Título: Indústria atrai mais investimento direto estrangeiro
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2008, Brasil, p. A3

Davilym Dourado/valor Octavio de Barros: combinação de maior previsibilidade com maior crescimento atrai investimentos para o país O ingresso de investimentos estrangeiros diretos (IED) no Brasil continua a impressionar. Nos 12 meses terminados em janeiro, o fluxo líquido - que exclui as repatriações de capital feitas pelas multinacionais - atingiu o recorde de US$ 37 bilhões, enquanto o ingresso bruto foi de US$ 52,6 bilhões - também recorde.

A perspectiva de crescimento mais forte e sustentado e a maior estabilidade tornam o país atraente para as companhias estrangeiras. Vários analistas consideram possível que o saldo líquido fique próximo dos US$ 34,6 bilhões registrados em 2007, embora os mais cautelosos apostem em alguma retração, devido à desaceleração da economia global. Outra tendência importante é que a indústria tem recebido uma fatia maior dos investimentos em participação em capital - 39,3% no ano passado, mais que os 38,5% de 2006 e os 30,2% de 2005.

Além de confirmar a aposta das empresas multinacionais no crescimento do país, o fluxo expressivo de investimentos diretos tem sido fundamental para a manutenção do câmbio valorizado, mesmo com o encolhimento do saldo comercial e o forte aumento das remessas de lucros e dividendos.

"O Brasil entrou definitivamente no radar dos investidores estrangeiros", diz o diretor de macroeconomia do Bradesco, Octavio de Barros. Para ele, o ritmo de investimentos diretos é sustentável, tanto em termos líquidos como brutos. "Todos os economistas subestimaram o efeito do aumento da previsibilidade sobre o processo decisório de investimento."

Barros destaca principalmente a forte expansão do ingresso bruto de IED, para ele um melhor indicador do "apetite" das empresas estrangeiras pelo país. Segundo ele, as repatriações de capital costumam se concentrar em poucos setores. A valorização do câmbio também pode ter seu impacto nesse movimento, pois os reais das empresas compram mais dólares, o que estimularia a repatriação.

O presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização (Sobeet), Luís Afonso Lima, destaca o crescimento e o tamanho do mercado local como fatores determinantes para o forte aumento do investimento direto no Brasil. Lima observa ainda que o fluxo elevado também reflete a perspectiva de que o Brasil obtenha em breve das agências de classificação de risco o chamado grau de investimento, conferido a quem oferece um risco baixo de calote. Um estudo da Sobeet com nove países emergentes mostra que, nos dois anos anteriores à obtenção do grau de investimento, o volume de investimentos estrangeiros diretos cresce 45% em relação aos dois anteriores. Nos dois anos posteriores, o aumento chega a 174%.

A percepção de que o país se torna mais seguro com essa classificação ajuda a explicar esse movimento, acredita ele. Além disso, quem recebe o grau de investimento também tende a ter um crescimento mais forte e juros mais baixos "É possível que o fluxo líquido anual siga na casa de US$ 35 bilhões", avalia Lima.

Ele observa, porém, que o forte ingresso de capitais para atividades produtivas não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. Em 2007, o fluxo global atingiu US$ 1,5 trilhão, superando o recorde de US$ 1,41 trilhão de 2000 - não por acaso, o ano em que o Brasil havia recebido o seu fluxo líquido recorde anterior de investimentos diretos, de US$ 32,8 bilhões, batido pelos US$ 34,6 bilhões de 2007. É um sinal claro de que o movimento de capitais para o Brasil está ligado ao que se passa no mundo.

O economista-chefe do HSBC, Alexandre Bassoli, tem uma visão mais cautelosa quanto ao fluxo de IED. Para ele, como EUA, Japão e União Européia atravessam um momento de forte desaceleração da economia, é possível que o ingresso de investimentos estrangeiros diretos diminua um pouco neste ano. O raciocínio é o de que as empresas desses países tendem a lucrar menos, o que reduziria o espaço para inversões em outros países. Bassoli aposta que o fluxo líquido deve ficar entre US$ 20 bilhões e US$ 25 bilhões.

A economista Thaís Marzola Zara, da Rosenberg & Associados, não acredita numa diminuição acentuada. Para ela, a perspectiva de maior crescimento, associada à proximidade da obtenção do grau de investimento, deve manter o fluxo elevado para o país. Ela prevê um saldo de US$ 33 bilhões.

Uma tendência recente é a maior fatia de investimentos para a indústria. Em 2007, 39,3% dos ingressos para participação em capital foram para o setor - 13,8% foram para agricultura, pecuária e extrativa mineral e os restantes 46,9%, para serviços. Para Thaís, é uma boa notícia, pois a indústria "tem um efeito multiplicador muito forte sobre a economia", não apenas no próprio setor, mas também em serviços e agropecuária.

Lima chama a atenção para o aumento do investimento em atividades extrativas. No ano passado, os setores de extração de minerais metálicos e de extração de petróleo e gás natural ficaram com 12,1% das inversões em participação no capital, bem mais que os 5,1% registrados em 2006. Só a venda de parte das operações da mineradora MMX para a Anglo American deve garantir US$ 5,5 bilhões de fluxo neste ano. Barros acredita que as atividades ligadas às commodities - assim como as ligadas a essa cadeia - tendem a receber um volume significativo de inversões estrangeiras nos próximos anos. "A indústria de transformação também é um segmento atraente, assim como a área de infra-estrutura", completa ele.

Ao mesmo tempo em que o fluxo de investimentos diretos dispara, também têm crescido as remessas de lucros e dividendos. Nos 12 meses até janeiro, atingiram U$ 23,8 bilhões, um forte salto em relação aos US$ 15,6 bilhões registrados até janeiro de 2007. Para Thaís, o aumento dessas remessas é a "contraparte natural" da alta do investimento direto ao longo dos últimos anos, ainda mais num ambiente de forte crescimento da economia - o que melhora o resultado das empresas - e de câmbio valorizado. "Esse número deve atingir US$ 26,8 bilhões neste ano, mas acredito que não se trate de algo explosivo." Ela aposta que o Brasil vai continuar a abocanhar um fluxo elevado de recursos estrangeiros, tanto por meio de investimentos diretos como por meio de aplicações em renda fixa e ações.