Título: Embratel adota tática de guerrilha
Autor: Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2008, Tecnologia & Telecomunicações, p. B3

A estratégia da Embratel é "de guerrilha", diz o novo presidente da operadora, José Formoso Martinez. Ele usa a expressão comum em seu país, o México, que felizmente não significa pegar em armas, mas remete ao "comer o mingau pelas bordas", tão trivial entre brasileiros.

A agressividade na disputa por mercado é o que não pode faltar na trajetória da tele que definiu como prioridade brigar com gigantes Telefônica, Oi e Brasil Telecom. A proposta é, além de oferecer serviços de longa distância e de atuar para clientes corporativos, levar telefones fixos à residência dos clientes. Porém, a idéia é entrar com diferentes tecnologias. A mais nova, que entrará em cena neste mês, é o chamado WiMax, que permite o acesso à banda larga sem fio.

Formoso afirma que a Embratel, junto com a Net Serviços, já conta com 3,5 milhões de assinantes de telefones fixos. O executivo admite que é pouco, se comparado às três concessionárias, que somam 35 milhões de linhas. Mas a telefonia fixa é um negócio crescente dentro da companhia e respondeu, no ano passado, por 15% dos R$ 8,6 bilhões de receita líquida. No quarto trimestre, foram R$ 365,24 milhões.

"Detectamos que havia uma festa aqui da qual não participávamos, que era a telefonia local. E nossos concorrentes vivem da telefonia local e brincam com a gente na longa distância. Fizemos então a estratégia nova. Está dando certo, estamos crescendo. Investimos em rede própria, mas também compramos acesso das teles. É uma briga todos os dias mais pelo entrega do que pelo preço. Eles têm que dar o acesso, está na lei ", diz.

Não é de hoje que Formoso compra briga com Oi, BrT e Telefônica. Ele veio para o Brasil em 2004 para montar a operação de compra da Embratel pela Telmex. Na época, as três teles haviam montado o consórcio Calais, que fez oferta de US$ 550 milhões à americana MCI para adquirir o controle da operadora de longa distância. Mas a decisão nos EUA acabou sendo em favor da Telmex, do empresário Carlos Slim Helú, mesmo pagando menos, US$ 400 milhões.

Na conversa com o Valor, o executivo foi cauteloso na nova defesa abraçada pelas três operadoras por meio da Abrafix, associação que reúne as companhias em torno da aquisição do controle da Brasil Telecom pela Oi. "A compra ainda não é um fato. São intenções que não estão claras. Estamos aguardando", diz. Mas ele afirma que a operação não pode atrapalhar a concorrência e que, como deverá haver mudanças nas regras, a Embratel irá avaliar a proposta e e se manifestará quando a Anatel colocar o tema em consulta pública.

Apesar de a companhia ter feito aquisições desde que passou o controle à Telmex, Formoso diz que o foco hoje é no crescimento orgânico. Afirma que os controladores não pensaram em fazer uma oferta pela Brasil Telecom quando surgiu o interesse da Oi.

"Não adianta comprar empresas por um preço alto. Não gera valor para os acionistas. A Oi comprar a Brasil Telecom é uma situação diferente do que a Embratel comprar. Poderia ser interessante para nós, mas não enxergamos um grande valor neste momento", diz.

Logo após a Telmex comprar a Embratel, Formoso tornou-se diretor-executivo da empresa. A presidência ficou com Carlos Henrique Moreira, que se tornou próximo a Slim com sua trajetória de sucesso do braço celular do grupo, a Claro. Hoje, aos 72 anos, Moreira optou por uma vida de meio aposentado e passou a presidir o conselho de administração.

Já Formoso, um engenheiro elétrico de 49 anos, é homem de confiança de Slim já faz algum tempo. É chamado, pelo empresário, de Pepe (um equivalente de Zé em espanhol).

O executivo, que até hoje havia dedicado escassos momentos à imprensa, informa que os serviços baseados de voz e dados sem fio na tecnologia WiMax serão apresentadas em Brasília em março. O lançamento comercial está programado para este semestre. Formoso não revela quanto custará o serviço, mas garante que será uma nova e competitiva opção para pequenas empresas.

A empresa, a única com licença nacional para oferecer WiMax, começará atendendo 12 municípios com a tecnologia. Entretanto, o plano é chegar a 172.

Formoso diz o WiMax móvel, que funciona como um celular, ainda não está suficientemente testado, mas informa que mobilidade não é uma prioridade para a Embratel. "Não estamos muito preocupados com mobilidade. Se vier a tecnologia móvel, ótimo. Mas, na versão que que vamos oferecer, o usuário poderá andar [com o telefone ou o computador sem fio] num prédio e o serviço vai funcionar perfeitamente", afirma.

O WiMax que a Embratel adotará é chamado de nomádico, que permite a circulação do usuário num campo bem restrito. Na prática, será uma conexão à banda larga sem fio, porém fixa. O chamado WiMax móvel está em testes ao redor do mundo, mas ainda não é uma tecnologia consolidada. Aí, sim, ele é um competidor dos celulares.

Na estratégia de comer pelas bordas com opções para diferentes perfis de clientes, a Embratel chega ao consumidor das classes D e E com o telefone batizado de Livre, também sem fio. Para as classes A e B o foco são os pacotes da Net. Já são 600 mil adeptos. Juntando as opções os assinantes de telefonia local incluindo a Net são 3, 4 milhões, segundo Formoso. Telemar, Telefônica e Brasil Telecom juntas têm 35 milhões.

O Livre , que começou desacreditado pelo mercado pois a tecnologia era limitada, hoje tem como fornecedor a Motorola e já conta com 1,4 milhão de assinantes. Como é sem fio oferece um atrativo a mais, embora esteja no padrão da mobilidade restrita. Tem tudo de um celular, mas funciona apenas no raio da estação radiobase onde está registrado. Tem as versões pós e pré-pagas, com recarga mínima de R$ 21. Está em 85 cidades e em dois meses, chegará a cem. E a Embratel está pedindo à Anatel autorização para entrar em outras cidades.

O executivo considera a Embratel emblemática entre os brasileiros. Por isso mesmo, não acha que não se trata de romantismo o fato de ter sido mal vista a proposta das operadoras regionais de dividir a companhia em três partes.

"O nome Embratel é forte. Quando chegamos logo percebemos que o 'via Embratel' estava no sangue no Brasil. Ouvi isso no Congresso, de parlamentares. Acabar com o nome assustava, a Embratel era uma força importante", afirma.

O executivo explica que a Telmex percebeu que era uma grande oportunidade. "A empresa tinha valor potencial muito importante, apesar da problemática ligada a WorldCom e MCI (ex-controladores). Assumimos no dia 23 de julho de 2004, aí foi que verificamos de perto a situação da empresa. Antes, não pudemos fazer avaliação profunda. Verificamos que havia muitas pendências [financeiras]", afirma.

Os novos controladores mudaram toda a estrutura de comando. Nos primeiros três meses, saíram 25 pessoas. "Os primeiros dois anos foram muito difíceis. Encontramos um quadro em que os serviços de longa distância estavam caindo e a área de dados também."

Do México, vieram três executivos, o auditor, o responsável pela área de tecnologia da informação e o responsável por suprimentos. Os diretores regionais já eram da empresa, exceto Maurício Vergani que responde por São Paulo. Marcelo Miguel, hoje é responsável pelo Sul, Ney Acyr atende do Rio, seguindo pelo Nordeste até o Maranhão e Maria Tereza Lima, frente às operações de Brasília, Centro-Oeste e Norte. Já a Star One (satélites) e a parte de call center estão em subsidiárias.

Já foram mais de R$ 7 bilhões que o grupo mexicano investiu na Embratel. No primeiro ano, a dívida era estimada em R$ 1,2 bilhão. Mas havia litígios. Em 2007 foram pagos R$ 600 milhões em dívidas que estavam na Justiça. Foram feitos dois aumentos de capital para comprar uma participação na Net Serviços, a Primisys e a AT&T Latin America. A Embratel foi o veículo de todos os investimentos do grupo mexicano.

Formoso diz que não tem um prazo determinado para ficar no Brasil. Conta que gosta do país, viaja com freqüência, conhece quase todos os Estados e nos fins de semana procura conhecer ainda mais lugares com a família. Esportivo, corre, gosta do mar e vira e mexe chega à sede da companhia no centro do Rio pilotando sua moto.

Por quinze anos, trabalhou no México, para a Pirelli Anaconda, que fazia cabos utilizados nas telecomunicações. O grupo Carso, da família Slim, tinha participação na empresa. Já nessa época, Formoso viajava muito pela América Latina, inclusive o Brasil, o que, segundo ele, lhe deu uma visão de negócios internacional. De lá, foi convidado para dirigir, em seu país, Cablevision (TV paga), onde Slim também era acionista.

Em 1998, a Telmex decidiu internacionalizar-se. Formoso, então, passou a cuidar as operações de telefonia na América Central em quatro países: Guatemala, Nicarágua, El Salvador e Honduras. Em 2002 foi para a América Móvil, braço de telefonia celular do grupo de Slim. Dois anos mais tarde, veio ao Brasil como vice-presidente de Telmex Internacional para brigar pela compra da Embratel.

"Minha percepção na época foi de que a Embratel era uma empresa complicada, pois ficou dois anos à venda sem compradores. Mas para nós a compra fazia sentido. Havíamos comprado a AT&T LA, que estava falindo e atuava no Chile, Brasil, Argentina, Colômbia e Peru, mas era pequena. Foi apenas um primeiro passo. Surgiu então a oportunidade de comprar a Embratel", recorda. "Cheguei aqui e e disse ao João Elek [que era da AT&T LA] e ao Moreira que iríamos comprar. E ouvi: 'Esquece, as teles vão comprar'. Acabou sendo um processo superinteressante, um enorme jogo de xadrez. Em seis meses, fui três vezes ao Congresso. Aprendi muito sobre o Brasil. Foi uma guerra, mas a lei da concorrência venceu", afirma.