Título: Real fortalecido facilita decisão do Copom de manter Selic em 11,25%
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 29/02/2008, Finanças, p. C2

Marisa Cauduro / Valor Marcelo Ribeiro, da Pentágono Asset: juro estável segue cenário externo O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central irá manter a Selic em 11,25% em sua reunião marcada para a próxima quarta-feira. Este é o consenso absoluto entre os analistas de mercado. Depois que a taxa de câmbio ingressou em novo canal de acelerada apreciação, as ameaças de reaperto monetário contidas na última ata do Copom não serão cumpridas tão cedo.

Enquanto diminui a ala dos economistas que aposta em avanço da taxa básica em algum momento de 2008, cresce a corrente de analistas que enxerga a possibilidade de um retorno ao ciclo de afrouxamento que durou dois anos, de setembro de 2005 (quando a Selic estava em 19,75%) a setembro de 2007 (11,25%). O resultado desta segunda reunião do ano é mais óbvio do que o da primeira. Enquanto para o encontro de 23 de janeiro havia algum suspense em relação ao placar ou à imposição de um viés de alta, desta vez não há dúvida sobre a unanimidade em torno da manutenção, sem viés, dos 11,25%.

Isso porque o ambiente é de tranqüilidade total nas duas variáveis mais críticas do ponto de vista do sistema de metas de inflação: as expectativas de inflação estão acomodadas e os juros futuros, embora em uma curva positivamente inclinada, refluíram desde janeiro. As famosas "expectativas de inflação" do mercado financeiro - consideradas pelo BC a principal bússola para a definição dos rumos da política monetária - nada mais são do que a transposição para o futuro daquilo que as instituições imaginam que esteja ocorrendo no presente. Não há muita certeza sobre o que está acontecendo agora com os preços, os seus ritmos, os efeitos sazonais e as várias influências recebidas. E as incertezas e inseguranças do aqui e agora são projetadas para o futuro. Freqüentemente, a inflação presente surpreende os economistas, para um lado ou para outro. O que dizer então sobre o IPCA esperado para o acumulado de 2008 e para o longínquo ano de 2009? Não há garantia nenhuma.

Prova disso foi o susto dado no Focus - a sagrada pesquisa divulgada semanalmente pelo BC com as projeções de cem instituições para os principais números da economia brasileira - pelo IPCA do último quadrimestre do ano. Exemplo: no Focus divulgado no dia 3 de setembro de 2007, o prognóstico para a inflação do ano inteiro subiu de 3,86% para 3,92%. Ou seja, o ano só dependia do resultado de quatro meses, mesmo assim o mercado acreditava em IPCA abaixo de 4%. Ele foi de 4,46%. As expectativas "racionais" dos agentes são, na verdade, chutes aleatórios.

Se as expectativas são reféns das incertezas presentes, o Copom não pode promover um reaperto da política monetária num momento em que a inflação corrente desacelera por causa da diminuição das pressões exercidas pelos alimentos.

Com dólar trafegando na faixa de R$ 1,70 nos próximos meses, a LCA Consultores trabalha com a previsão de dois cortes de 0,25 ponto nos Copom de 10 de setembro e 29 de outubro. "Não há inflação de demanda. E a capacidade da indústria era crescer por maturação dos investimentos", diz o economista da LCA, Francisco Pessoa. Se o dólar cair abaixo do atual patamar, o quadro terá de sofrer mudança. Pata Carlos Cintra, gerente de renda fixa do Banco Prosper, do último Copom para cá as preocupações com a expectativa e a inflação corrente foram parcialmente dissipadas, o que torna a decisão de manter a taxa em 11,25% mais fácil.

Luiz Rogê Ferreira, economista-chefe da CMA Análises, lembra que o Brasil tende a se beneficiar com a política agressiva de cortes de juros praticada pelo Federal Reserve (Fed). "O cupom cambial fica cada vez maior e o fluxo de dólares tende a aumentar por conta desse diferencial de taxas. O processo de arbitragem entre taxas de juro permite que o real saia fortalecido e funcione como âncora para a inflação", diz Rogê.

Para Marcelo Ribeiro, economista-chefe da Pentágono Asset, as incertezas externas não exigem do Copom um aperto monetário. "Não vejo inflação de demanda e os preços devem ficar contidos na medida em que o real vem sofrendo forte apreciação. Nem as expectativas de IPCA, nem a curva do DI exigem alta da Selic", diz ele, para quem apenas o cenário externo deverá ser preponderante sobre questões pontuais da economia brasileira e sobre a decisão do BC. É por isso que, quando o BC descongelar a Selic, o movimento mais provável será para cima. Para Ribeiro, o cenário externo encobre problemas latentes relevantes, que podem ser revertidos no futuro. Há hoje uma fuga de ativos dos EUA, mas deve ser temporária.