Título: Gasto com juro é o menor desde 1997
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 08/01/2008, Brasil, p. A3

Luís Fernando Lopes, do Pátria Investimentos: "Gastos com juros são elevados, mas estão em tendência declinante" O Brasil gastou o equivalente a cerca de 6,3% do Produto Interno Bruto (PIB) com o pagamento de juros em 2007, o menor percentual desde os 4,61% do PIB de 1997. Para 2008, a expectativa é de uma nova queda, devido à perspectiva de que os juros serão ligeiramente mais baixos do que em 2007 e de que a economia vai continuar a crescer a um ritmo forte. Com isso, as despesas financeiras seguiriam em queda como proporção do PIB. Os mais cautelosos apostam que a carga de juros ficará em torno de 6% do PIB, enquanto os mais otimistas acreditam num número mais próximo de 5,5% do PIB.

As despesas com juros são inferiores aos gastos com os benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), hoje na casa de 7% do PIB ao ano e equivalem a mais de 18 vezes os dispêndios com o Bolsa Família (algo como 0,34% do PIB). Vale ressaltar que o resultado fiscal de dezembro ainda não foi divulgado. Os gastos com juros nos 12 meses até novembro atingiram 6,32% do PIB, número próximo do qual deve fechar o acumulado no ano. Em valores absolutos, as despesas financeiras de 6,32% do PIB equivalem a R$ 160,285 bilhões.

Apesar de estarem no nível mais baixo desde 1997, as despesas com juros do setor público brasileiro ainda são muito elevadas. Numa lista de 116 países com estimativas da agência de classificação de risco Standard & Poor's (S&P), os 6,3% do PIB só são menores do que os da Jamaica (13,2% do PIB), do Líbano (10,5% do PIB) e da Turquia (7,7% do PIB).

O economista Fernando Fenolio, do Unibanco, acredita que os gastos com juros ficarão na casa de 6% do PIB em 2008. "Será uma queda modesta em relação a 2007." Fenolio diz que a taxa Selic média será apenas um pouco mais baixa do que a do ano passado, num cenário em que o Banco Central (BC) mostra cautela em relação ao comportamento da inflação. Ele projeta uma Selic média de 11,25% ao ano em 2008, apostando que a taxa ficará inalterada ao longo de 2008. Com isso, ficará próxima da média de 11,9% do ano passado. Fenolio espera um crescimento ainda robusto da atividade econômica, de 4,8%, um pouco inferior aos 5,3% projetados para 2007.

O economista-chefe do Pátria Investimentos, Luís Fernando Lopes, também prevê que a carga de juros ficará na casa de 6% do PIB em 2008, embora projete uma Selic um pouco menor do que em 2007- para ele, a taxa pode atingir 10,75% ao ano em dezembro. Ele avalia que o crescimento do PIB deve ficar em 4,5%. "Os gastos com juros são de fato elevados, mas estão em tendência declinante."

Não seria possível uma queda mais rápida das despesas financeiras ainda em 2008? "Para isso ocorrer, seria necessário um crescimento bem mais forte da economia, o que não me parece a hipótese mais provável neste momento."

Uma queda mais forte dos juros também ajudaria, mas, pelo menos por enquanto, é tida como improvável, dado o comportamento prudente do BC na condução da política monetária. Pouco mais de um terço (34,8%) da dívida em títulos do governo federal é corrigida pela Selic, mas a taxa é uma referência importante para o custo financeiro do setor público.

O economista Cristiano Souza, do ABN Amro, acredita numa queda um pouco mais forte dos gastos com juros do setor público em 2008, estimando despesas de 5,6% do PIB. Ele projeta uma Selic estável em 11,25% neste ano e aposta num crescimento do PIB de 4,7%. Souza aponta ainda dois outros fatores que podem aliviar a carga de juros neste ano: os gastos com os encargos da dívida externa devem ser relativamente baixos em 2008 e - aposta ele - o dólar tende a subir em relação ao real. Hoje, uma alta do dólar tem um impacto fiscal positivo, por conta das operações de swap cambial do BC. No swap cambial, a autoridade monetária fica credora em dólar, perdendo quando a moeda americana se desvaloriza, ganhando quando ela se valoriza. O ABN Amro estima um câmbio em R$ 2 no fim deste ano - ontem, a moeda americana fechou em R$ 1,765.

A crença numa desvalorização do real em 2008, porém, está longe de ser unanimidade entre os analistas. Lopes, por exemplo, crê num dólar "quase parado", devendo terminar o ano na casa de R$ 1,80. Desse modo, ele não acredita que os gastos com juros cairão por conta do comportamento do câmbio.

O consultor de análise econômica do Itaú, Joel Bogdanski, não descarta nem mesmo que a valorização do câmbio continue em 2008. Se alguma agência de rating elevar o Brasil a classificação de grau de investimento, o fluxo de dólares para o país pode aumentar, derrubando a moeda para a casa de R$ 1,65 a R$ 1,70, diz ele, que projeta gastos com juros abaixo de 6% do PIB neste ano, na casa de 5,8% do PIB. Os juros médios deverão ser um pouco menores neste ano e o crescimento ainda será razoável, próximo a 4,5%, avalia Bogdanski.

Os elevados gastos com juros do Brasil se devem a dois fatores, dizem os analistas. O primeiro é que o país ainda tem uma dívida muito elevada, ainda que ela esteja em queda como proporção do PIB, como nota Lopes. Em novembro de 2007, a dívida líquida do setor público equivalia a 42,6% do PIB, bem acima da média da média de 31,7% do PIB dos países classificados como "BB+", "BB" e "BB-" pela S&P - o rating do Brasil é BB+. Lopes acrescenta que o endividamento tem caído como proporção do PIB, mas continua a aumentar em termos absolutos, já que o setor público brasileiro ainda tem déficit nominal (quando se incluem os gastos financeiros no resultado das contas públicas), atualmente na casa de 2% do PIB. Em novembro, a dívida líquida era de R$ 1,127 trilhão.

O outro fator, como lembra Bogdanski, é que a taxa básica de juros no Brasil ainda é muito alta. Embora a Selic tenha caído de 19,75% em setembro de 2005 para os atuais 11,25%, os juros reais brasileiros continuam muito elevados. Se descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses, a taxa real está em 6,7%, ainda alta para padrões internacionais.

Mesmo com esses dois problemas, os gastos com juros do setor público como proporção do PIB mostram de fato uma tendência de queda razoável - vale lembrar que, nos 12 meses até agosto de 2003, as despesas financeiras do setor público totalizaram 9,66% do PIB.