Título: PMDB reclama das perdas de seus governadores
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 06/03/2008, Política, p. A11

Nas primeiras contas feitas pelo governador Paulo Hartung, o Espírito Santo perderá um quarto de suas receitas se a proposta de reforma tributária for aprovada como foi enviada ao Congresso. No extremo Norte, o governador do Amazonas. Eduardo Braga, também acusou o golpe, pois comanda um Estado que consome pouco e tem na Zona Franca, pólo exportador, sua principal fonte de receita.

Em comum, Hartung e Braga têm o fato de pertencerem ao PMDB, partido com o maior número de governos estaduais, e que talvez por isso mesmo seja o mais mobilizado na discussão do projeto apresentado pelo governo. No dia 26, Temer deve reunir o Conselho Político, com a presença de governadores e presidentes de diretórios regionais. A bancada na Câmara espera ouvir o ministro Guido Mantega (Fazenda) sobre a reforma já na próxima semana

"Do jeito que está não passa", diz o presidente do PMDB, Michel Temer, destinatário das queixas dos governadores pemedebistas. O líder na Câmara foi pressionado pelos deputados e convidou Guido Mantega para a conversa com a bancada já nesta semana - o ministro alegou problemas de agenda, mas em princípio a conversa será semana que vem, falta confirmar.

Nem só os governadores do PMDB procuraram o abrigo do partido. Na conversa recente que teve com o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), além da sucessão presidencial, a reforma tributária também ganhou espaço. "A proposta para Minas Gerais é ruim", disse Aécio a Temer "O Estado perde muito". A preocupação do governador mineiro não difere muito daquelas manifestadas a Temer por Hartung, Braga e o governador de Santa Catarina, Luiz Henrique.

O caso do Espírito Santo, relatado ao PMDB pela deputada Rita Câmara, soa como um dos mais dramáticos, ao lado do Amazonas. "O Espírito Santo aceita perder um pouco para que o Brasil ganhe muito", disse Paulo Hartung ao Valor. "Mas não é admissível que o Estado perca 25% de sua receita com uma reforma tributária, tal qual a apresentada pelo governo federal".

No caso do Espírito Santo, segundo os capixabas, a reforma significa transformar um Estado que acertou as contas públicas e ganhou independência financeira nos últimos cinco anos em um Estado dependente política e financeiramente da União. A perda estimada é de R$ 1,4 bilhão ao ano, o que significa atualmente 87% da arrecadação de ICMS. "Tem perdas que nós ainda estamos calculando", disse o secretário estadual da Fazenda, José Teófilo de Oliveira.

"Precisamos de uma reforma que, além de simplificar e diminuir a carga tributária, reorganize a questão do financiamento público dos três entes federados: União, Estados e municípios", disse Hartung. "Não faz sentido discutir reforma sem partir da análise dessas premissas".

Nem todos os Estados governados por pemedebistas - sete, contra cinco do PSDB e cinco do PT, os dois outros partidos com mais governadores - fizeram suas contas. Os secretários de Fazenda tinham apenas "uma idéia", a partir das reuniões do Confaz (o conselho que reúne os secretários), do que seria a proposta de reforma. A partir de agora é que os governadores devem intensificar o lobby dos Estados junto aos partidos.

Há dez anos o Espírito Santo cresce mais que a média nacional, mas o Estado tem uma particularidade que o torna mais vulnerável que a maioria à proposta de reforma tributária enviada ao Congresso: com uma população (3,4 milhões de habitantes) e consumo pequenos, as empresas locais - seja na indústria, na agricultura ou no setor de serviços - operam voltadas para o mercado nacional e internacional. Por isso o Estado perderá muito quando a maior parte do ICMS passar a ser cobrado no destino e não mais na origem.

Além do R$ 1,4 bilhão, o Espírito Santo calcula que vá perder mais R$ 600 milhões na comercialização de gás, se a proposta do governo for aprovada nos termos em que foi enviada ao Congresso. O Estado se prepara para ser o principal fornecedor de gás natural para as regiões Sudeste e Sul. Atualmente, já envia cerca de 5 milhões de metros cúbicos por dia ao Rio de Janeiro.

Até o final do ano, a previsão é que o fornecimento de gás deve alcançar algo como 18 milhões de metros cúbicos por dia, patamar em que deve se estabilizar em 2009. "Quando alcançarmos esse nível, a arrecadação do ICMS envolvida nessas operações alcançam US$ 600 milhões por ano", disse José Teófilo.

Apesar de considerar que o Espírito Santo é um dos Estados mais prejudicados, a bancada capixaba deve trabalhar no Congresso por medidas alternativas que possam reduzir esses efeitos sobre a economia estadual. "O governo federal se propõe a indenizar os Estados que perderem arrecadação", disse José Teófilo. "Mas a experiência recente do Brasil mostra que as indenizações do governo federal têm sido extremamente desgastantes".

O secretário refere-se às compensações previstas na Lei Kandir para os Estados exportadores, que a cada ano levam a uma queda-de-braço entre os governos federal e estaduais por mais recursos. "Ficar na dependência de recursos do governo federal, a médio e longo prazo é sempre uma coisa ruim. Nos perdemos grau de liberdade política, nós perdemos perdemos grau de liberdade financeira", disse Teófilo. Além de reduzir as perdas, a idéia é criar mecanismos automáticos de ressarcimento garantidos na Constituição. Assim como os fundos de participação dos Estados (FPE) e dos municípios (FPM).