Título: Mercado foi ineficiente nas ofertas de 2007
Autor: Valenti, Graziella
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2008, Empresas, p. B2

Ed Viggiani/Valor O professor José Luiz Rossi Junior e o aluno José Ignácio Céspedes (de blazer): empresas souberam aproveitar momento Até que enfim uma explicação. Sabe aquela euforia das aberturas de capital do ano passado? Pois bem, há uma justificativa científica para ela. E adivinhe! Toda aquela agitação foi produto de um momento de ineficiência do mercado financeiro.

A bolsa de valores brasileira viveu, em 2007, uma fase em que os investidores não foram suficientemente eficientes na hora de atribuir preços aos ativos. Por isso, estavam dispostos a pagar pelos papéis mais do que eles valiam. Ao perceberem tal fato, os administradores e empresários, aproveitaram-se do momento, para capitalizar seus negócios com emissão de ações.

Daí a quantidade de ofertas realizadas na praça paulista. Nada menos do que 76 operações, entre aberturas de capital e captações de empresas já listadas, num total movimentado de R$ 70,1 bilhões.

Essa é a teoria por trás da febre. A despeito da facilidade de compreensão do que foi o ano passado, há uma análise mais complexa suportando a conclusão, alcançada pelo aluno do Ibmec-São Paulo José Ignácio Céspede, que resolveu testar, na sua tese de mestrado em economia e finanças, a teoria de 2002 dos professores de Harvard Malcolm P. Baker e Jeffrey Wurgler.

Orientado pelo professor José Luiz Rossi Júnior, Céspedes avaliou a relação entre o valor de mercado e o patrimônio de 250 companhias abertas de 1996 a 2006, excluindo negócios não financeiros, para testar a tese dos economistas americanos na realidade brasileira. Bingo!

Ao final de 2006, a relação entre o valor de mercado das companhias brasileiras e seu patrimônio era a mais alta dos últimos dez anos. Saiu de 0,6 no começo de 1996 para 1,9 uma década mais tarde.

Na prática, significa que o preço das ações nesse intervalo teve uma valorização muito mais expressiva do que o avanço patrimonial das companhias. O valor de mercado das empresas acompanhadas passou de R$ 583 milhões para R$ 4,6 bilhões, enquanto o valor dos livros contábeis passou de R$ 959 milhões para R$ 2,4 bilhões.

Céspedes explicou ao Valor que a teoria de Baker e Wurgler, chamada "market timing", mostra que as companhias preferem aumentar o capital quando percebem que o mercado está pagando caro pelas ações, no lugar de fazer dívida. O inverso também é verdadeiro: as empresas optam por recomprar suas ações quando o valor está "irracionalmente baixo".

A decisão de testar a conclusão tirada pelos estudiosos em 2002, completa o professor Rossi Júnior, vem do fato de outras teorias existentes para explicar a estrutura de capital das empresas não serem suficientes para justificar o momento vivido pela economia brasileira nos últimos anos.

As outras duas teorias usadas em finanças para explicar a estrutura de capital de companhias abertas são as do "pecking order" e do "trade-off". A primeira mostra que as empresas, inicialmente, se financiam por lucros retidos e, só depois de atingirem um determinado tamanho, por dinheiro de terceiros (dívida). Na segunda teoria, as companhias ponderam os potenciais benefícios e custos do endividamento, em busca de um nível ótimo de alavancagem.

No entanto, nenhuma delas explicava a onda de aberturas de capital ocorrida desde 2004. "O melhor exemplo do 'market timing' é o setor imobiliário", comenta Céspedes. "As empresas não tinham um histórico de lucros recorrentes para mostrar aos investidores e ainda assim conseguiram captar bilhões."

O momento atual, de cancelamento de ofertas que estavam agendadas, deve-se à correção da ineficiência que vinha ocorrendo no mercado até então. A mudança no apetite de pagamento de prêmios elevados pelos investidores abalou a disposição das empresas de emitirem ações na atual circunstância. A redução do interesse dos investidores estrangeiros atingiu, principalmente, as estreantes do Novo Mercado. Os recursos internacionais absorveram mais de 75% do volume das operações de 2007.

Após notarem um menor apetite dos investidores, os administradores e empresários desistiram de lançar ações na Bovespa. Desde o começo deste ano, 12 operações já foram oficialmente canceladas. Até o momento, apenas Nutriplant e GP Investments conseguiram captar no mercado local, ainda assim, após aceitarem desconto substancial.

Além disso, a correção de preços sofrida, especialmente, pelas companhias novatas na bolsa e outras de menor porte, levou diversas empresas a anunciarem programas de recompra de ações. Enquanto em janeiro nenhuma nova companhia listou ações na Bovespa, cerca de uma dezena de programas de recompra foram anunciados.