Senado para investigar o uso dos cartões corporativos da administração federal.

"O governo tem absoluto interesse em que as duas Casas participem. Se as duas Casas se entenderem, o fruto da investigação será melhor. O que não pode acontecer é (a CPI) ficar com cheiro de sem solução", disse o ministro. Pelas confusões que cercam a criação da CPI e pela disputa envolvendo PT e PSDB, cresce entre os congressistas a avaliação de que a investigação já começará esvaziada e não levará a nada.

Para um deputado tucano que se recusou a participar da CPI, os trabalhos se transformarão "em carnificina ou em pizza". O raciocínio é que PT e PSDB farão da comissão uma guerra eleitoral ou, ao contrário, negociarão os limites da investigação a tal ponto que elas não avançarão.

O requerimento criando a CPI mista - proposto pelo deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) e alterado após negociação com o líder do governo no Senado - propõe investigação de abusos na utilização dos cartões corporativos, adotado para pagamentos emergenciais. O texto faz referência ao decreto de criação dos cartões, que é de 1998, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Por isso, os petistas defendem que as investigações comecem pela gestão tucana.

A intenção inicial de Sampaio era apurar as denúncias recentes, envolvendo ministros e servidores do governo petista - como pagamento de tapioca pelo ministro Orlando Silva (Esporte) e gastos em free shop pela ex-ministra Matilde Ribeiro (Igualdade Racial), afastada por causa do escândalo.

A senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), indicada pelo PSDB para presidir a CPI, defende que a investigação comece pelos fatos denunciados agora. Antes de brigar pela presidência da CPI, o PT da Câmara - como maior partido da Casa - havia indicado o deputado Luiz Sérgio (PT-RJ) para ser o relator. Luiz Sérgio defendeu que a apuração comece pela gestão tucana, origem dos cartões.

Pelas regras regimentais, caberia ao maior partido do Senado - o PMDB - indicar o presidente. Mas a oposição do Senado reivindicou um dos dois cargos, alegando que seria uma CPI "chapa branca" com o governo ocupando os dois postos de comando da comissão. Como o governo não tem maioria parlamentar no Senado, Jucá articulou o acordo para ceder uma das vagas à oposição. O principal argumento era a preocupação com as votações na Casa.

Desde o início, o PT da Câmara foi contra. Defendeu obediência ao regimento e argumentou que o governo FHC nunca abriu mão desse direito. Mas, com aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o acordo foi feito. Marisa foi anunciada presidente. Mas a bancada do PT na Câmara reagiu e decidiu disputar a presidência.

O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), voltou a ameaçar com a criação de uma CPI exclusiva do Senado. "O acordo foi feito. Se não vale mais, o líder do governo tem que nos dizer", afirmou. Para ele, a criação da CPI já virou uma "lenga-lenga" a oposição está tendo "paciência de Jó".